Apesar de ser promessa de campanha de Donald Trump, quase ninguém imaginava que o aumento das tarifas seria tão elevado e com tantas repercussões dentro e fora dos Estados Unidos. Quando foi eleito em 2.016 ele também alterou algumas regras de importação, principalmente com a China, buscando negociação mais favorável, mas nada comparável às atuais. O momento era outro e a China também.
Naquela ocasião Xi Jinping não tinha tanta força e precisava organizar melhor sua posição interna e econômica, ou seja, foi obrigado a ceder em alguns pontos para manter a relação comercial ainda extremamente vantajosa para a China. Durante estes oito anos o gigante asiático fez a lição de casa e apesar de ainda enfrentar problemas internos sérios, preparou-se para a nova investida estadunidense, podendo enfrentar o problema com mais resistência.
Quer dizer que a China ganhou a disputa, os Estados Unidos vão ter que ceder e manter a relação antiga? Não é bem assim. Durante mais de 30 anos os Estados Unidos optaram por transferir para a China a esmagadora maioria dos meios de produção em nome do custo mais baixo, agilidade e preços mais acessíveis para a maioria da população. Parece que funcionou, mas criou outro problema a longo prazo.
O déficit comercial entre as duas nações vem aumentando significativamente, alcançado o valor de quase meio trilhão de dólares em 2024, isto mesmo, os Estados Unidos importam da China meio trilhão de dólares a mais que exportam. Estes dólares ficam em poder do governo chinês já que os exportadores são obrigados a trocar os dólares por yuan (moeda oficial da China). Para manter o produto chinês barato, a ditadura que governa a China, tem controle artificial do câmbio, mantendo o yuan desvalorizado quando em livre mercado deveria acontecer justamente ao contrário, muito dólar no país a moeda nacional fica mais forte.
Temos também outros aspectos que contribuem para este custo final tão baixo, entre eles a ausência de leis e encargos trabalhistas, isenção de impostos, condições de trabalho indignas, carga diária e semanal inaceitáveis e quase total ausência de fiscalização já que há ditadura na China. Na sexta-feira houve a primeira manifestação oficial do governo chinês sobre as tarifas e retaliação após o primeiro aceno de Trump a Xi Jinping.
A China promete lutar até o fim mantendo a aposta na forte pressão externa e interna que o governo estadunidense vem sofrendo, principalmente de empresas bilionárias que estão perdendo trilhões de dólares com a queda das bolsas de valores. Apesar de tudo apontar para vitória chinesa a curto prazo, as consequências podem ser benéficas para os Estados Unidos e não tão boas para China.
A Europa já declarou que não tem como absorver este volume de importações (US$ 600 bilhões anuais) caso os Estados Unidos mantenham a tarifa. A China não tem mercado interno incompatível com a gigante produção, mesmo porque um dos fatores de baixo custo da produção é o baixo salário do trabalhador chinês que tem o poder de compra muito reduzido.
Os Estados Unidos já acenam com fortes investimentos na Índia e Taiwan, além de reindustrializar alguns meios de produção. Se a China resolver cobrar a dívida dos Estados Unidos (aproximadamente US$ 800 bilhões) pode provocar inflação e desvalorização do dólar pelo mundo, deixando a produção interna estadunidense mais barata, tornando a China menos atrativa para investidores.
A exemplo dos Estados Unidos a dívida pública chinesa vem crescendo muito e 25% dos jovens não conseguem emprego mesmo com salários baixos. A bolha imobiliária criada pelo governo chinês é devastadora provocando o surgimento de várias cidades fantasma, ou seja, nem tudo é a maravilha veiculada pela ditadura.
Donald Trump é muito hábil em negociar e sabe que não pode permanecer intransigente em momento que o processo inflacionário ainda resiste (em que pese a inflação ter caído para 2,4% ao ano em março) e tendência de retração da economia em 2.025. Tudo aponta para a teoria do bode na sala.
Mesmo que tenha que ceder com a China e outros países, tudo indica que a médio e longo prazo os Estados Unidos vão sair melhor do que entraram. As duas maiores economias do mundo se digladiando não é bom negócio para elas ou para os demais países. Temos que torcer para este embate não descambe para a área bélica que não faz o estilo nem de Trump ou de Jinping. Taiwan pode ser a pedra de toque.
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