Quarta-feira, 05 de fevereiro de 2025
Por Redação O Sul | 2 de julho de 2017
As manifestações contra o governo estavam marcadas para a última sexta-feira havia mais de um mês. Na segunda-feira passada, a PGR (Procuradoria-Geral da República) ofereceu denúncia ao STF (Supremo Tribunal Federal) contra Michel Temer. O Brasil passou então a estar na condição inédita de ser presidido por um cidadão denunciado pelo crime de corrupção passiva. A continuidade normal dessa narrativa seria termos milhões de cidadãos indignados nas ruas, protestando e pedindo a saída do presidente. Nada disso, no entanto, aconteceu.
As manifestações, ainda que tenham acontecido por todo o País, juntaram alguns poucos milhares de pessoas. Em Brasília, a Esplanada dos Ministérios esteve fechada para trânsito durante todo o dia. No entanto, além de 2,6 mil policiais militares e 400 homens da Força Nacional, ninguém apareceu para protestar, comprovando o estado de apatia em que o país, após assistir em estado de perplexidade a uma interminável sucessão de escândalos, mergulhou.
“É um absurdo que aceitemos passivamente essa situação. A realidade é que nos transformamos em um país completamente sem moral. Em qualquer outro país, a população sairia às ruas. Recentemente, na Coreia do Sul, a população cercou o palácio por conta de fatos menos graves e não saiu de lá enquanto a presidente não foi deposta”, lembra o cientista político Aldo Fornazieri, diretor acadêmico da FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo). “E no Brasil?”, questionou.
A sexta-feira marcou ainda a volta à liberdade do ‘homem da mala’ Rodrigo Rocha Loures, e a volta ao Senado de Aécio Neves, flagrado pedindo R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, da JBS. Os desabafos contra as decisões e contra o Brasil encheram as redes sociais, mas as ruas seguiram praticamente vazias. “O que vemos é que, em determinados momentos, como esse, as pessoas demonstram algum sentimento de indignação. Como isso não se transforma em ação só produz mais frustração”, disse Fornazieri.
Para Guilherme Simões Reis, cientista político e professor da UniRio, “há setores da oposição que estão calculando ser melhor deixar o Temer sangrando”, de olho nas próximas eleições. Por isso, não trabalhariam por uma mobilização contra o presidente ou em protesto contra a corrupção. “É uma estratégia totalmente equivocada”, afirmou.
Os dois pesquisadores falam sobre o quadro de apatia e o estranho panorama político de um País governado por um presidente denunciado por crime comum.
País desmoralizado
O fato é que o País está desmoralizado, não são mais apenas as instituições, segundo Aldo Fornazier. “Somos um povo impotente. A esquerda está mergulhada na mais completa confusão e completamente enfraquecida. Não tem mais poder de convocação para levar muita gente às ruas. Pode convocar alguns milhares, mas para tirar um presidente pela via das ruas, seriam necessárias algumas manifestações com milhões de pessoas. O PT, que é o maior partido da oposição, está fazendo um jogo completamente confuso. Há setores que acham que tirar o Temer agora também seria golpe, o que é absurdo.”
Para o cientista político, tem uma parte da população que foi às ruas bem intencionada, protestando contra a corrupção com sinceridade, ainda que misturada a oportunistas. “Mas não foi apenas um mero processo manipulatório para colocar o Temer no poder. Boa parte dessas pessoas que foram para a Avenida Paulista, para a Atlântica, já não queria o Temer naquela época. Essa parcela da população agora se sente enganada. Mais do que isso, se sente envergonhada. Porém o que se constata é que isso não está gerando revolta, está levando à impotência. Até os movimentos mais orgânicos, como o MBL, evaporaram, viraram pó.”
Fornazier ressalta que a população não tem nenhum protagonismo nesse processo. “O que falta para as pessoas é direção. Os movimentos sociais não sabem o que querem. Se houvesse objetivos claros, um cronograma de lutas, seria possível mobilizar mais gente do que só os militantes. Isso mudaria o quadro”, apontou.