Sábado, 29 de março de 2025
Por Redação O Sul | 4 de janeiro de 2022
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não participou da audiência pública, convocada pelo governo, sobre a vacinação de crianças de 5 a 11 anos contra a covid. A audiência ocorreu nesta terça-feira (4).
Na justificativa para sua ausência na audiência pública, a Anvisa disse que já se manifestou oficialmente sobre a vacina para crianças.
“Esta agência já emitiu seu posicionamento em relação ao tema ‘vacinação contra a covid-19 em crianças de 5 a 11 anos’, o qual se encontra público e disponibilizado às diversas autoridades médicas, sociedade e a este Douto Ministério da Saúde”, escreveu a Anvisa em documento enviado ao Ministério.
“Por fim, a Anvisa, por seu caráter técnico, visualiza que sua participação na audiência pública não agregaria novos elementos à temática”, completou.
A Anvisa liberou, em dezembro, o uso da vacina para crianças. O governo do presidente Jair Bolsonaro, no entanto, decidiu chamar uma consulta pública e uma audiência para deliberar sobre a vacinação nesse grupo.
A atitude do governo foi vista por especialistas como mais um gesto negacionista contra a vacina, já que consultas públicas não são usuais quando se trata de imunizantes já aprovados e liberados pela vigilância sanitária.
A Anvisa lembrou que a vacina, produzida pelo laboratório Pfizer especificamente para crianças, é segura e eficaz.
“A aprovação da Anvisa veio após uma análise técnica criteriosa de dados e estudos clínicos conduzidos pelo laboratório Pfizer, no qual se atestou que a vacina é segura e eficaz para o público infantil”, explicou a agência.
Apesar de liberada pela Anvisa desde o dia 16 de dezembro, ainda não há data para começar a vacinação das crianças de 5 a 11 anos.
Para especialistas, a demora é grave, ainda mais num momento em que a variante ômicron leva o mundo a registrar recordes diários de novos casos de covid.
Desde o sinal verde da Anvisa, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou diversas vezes que a autorização da agência não é suficiente para iniciar a vacinação.
Em 20 de dezembro, ele disse que a “pressa é inimiga da perfeição” e que o ministério só teria uma posição sobre o tema em 5 de janeiro. Portanto, após a audiência pública.
Maioria
O governo federal anunciou, nesta terça, que a maioria das pessoas que responderam à consulta pública sobre a vacinação de crianças de 5 a 11 anos contra a covid-19 se opôs à necessidade de receita médica para imunização dessa faixa etária.
O governo também informou que a maioria das pessoas foi contra obrigatoriedade da vacinação nessa faixa etária.
O levantamento, entretanto, não permitia que as pessoas se manifestassem a favor dessa obrigatoriedade, ou seja: não havia uma pergunta que questionasse se as pessoas eram a favor da vacinação obrigatória. As perguntas da consulta já haviam sido bastante criticadas por especialistas.
A pergunta da consulta foi a seguinte: “você concorda com a vacinação em crianças de 5 a 11 anos de forma não compulsória conforme propõe o Ministério da Saúde”?
As respostas foram anunciadas pela secretária extraordinária de enfrentamento à covid-19, a médica Rosana Leite de Melo, durante a audiência pública realizada pela pasta para discutir o tema.
Audiência
Sociedades médicas e científicas defenderam a vacinação de crianças de 5 a 11 anos na audiência pública desta terça.
O médico Marco Aurélio Sáfadi, da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), lembrou que outras doenças, cujas imunizações estão no calendário de vacinação infantil, mataram menos do que a covid-19 em crianças.
“O objetivo da vacinação é prevenir hospitalizações e complicações da doença. É isso que se propuseram as iniciativas dos programas de vacinação: prevenir hospitalizações e mortes”, reforçou.
“Claro que [as vacinas] reduzem transmissão, mas em patamares diferentes”, lembrou. O argumento se refere ao fato de que, mesmo vacinadas, as pessoas ainda podem se infectar com o vírus – mas a ideia das vacinas é que elas não desenvolvam quadros graves da doença nem morram.
Sobre a questão dos eventos adversos, entre eles a miocardite, Sáfadi lembrou que o problema tem risco ainda maior de ser causado pela própria covid-19.
“Mesmo no grupo de adolescentes, meninos, púberes, que registram os maiores casos de miocardite pela vacina, esses números são dezenas de vezes inferiores ao risco de miocardite atribuído à própria Covid-19“, afirmou. “A vacina em adolescentes teve efetividade para prevenir hospitalizações de 93%”.
Além da vacinação, a médica infectologista Rosana Richtmann, da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), defendeu também a não exigência de receita médica para vacinação das crianças.
“Tenho experiência com atividade social, com a população ribeirinha na Amazônia. Como é que você vai vacinar as crianças da Amazônia precisando de prescrição médica? Isso, na minha opinião, vendo o país como um todo, é uma barreira muito grande para a implantação desta vacinação”, opinou.
Indicados pela deputada federal bolsonarista Bia Kicis (PSL), vinculados à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, também foram à audiência – e defenderam a não vacinação das crianças usando informações distorcidas ou incorretas.
O representante da comissão Roberto Zerballos, por exemplo, afirmou que a vacina ainda é “emergencial” – mas isto não é verdade. A vacina da Pfizer, que foi a recomendada pela Anvisa para aplicação nas idades de 5 a 11 anos, recebeu aprovação definitiva – e não apenas emergencial – da agência em fevereiro do ano passado.