Informações preliminares sobre as condições meteorológicas enfrentadas pelo avião da Voepass, na última sexta-feira (9), que fazia um voo de Cascavel (PR) com destino a Guarulhos (SP), mostram que a aeronave passou por uma zona crítica de turbulência por quase 10 minutos (entre 13h10 e 13h19), pouco antes de perder o controle e cair na cidade de Vinhedo, no interior de São Paulo. Nesse período, a aeronave reduziu a velocidade e atravessou nuvens supercongeladas de até -40ºC. Todos os 58 passageiros e quatro tripulantes a bordo morreram.
O meteorologista Humberto Barbosa, do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), analisou que às 13h22, hora em que o avião caiu, houve perda do sinal de radar da aeronave. A reconstituição do acidente foi feita a partir da combinação de imagens de satélites e radar, associadas às coordenadas geográficas da rota do voo.
Turbulência
Imagens de satélite mostram que a aeronave enfrentou um sistema frontal de turbulência formado por nuvens do tipo cirrocumulus, que são geradas em razão da alta umidade e pressão atmosférica. Nessas condições, a água está supercongelada, em temperaturas que variam de -45ºC a -60ºC (abaixo do ponto de congelamento).
Conforme analisado pelo meteorologista, em razão da turbulência muito severa, a primeira grande oscilação ocorreu às 12h52 (horário de Brasília), quando a aeronave reduziu bruscamente a velocidade de 529 km/h para 398 km/h.
Os ventos fortes, com velocidade em torno de 53 km/h, também estavam na mesma direção do voo, trazendo ainda mais instabilidade à aeronave.
Em outro momento, às 13h06, já próximo de ocorrer a queda, o avião saiu rapidamente da velocidade de 604 km/h para 491 km/h. A partir daí, começou a perder velocidade. O último dado registrado ocorreu às 13h22, com o avião a velocidade de 63 km/h e altitude de 1.798 metros.
Possíveis causas
Na condição de supercongelamento, no qual a água segue líquida, mas muito gelada em razão das temperaturas extremamente baixas, possivelmente houve maior aderência à aeronave e se tornou gelo. Quando a água nessas condições leva à formação de gelo nas asas do avião, a aeronave perde sustentação, o que possivelmente causou o acidente em Vinhedo.
Segundo o meteorologista, havia condições atípicas de congelamento em atitudes superiores, em razão de muita umidade, visto que o supercongelamento ocorre a partir de 6 a 7 mil metros de altitude, mas a aeronave trafegava inicialmente em torno de 5 mil metros.
A história da aviação e dos acidentes aéreos mostra que a formação de gelo pode causar danos ao motor e a outros dispositivos cruciais da aeronave, devido ao processo de resfriamento.
Também há casos em que afeta negativamente a capacidade de detecção de pressão do ar dos tubo de Pitot, usados para medir a velocidade do ar. Existe ainda a possibilidade de alguns sensores terem sido alterados pelo gelo, apresentando, por exemplo, dados de velocidade divergente da real e causando confusão aos pilotos.
Ciclone e fumaça
Um ciclone extratropical que se formou sobre o Uruguai e Rio Grande do Sul, na manhã da sexta-feira, fez com que mais umidade fosse injetada, na retaguarda, sobre a região do acidente. O deslocamento de uma frente fria, formada por uma massa de ar frio e seco, de origem polar, fez as temperaturas declinarem.
Além disso, a fumaça das queimadas trazida para o Sudeste, pelo ar seco da Amazônia, ficou nos altos níveis da atmosfera, em forma de aerossóis. Isso tornou a água ainda mais fria e líquida, transformando-a em gelo e possivelmente deixando a aeronave mais pesada.
“Cerca de 15 min antes da queda, o avião havia saído da área crítica criada pelo ciclone, no entanto, os ventos da Amazônia, de 60 km/h, fizeram com que o avião perdesse altitude e potência de velocidade até cair”, afirma Barbosa.