No entorno de Jair Bolsonaro o discurso é um só em relação ao conteúdo do relatório final do inquérito do golpe, cujo sigilo foi aberto na última terça-feira (27) pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes: atacar o ministro relator do processo. Esse será um dos nortes dos seus aliados. Um deles, bastante próximo e influente junto ao ex-presidente, diz:
“É preciso ficar claro que essa investigação foi conduzida por um inimigo do Bolsonaro. Uma pessoa a quem o Bolsonaro já chamou de canalha em plena Avenida Paulista. Como se pode levar a sério um inquérito que está sob a responsabilidade de um inimigo do investigado?”
Interferência
A investigação sobre a trama golpista apontou que dois militares tentaram usar a Polícia Federal (PF) para contestar o resultado das eleições de 2022, quando Jair Bolsonaro foi derrotado por Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com a PF, uma organização criminosa atuou por um golpe de Estado, o que incluiu um planejamento que previa os assassinatos de Lula, do vice Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, e à época presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A iniciativa de envolver a PF no questionamento às urnas eletrônicas foi identificada em uma conversa interceptada entre os generais Mário Fernandes, então número dois da Secretaria-Geral da Presidência, e Roberto Criscuoli. Os dois oficiais da reserva defenderam a ida de um hacker à Superintendência da PF do Distrito Federal para denunciar supostas irregularidades na apuração, dois dias após o segundo turno. Conforme as investigações, a ideia era lançar suspeição sobre o processo eleitoral com um instrumento institucional — a abertura de um inquérito.
O plano não foi adiante, porque, segundo as apurações, a PF não detectou nada de relevante que validasse a instauração de uma investigação. Ao jornal O Globo, o ex-superintendente da PF no DF Victor Cesar dos Santos, hoje secretário de Segurança do Rio, afirmou que foi procurado pelos militares para colher o depoimento do hacker, adotou o “procedimento normal” e o caso não prosseguiu por ausência de crime.
“Eles falaram comigo. O cara seria um hacker que faria uma denúncia. A gente designou dois peritos para acompanhar a oitiva. Procedimento normal: eles tomaram a declaração e, no final, me ligaram: ‘Chefe, não vimos crime nenhum, o cara não falou nada com nada’. Como não tinha crime, mandei para o TSE (Tribunal Superior Eleitoral Eleitoral), porque falava sobre sistema. Para mim, foi uma ocorrência normal”, explicou o delegado da PF, que completou: “Se eu instauro inquérito, faria um barulho muito grande. Não sou irresponsável.”