Sábado, 28 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 26 de agosto de 2023
Talvez o que venha à cabeça ao pensar em um vencedor do Prêmio Nobel seja uma pessoa extremamente séria e formal, mas o médico e bioquímico israelense Aaron Ciechanover quebra, de cara, o estereótipo. “Você pode até conhecer o rei da Suécia”, brinca, sobre o prêmio que recebeu em 2004. Com outros dois bioquímicos, ele descreveu, em 1978, como proteínas específicas, que não estão funcionando bem, são degradadas nas nossas células, um processo denominado de proteólise. Ele ocorre por meio do chamado “sistema de ubiquitina”. O acúmulo de proteínas “doentes”, que deveriam ter sido quebradas, está associado a doenças neurodegenerativas e ao câncer. Ciechanover esteve no Brasil na semana passada e concedeu entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
1. Como o sistema de ubiquitina está associado a doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e câncer?
Todas essas doenças têm um denominador comum: proteínas agregadas que deveriam ser removidas, mas não são. Portanto, de alguma forma, o sistema falha ou simplesmente não consegue porque é como um ‘ovo duro’. Em biologia, tudo ocorre em um ambiente aquoso. Uma vez que você tem um ‘ovo’ agregado, como uma rocha, é muito difícil para a enzima ‘mordiscar’. Isso, então, é falha do sistema ou incapacidade do sistema, mas sempre tem a ver com esse controle de qualidade.
2. O senhor acha que haverá cura universal para o câncer ou os tratamentos serão individualizados?
Eu não acho, mas não sou um profeta. Exceto por dois tipos de câncer – um é o de testículo e o outro é um tipo de leucemia –, que são totalmente curáveis com apenas um ou dois medicamentos, todos os outros precisam de uma combinação. E o câncer pode criar resistência à combinação. É uma doença sorrateira, que encontra uma maneira de fugir. Até onde posso falar, vamos conseguir tratá-la com múltiplas drogas. E eu sei que as pessoas estão procurando por magia, querem tomar uma pílula que faça o câncer desaparecer, mas parece que isso não vai acontecer.
3. E esses tratamentos vão ser focados no tipo de câncer ou no paciente?
Acho que vai ser no paciente e no câncer. Digamos que seu carro não liga, então, o nome da doença é “o carro não liga”. Mas o motivo pode ser que você esqueceu as luzes acesas e a bateria está descarregada, ter batido em uma pedra ou uma chuva que deixou o carro enferrujado. Portanto, se você consertar um motivo, mas não for o correto, o carro ainda não se moverá.
4. Quando questionado sobre a cura do câncer, o senhor falou que progredimos bastante.
Um exemplo é a imunoterapia. O sistema imunológico é como um carro, quando pisamos no acelerador, podemos desenvolver doenças autoimunes, mas você não quer pisar demais no freio porque fica sem imunidade. Então, as pessoas dizem ‘vamos desenvolver um anticorpo suave para o freio’. E os anticorpos tiram um pouco o pé do freio, e, agora, o câncer está exposto ao sistema imunológico. Isso revolucionou o tratamento. O número de pacientes com câncer está aumentando e muito disso é porque estamos vivendo mais.