Domingo, 22 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 14 de novembro de 2024
No final de 2018, Marcos Rodriguez Sierra decidiu que a vida na cidade não era mais a sua praia. Ele queria uma mudança de cenário para estar mais conectado com natureza, em particular, com as ondas. Aos 29 anos, depois de um ano viajando quase todos os finais de semana para a costa atlântica, ele abandonou uma vida tipicamente urbana em Buenos Aires — com família, amigos e um emprego estabelecido — para se mudar para Mar del Plata e poder ingressar no mar todos os dias.
“Tenho uma forte lembrança de voltar à cidade nas tardes de domingo e pensar quero ficar, e de chegar ao escritório nas manhãs de segunda-feira e, em vez de abrir o e-mail, abrir as câmeras ao vivo do mar e ver quatro pessoas entrando na água pensando: quero ser um desses caras”, diz.
A ligação entre o homem e a água remonta a tempos históricos, como fonte de vida, espaço de renovação e tranquilidade. Dos antigos banhos termais romanos aos rituais de purificação no Ganges, às férias na praia e até ao duche ao final do dia, a água tem uma longa lista de antecedentes sendo interpretada como um elemento chave para o restabelecimento físico e emocional.
Longe de ser uma sensação abstrata, tanto da ciência como da psicologia, esta relação foi estudada com diferentes abordagens e a conclusão foi sempre a mesma: o contato com a água tem um impacto positivo no homem, a nível físico e emocional. Neste campo de análise, a maior referência é Wallace J. Nichols, biólogo marinho que dedicou a sua vida ao estudo deste fenómeno e nomeou-o “Mente Azul” .
Em seu best-seller, Blue Mind: The Surprising Science That Shows How Being Near, In, On, or Under Water Can Make You Happy, Healthy, More Connected, and Better at What You Do (Em tradução livre: Mente Azul: a ciência surpreendente que mostra como estar perto, dentro ou debaixo d’água pode torná-lo feliz, saudável, mais conectado e melhor no que faz), Nichols apresenta uma ampla gama de estudos. que ligam a proximidade à água, seja através do oceano, dos rios, dos lagos ou das piscinas, à calma, à saúde, à criatividade, à eficiência e, em última análise, ao bem-estar pessoal.
O autor compara o estado da Mente Azul com a Mente Vermelha , nome que utiliza para se referir ao estado de estresse crônico , superestimulação e hiperatividade típico da vida moderna que, no longo prazo, leva à ansiedade, fadiga mental e desconexão emocional.
Naturalmente atraído
Nichols introduz o conceito de biofilia marinha para explicar por que a maioria das pessoas é atraída pela água e experimenta benefícios em sua presença. O termo, popularizado pelo biólogo Edward Wilson, sugere que essa conexão é resultado de milhões de anos de evolução perto de rios, lagos e oceanos, o que fez com que nossos cérebros fossem programados para se sentirem bem perto deles.
Também alude ao fato de que nossa composição biológica é principalmente água.
“O corpo humano é composto por 70% de água e depende dela para sobreviver. Ao ver ou ouvir, seu cérebro recebe o sinal de que você está no lugar certo”, afirma o cientista.
Neurociência
A partir de uma abordagem neurocientífica, Nichols afirma que os ambientes aquáticos — através da exposição a estímulos sensoriais suaves e repetitivos como o som das ondas, o contato com a água e até a contemplação de corpos d’água — desencadeiam uma série de respostas neuroquímicas que ativam a produção de hormônios, como dopamina, serotonina e ocitocina, todas associadas ao prazer, relaxamento e calma; ao mesmo tempo que reduz os níveis de cortisol, o hormônio do estresse.
Os principais estudos a que se refere são, por um lado, os do psicólogo ambiental Roger Ulrich e a sua teoria da recuperação na natureza, com a qual demonstrou que a presença da água e das paisagens naturais acelera a recuperação dos pacientes e reduz o stress.
Por outro, a do Laboratório de Neurociências da Universidade de Exeter, na Inglaterra, que revelou que as pessoas que vivem a menos de um quilómetro da costa relatam melhor saúde mental em comparação com aquelas que vivem mais longe das fontes de água. Mathew White, um dos investigadores responsáveis, é coautor de vários estudos que mostram que viver perto da água melhora a saúde mental e reduz o risco de depressão.
Na mesma linha, a psicóloga Mariana Kerestezachi, que há três anos se mudou para Miami, cidade litorânea por excelência, explica que o contato com a água se tornou um recurso terapêutico respaldado pela ciência.
Nichols sugere ainda que o contato regular com a água pode contribuir para a neuroplasticidade: a capacidade do cérebro de se reorganizar e formar novas conexões neurais, o que também leva à redução do estresse crônico.