Quinta-feira, 14 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 3 de abril de 2021
Pesquisa na “Science” sugere que impacto de asteroide na Terra há 66 milhões de anos mudou drasticamente o tipo de vegetação das matas tropicais, originando a floresta densa e escura da Amazônia que conhecemos atualmente.
O impacto do asteroide que dizimou os dinossauros há 66 milhões de anos ajudou a dar origem às florestas tropicais que conhecemos até o momento, apontou um estudo publicado na revista científica Science. Pesquisadores analisaram dezenas de milhares de fósseis de pólen, esporos e folhas para entender como a colisão do asteroide afetou as matas tropicais da América do Sul. Esses fósseis foram coletados em 39 locais em toda a Colômbia e datam de 70 milhões a 56 milhões de anos atrás.
Os cientistas concluíram que, após a enorme rocha espacial ter atingido a Terra, exterminando mais de 75% da vida no planeta, o tipo de vegetação que formava essas florestas também mudou drasticamente.
Antes da colisão, a floresta tropical que prosperava na Colômbia consistia de arbustos floridos banhados pela luz do sol, que por sua vez fluía através de grandes fendas entre as copas de coníferas altas. Após o asteroide, essa floresta com dossel aberto foi transformada nas florestas densas e escuras da Amazônia que conhecemos atualmente, afirmam os cientistas.
Ao analisar os fósseis coletados, o estudo descobriu que a diversidade de plantas diminuiu 45% imediatamente após a queda da rocha espacial. Depois do evento, levou 6 milhões de anos para que a rica diversidade da floresta tropical se recuperasse. Mesmo assim, a mata nunca foi a mesma.
“Um único acidente histórico mudou a trajetória ecológica e evolutiva das florestas tropicais”, afirma Carlos Jaramillo, pesquisador no Instituto de Pesquisa Tropical Smithsonian na Cidade do Panamá. “As florestas que temos hoje são realmente o subproduto do que aconteceu há 66 milhões de anos.”
Antes, as florestas tropicais eram uma mistura de angiospermas, ou árvores e arbustos floridos, e de outras espécies de plantas, como coníferas e samambaias. “A competição pela luz não era tão intensa”, explica Jaramillo, que é paleoecologista, campo da ciência que estuda fósseis para reconstruir ecossistemas do passado.
Depois, as samambaias e coníferas desapareceram em grande parte, e as angiospermas passaram a representar cerca de 90% das espécies de plantas da floresta.
Por que mudou?
Os motivos não são totalmente claros, afirmam os cientistas no estudo. O clima da região no final do período Cretáceo, há 66 milhões de anos, era semelhante ao de hoje: quente e úmido. Mas outros fatores provavelmente estavam em jogo.
Enormes saurópodes herbívoros, os dinossauros de pescoço longo, teriam ajudado a manter as lacunas abertas entre as árvores, permitindo a entrada de luz, diz Jaramillo. Assim que o asteroide colidiu com a Terra, os dinossauros saíram de cena. Segundo o pesquisador, a extinção de certas famílias de plantas devido ao impacto também pode ter influenciado.
Um terceiro fator provável foi uma mudança na composição química do solo da floresta. As chuvas frequentes durante o Cretáceo quente e úmido removeram muitos nutrientes dos solos, o que teria favorecido a existência de gimnospermas como as coníferas.
“As gimnospermas tinham essa capacidade incrível de crescer com muito pouca comida e podiam vencer as angiospermas”, explica Jaramillo.
Segundo a equipe, as cinzas que caíram após o impacto do asteroide podem ter adicionado fósforo aos solos, fertilizando-os efetivamente. Com mais comida disponível, as angiospermas superaram as gimnospermas, crescendo rapidamente em direção ao céu e bloqueando a luz do sol.
Esse dossel espesso e fechado apareceu logo após o impacto, mas a diversidade florestal demorou muito mais para se recuperar, pois novas espécies começaram a evoluir para ocupar novos nichos ecológicos.
Para o pesquisador Jaramillo, esse longo caminho de recuperação da floresta traz um alerta importante para o impacto duradouro das atividades humanas modernas, como o desmatamento. “Gerar nova diversidade leva tempo geológico”, diz ele. “Não se trata apenas de plantar árvores.”
Pesquisa
A paleoecologista Elena Stiles, da Universidade de Washington em Seattle, que não participou do estudo, afirma que a pesquisa é a primeira a trazer uma ideia abrangente do que aconteceu nos ecossistemas tropicais logo após a extinção dos dinossauros. Segundo ela, a maioria dos estudos sobre o evento envolve florestas na América do Norte ou mais ao Sul, como na Patagônia, mas não nos trópicos.
Para Stiles, também é impressionante a possibilidade de que a descoberta possa ajudar a responder a uma pergunta de longa data sobre a surpreendente biodiversidade da América do Sul.