Quarta-feira, 23 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 4 de fevereiro de 2021
Após os protestos do núcleo da Operação Lava-Jato em Curitiba (PR) e da própria Procuradoria-Geral da República (PGR), agora a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) também quer anular a decisão do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), que autorizou a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a acessar as mensagens obtidas na operação Spoofing.
São conversas hackeadas pelo grupo investigado por invadir celulares de autoridades, dentre elas o então juiz federal Sérgio Moro e procuradores da força-tarefa da Lava-Jato.
Em um ofício enviado ao Supremo nesta quinta-feira (4), a entidade de classe reproduz os argumentos repetidos à extensão desde que a existência de parte do material foi revelada, ainda em 2019, na série de reportagens conhecida como “Vaza-Jato”, liderada pelo portal “The Intercept Brasil” com outros veículos de imprensa.
A ANPR alega, por exemplo, que o material não tem validade jurídica uma vez que foi obtido ilicitamente no ataque cibernético. Aponta também que a veracidade das conversas não é reconhecida pelos interlocutores e que nenhuma perícia constatou a autenticidade dos diálogos.
Na época em que a Polícia Federal abriu investigação para apurar o ataque hacker, os procuradores que atuam na Lava-Jato não entregaram os celulares para inspeção.
Outro ponto levantado é o de, mesmo que sejam verdadeiras, as mensagens foram obtidas ilicitamente – o que, segundo defenda a entidade, invalida o uso do conteúdo como prova, salvo no processo que acusa os próprios hackers.
Com isso, a defesa de Lula pretende justamente usar as conversas para reforçar as acusações de que Moro agiu com parcialidade e encarou o ex-presidente como ‘inimigo’ ao condená-lo a nove anos e meio de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá (SP).
Nas conversas, o então juiz federal – que posteriormente abandou a carreira na magistratura para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública no governo do presidente Jair Bolsonaro – chega a cobrar manifestações em processos e a sugerir uma fonte para os procuradores da Lava-Jato conversarem sobre investigações envolvendo o filho de Lula.
Também comunica sobre despachos que serão lançados por ele e dá conselhos ao então coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol, sobre as investigações.
A associação traz ainda um argumento técnico sobre o alcance da decisão de Lewandowski. De acordo com a ANPR, houve uma ampliação indevida do objeto da reclamação inicial apresentada pela defesa de Lula.
Na origem, o pedido do ex-presidente foi para acessar a íntegra da documentação relacionada ao acordo de leniência, estimado em R$ 3,8 bilhões, firmado entre a força-tarefa da Lava Jato no Paraná e a Odebrecht. Depois é que os advogados solicitaram o compartilhamento do acervo da Operação Spoofing, processada em Brasília.
“A defesa de Lula passou a tratar de matéria completamente alheia ao julgado paradigma e também ao objeto da presente Reclamação, buscando ampliar indevidamente o seu pleito na consecução de objetivo, data maxima venia, processual e materialmente impróprio”, argumenta a associação.
Em outra ponto, a entidade demonstra preocupação com a exposição de terceiros, não relacionados às investigações contra Lula. Na avaliação da ANPR, houve violação da intimidade e do sigilo das comunicações de dezenas de pessoas que não fazem parte da força-tarefa.
“O que se verifica no caso vertente, portanto, é que para garantir ao Reclamante [Lula] o seu suposto direito de acesso às referidas mensagens – o que, em tese, se fez em atenção aos princípios do contraditório e da ampla defesa –, violou-se o direito à intimidade e ao sigilo de comunicações de um sem-número de pessoas, muitas das quais sequer possuem relação alguma com o Reclamante ou com os processos contra ele instaurados”, diz outro trecho do documento.
Além da revogação da decisão de Lewandowski, a Associação Nacional dos Procuradores da República pede que seja determinado o ‘sigilo absoluto’ de eventuais novos diálogos que possam ser usados pela defesa do ex-presidente Lula.
Parte das conversas havia sido revelada na semana passada, mas o restante do conteúdo ficou em sigilo por determinação do próprio. Nesta segunda-feira, 1º, porém, ele tornou o material público.