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Calibragem necessária

Lula tem méritos indiscutíveis. Como negar que um retirante nordestino, pobre como todos os outros, vindo de Garanhuns para São Paulo na carroceria de um caminhão, que se tornou um dos maiores líderes sindicais da AL, depois se elegeu deputado e presidente da República , é alguém diferenciado, para não dizer predestinado?

Digam o que quiserem. Chamem-no de Luladrão, de analfabeto ou de chegado a uma ou mais doses de caninha pura. Mas se ele não fosse um ser especial, uma exceção, não teria chegado nem perto das honrarias que conquistou, inclusive o posto de autoridade máxima do país em três eleições.

Talvez o problema em Lula seja o de se julgar predestinado. Tendo superado todas as dificuldades para ser o que é, então lhe estava reservado o destino dos heróis, dos grandes homens. Muito do ódio que lhe devotam tem a ver com uma frustração pessoal dos que o desprezam e odeiam: como pode alguém tão destituído de riqueza e instrução, tão distante das elites, tão tipicamente ligado à miséria que afeta uma parte ponderável dos nossos irmãos, ter merecido tamanho destaque entre os seus pares, muito mais afortunados?

Julgando-se especial, deixa-se levar pela vaidade, quase natural na circunstância. Lula não convive com o erro, porque acha que nunca erra. E se algo vai mal, se as coisas não correram como ele previu, é somente porque o caso ainda não chegou ao fim. Assim, ele descuida das consequências do que diz e do que faz, abre a guarda e com enorme frequência derrapa na curva.

Bem sucedido na sua admirável trajetória, ele não ouve ninguém, não precisa estudar ou ler um relatório mais complexo ( e enfadonho): ao final e ao cabo a sua intuição prevalecerá e dará certo. A autoconfiança que o move e inspira é ilimitada.

Mais do que não ouvir ninguém, e preso uma visão discutível de mundo – para dizer o mínimo – , alimentado por lendas urbanas e equívocos históricos, incensado pelos “cumpanheiros”, ele vai em frente sem medo de ser feliz.

Na sua recente viagem à China, Lula abusou de declarações descuidadas, e de bobagens homéricas ditas com certo ar de mentor espiritual da humanidade. Para espanto geral, afirmou que é preciso que “ os EUA parem de incentivar a guerra “. Até pode ser, mas a Rússia agressora, invasora de um país vizinho e soberano, não merece nenhuma reprimenda, nenhuma palavra de desaprovação?

A guerra não interessa a americanos e europeus, como ele imagina e como acusou. Eles só têm a perder, porque têm obrigações políticas e morais diante da agressão traiçoeira e vulgar, que lhes custa uma fortuna incalculável de dinheiro e recursos bélicos e materiais.

Em Xangai disse que os bancos têm de ajudar os países e não asfixiá-los. Se tem algo que os bancos não gostam de fazer é asfixiar seus devedores. O sonho dourado de todo banqueiro é receber em dia os seus créditos. Os bancos só apertam(asfixiam) os caloteiros que não honram seus compromissos, como está acontecendo com nossos hermanos da Argentina.

Lula precisa confiar menos na intuição, se preparar melhor nas suas intervenções e entrevistas, calibrar as declarações.

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