Quarta-feira, 05 de março de 2025

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César Vergara de Almeida Martins Costa Ainda estou aqui

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(Foto: Alile Dara Onawale/Sony Pictures)

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

Em 2007 minha vida deu uma reviravolta. Precisei cortar laços que me prendiam, mudar de rumo. Em dezembro daquele ano, parti de Porto Alegre, minha cidade natal, e fui morar no Rio de Janeiro com minha mulher e dois filhos. Tivemos que deixar uma casa amada, vivemos a tristeza dos quartos vazios.

Éramos apenas uma jovem família em busca de novos horizontes, forçados a migrar para que o ciclo da renovação se completasse. No Rio de Janeiro, provamos a alegria carioca de viver, uma espécie de magia que se dá na mistura de sol e mar salgado, entre pessoas que chiam charmosamente ao falar e sorriem para tudo. Ao ver “Ainda estou aqui” foi inevitável lembrar daqueles anos vividos no Rio.

Meu filho voltando da quadra de futebol com os pés esfolados, às vezes uma ou outra fratura. Minha filha chegando em casa com seu coque de bailarina exausta depois das aulas de ballet na Escola Maria Olenewa, do Teatro Municipal. Coincidentemente, depois ela foi dançar na Dalau, a grande amiga de Eunice.

Naquela época minha mulher estava feliz com o curso de design de moda que fazia, meu escritório ia crescendo e eu, aos poucos, amealhando amigos. Uma família íntegra, feliz e cheia de planos. Uma alegria contagiante. Ao assistir o filme senti como se estivessem arrancando minha família de mim. Doeu muito.

E essa dor foi se agigantando ao perceber que a história da família Paiva é uma história perene, principalmente para nós brasileiros. Não aprendemos nada. Inebriados pelo esquecimento, desatentos com os métodos do extremismo de direita.

Compreendi que o oito de janeiro foi como a bagunça feita pelos policiais no escritório do Rubens. Um ato de violência que está no primeiro degrau da violência fascista que nos assombra.

O filme trouxe angústia e dor ao meu peito, mas acompanhar a trajetória da Eunice, encarnada pela “entidade” Fernanda Torres trouxe também acalento, esperança. Porque onde ainda existirem Eunices, existirá esperança.

Eunice é humanidade. É um conjunto de valores que compõe um gigante moral: empatia, alteridade, afetividade, firmeza de caráter, solidariedade, cordialidade. Tudo aquilo de que carecemos no novo mundo do Tecnofeudalismo que nos quer como servos.

O filme merece o Oscar, mas muito além disso, merece os lares e corações dos quatro cantos do mundo. Merece penetrar nas casas alemãs, húngaras, polonesas, italianas, austríacas, venezuelanas, russas e ucranianas, israelenses e “hamasianas”, chinesas e americanas, e se espalhar como se espalham os vírus até acessar cada morada do globo.

Que todos o vejam, que todos sintam a dor, a angústia, a esperança, a dignidade e a alegria da família Paiva, para que, antes que seja tarde, ainda possamos dizer: “sorriam todos!”. (César Vergara de Almeida Martins Costa é advogado)

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

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