Sábado, 21 de dezembro de 2024
Por Edson Bündchen | 1 de dezembro de 2022
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
O bilionário sul-africano Elon Musk demonstra um apetite enorme por novos negócios e polêmicas. Em seu mais recente movimento, adquiriu o controle do Twitter por cifras estratosféricas. Segundo ele, a intenção é permitir que o aplicativo seja uma arena livre de eventuais amarras que cerceiem a mais ampla liberdade de expressão, tema que tem sido muito debatido junto às empresas globais como o Google, Facebook, TikTok e muitas outras que dominam o mundo da comunicação virtual. Musk, porém, não deseja apenas maior liberdade em seu aplicativo. Ele quer funcionários totalmente engajados em seu mais novo projeto, e quem não se adaptar, será mandado embora. Após esse chamamento, milhares de funcionários do Twitter pediram demissão, engrossando o exército de desempregados voluntários que constituem um novo fenômeno no mundo do trabalho. Desiludidos com o formato dos empregos atuais e acossados por vetores de uma sociedade que se liquefaz diante dos novos paradigmas do fim das ilusões pós-modernas, milhões de jovens estão confrontando a ditadura da felicidade que o modelo padrão da sociedade capitalista consagrou, e ungiu moralmente através do ideal meritocrático, partindo para a busca de novos espaços que lhes permitam maior sentido, flexibilidade e tempo de lazer. Trabalhe duro, valorize o seu emprego, seja resiliente e terá condições de formar uma família e viver uma vida feliz, não parecem mais seduzir as novas gerações que emergem no meio do caos da sociedade líquida, onde tudo que é sólido se desmancha no ar.
Nesse sentido, novas respostas precisam ser dadas às emergentes, ansiosas e impacientes gerações do presente milênio. O conjunto de mudanças sociais, políticas e econômicas que acomete a sociedade de hoje, contudo, não sinaliza uma transição desprovida de sofrimento. Ao contrário, o mundo BANI (frágil, ansioso, não linear e incompreensível) indica um desafio ainda maior às novas gerações. Nunca como agora, as doenças ocupacionais, o suicídio de jovens e a depressão estiveram tão alarmantes. A impermanência, contudo, não apenas se converteu num motivo para desassossego existencial e aumento da angústia, mas promove uma remodelação profunda na forma como as próprias estruturas que suportam o modo de vida moderno operam. Dentre essas estruturas, o mundo do trabalho e os modelos organizacionais existentes passam por significativas modificações, não sem ainda conviver com o arcaísmo claramente expresso nas ameaças sem melindres do novo dono do Twitter.
No fundo, o que desejamos que impere nos locais de trabalho é uma extensão da nossa própria individualidade, sem que tenhamos que deixar a nossa identidade do lado de fora dos portões corporativos. Significado, senso de comunidade, espaço para colocarmos paixão e propósito em nossas ações, além de autenticidade e respeito mútuo nas relações não deveriam ser confundidas com devaneios de um mundo imaginário, mas uma possibilidade a partir de uma gestão mais esclarecida, mais autêntica e responsável. Decifrar esses novos códigos não é uma missão qualquer, e exigirá dos atuais e futuros gestores bem mais do que rompantes autoritários, como tristemente ainda testemunhamos em empresas governadas pelo medo, tragicamente conhecidas como “máquinas de moer gente” e que sobrevivem graças ao modelo de competição a qualquer custo ainda reinante. Não deixa ser auspicioso, entretanto, saber que a contenção desses pressupostos vetustos vem sendo capitaneada pela rebeldia dos jovens que não se conformam mais com o papel de objeto passivo nas relações laborais. O florescimento de hierarquias integrais nos dão esperança de que as hierarquias dominantes do período pós-industrial serão gradualmente substituídas. Modelos mais fluidos, humanizados e autogeridos tendem a ocupar crescente espaço, combinando racionalidade técnica com emoções, num constructo mais integral e holístico, no qual a ressignificação do trabalho e das próprias organizações não sejam apenas uma aspiração, mas uma possibilidade concreta.
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.