“Candidata de fato” e “substituta-chave para o marido”. Foi assim que uma repórter da Rolling Stone descreveu, em meados deste mês, o papel da brasileira Gisele Barreto Fetterman na campanha de John Fetterman ao Senado americano, depois que o vice-governador da Pensilvânia sofreu um derrame às vésperas das primárias democratas, em maio, e teve sua condição física questionada.
Fetterman, de 53 anos, é uma das principais apostas do Partido Democrata do presidente Joe Biden para manter o controle do Senado após as eleições legislativas de 8 de novembro. Ele chegou a liderar as intenções de voto por 12 pontos percentuais, mas seu desempenho está perdendo tração na reta final, segundo levantamentos do site FiveThirtyEight. Agora, aparece tecnicamente empatado com o candidato republicano, Mehmet Oz, um ex-apresentador de TV mais conhecido como Dr. Oz, apoiado pelo ex-presidente Donald Trump.
Debate ao vivo
Pela primeira e única vez nesta corrida eleitoral, os dois se enfrentaram em um debate ao vivo na noite de terça-feira, cinco meses após um acidente vascular cerebral quase tirar a vida de Fetterman. A discussão foi marcada por discordâncias em temas como aborto, economia, segurança e questões migratórias. Mas, na imprensa americana, o destaque foi a dificuldade do democrata em articular suas falas.
“Ele falava em tons desconexos, às vezes arrastando e trocando palavras. Também teve dificuldades para articular suas posições ou refutar os comentários de Oz sobre suas políticas serem muito extremas”, escreveu a agência Bloomberg.
O democrata não esconde sua condição, algo que fez questão de deixar claro: “Vamos falar sobre o elefante na sala: eu tive um derrame”, declarou na abertura do debate, do qual participou com o auxílio de telões onde as falas eram transcritas em tempo real, já que ainda lida com um déficit auditivo como consequência do AVC.
“Grande dama no Senado”
Durante toda a noite, Gisele esteve sentada à frente do palco apoiando o marido, e tomou as rédeas da interação com o público antes e depois do embate. Enquanto Fetterman oferecia acenos de mão e soquinhos acompanhados de um tímido “obrigado”, a imprensa local disse que sua esposa respondia às perguntas, agradecia os elogios e estabelecia o diálogo com o público — algumas vezes para falar do marido, e outras sobre coisas que viram em seu Instagram, em que documenta a vida da família e acumula mais de 44 mil seguidores.
Tem sido assim desde que Fetterman venceu as primárias democratas, em maio, e foi planejada uma maratona de comícios e eventos de campanha, apesar das dúvidas que pairavam sobre a sua saúde.
Conhecida por seu trabalho social, principalmente em defesa dos imigrantes, Gisele costuma dizer que nunca foi seu plano se tornar o centro das atenções. Mas o fato é que, do dia para a noite, ela se tornou a principal defensora política do marido na campanha e isso fez com que fosse observada até pelo presidente Biden, que durante uma visita a Pittsburgh, na semana passada, disse que ela, que não busca um cargo eletivo, “será uma grande, grande dama no Senado”.
“Tive de sobreviver, tive de encarar [essa situação]”, disse Gisele à Rolling Stone, ressaltando que não era seu papel pedir para o marido deixar a corrida eleitoral. — Se você tem a possibilidade de melhorar a vida das pessoas, é seu dever fazê-lo. E se todos os médicos consultados lhe deram o aval, então apoio essa decisão.
Brasileira
Nascida no Rio de Janeiro, Gisele, de 40 anos, emigrou com a mãe para os Estados Unidos quando tinha 7 anos e permaneceu em condição irregular até os 15. Foi apenas em 2004, quando tinha 22, que conseguiu o green card (direito à residência). A cidadania americana veio cinco anos depois. Ela e Fetterman casaram-se em 2008 e têm três filhos. Apesar de sua posição como vice-primeira-dama da Pensilvânia, em outubro de 2020 ela sofreu um ataque racista numa fila de supermercado.
Estado vital
A Pensilvânia é vista como um estado vital na disputa pelo Senado, onde um terço das cadeiras estará em jogo. Na terça-feira, a principal comissão de arrecadação de fundos para a campanha republicana anunciou a adição de US$ 6 milhões para suas inserções de televisão no estado. Já os democratas investiram US$ 5 milhões na semana passada.
Até 16 de agosto, Fetterman liderava as intenções de voto por 49,2% a 37,3% de Oz. Agora, os números do ThirtyFiveEight mostram o democrata ainda à frente, mas com uma distância de apenas 2,3 pontos percentuais (47,2% versus 44,9%), considerado um empate técnico.
Eles competem por uma vaga que será aberta com a aposentadoria do senador republicano Pat Toomey. É uma das seis corridas ao Senado centrais para determinar o controle da Casa e o destino da agenda do governo Biden nos próximos dois anos.
Ainda não está claro o impacto que o debate de terça-feira terá sobre na eleição, mas os democratas acreditam que os eleitores darão crédito a Fetterman por ter ido à televisão discutir com Oz, apesar de ainda se recuperar do derrame. Mais de US$ 1 milhão foram arrecadados pela campanha do vice-governador após o debate, informou um assessor pelo Twitter nesta quarta-feira.
Fetterman, que ficou fora da campanha até meados de agosto, tem sido pressionado a divulgar seus laudos médicos completos, mas se recusou, dizendo que, para ele, “transparência é aparecer” em seus compromissos. Ele divulgou uma carta de seu médico antes do debate que dizia que ele “não tem restrições de trabalho e pode cumprir plenamente seu dever no serviço público”.