Sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025
Por Redação O Sul | 27 de fevereiro de 2025
Nos supermercados canadenses, produtos agrícolas dos Estados Unidos estão murchando nas prateleiras. Executivos locais analisam minuciosamente as cartas de vinho durante o jantar para evitar pedir Pinot Noir da Califórnia. E, em Toronto, Izzy, um cão da raça Great Pyrenees-Poodle, não pode mais comer ração americana.
À medida que o presidente dos EUA, Donald Trump, ameaça impor tarifas, faz piadas sobre o “51º estado” e se refere ao primeiro-ministro do Canadá como “governador Trudeau”, consumidores canadenses furiosos estão se tornando compradores vingativos: produtos americanos estão fora.
Nessa quinta-feira (27), Trump anunciou que as tarifas sobre produtos canadenses e mexicanos entrarão em vigor dia 4 de março.
Ellen Bessner, advogada especializada em valores mobiliários de Toronto e dona de Izzy, recentemente fez uma varredura em sua casa para substituir produtos dos EUA. O único que restou foi um removedor de maquiagem de marca americana – agora, ela está procurando uma alternativa canadense antes que o frasco acabe.
“Sempre fui focada em ‘comprar Canadá’, mas com a ameaça de tarifas, estou elevando isso a outro nível”, disse Ellen, sócia da Babin Bessner Spry.
Essa é uma mudança significativa para um país que compra quase tanto em bens dos EUA quanto toda a União Europeia – um total de US$ 349,4 bilhões em 2024, segundo o Departamento de Comércio americano.
O Canadá também tem sido a maior fonte de turistas estrangeiros para os EUA, com gastos de US$ 20,5 bilhões no ano passado, de acordo com a Associação de Viagens dos EUA. Agora, muitos estão cancelando viagens.
“Isso reflete uma consciência – e uma intenção de votar com suas carteiras”, disse Shachi Kurl, presidente do Instituto Angus Reid.
Uma pesquisa recente da empresa de Vancouver com 3.310 canadenses revelou que 85% dos entrevistados planejam substituir produtos dos EUA por alternativas. Quase metade disse que mudaria seus planos de viagem para evitar o país.
Irene Taylor, sócia da consultoria Praxis Partners, cancelou seus planos para uma estadia de dois meses em Hilton Head, na Carolina do Sul. Em vez disso, pretende visitar a costa leste do Canadá, apesar da diferença de pelo menos 20 graus Fahrenheit (quase sete graus Celsius) na temperatura.
Enquanto isso, um dos maiores escritórios de advocacia do Canadá, o Fasken Martineau DuMoulin, perdeu 1 milhão de dólares canadenses (US$ 699 mil em depósitos ao cancelar uma conferência para seus advogados em Las Vegas, segundo o jornal Globe and Mail.
Companhias aéreas canadenses também começaram a reduzir voos para os Estados Unidos, prevendo queda na demanda.
“Uma coisa que podemos fazer é não dar nosso dinheiro para os Estados Unidos agora”, disse Curtis Brown, da Probe Research, de Winnipeg.
Uma pesquisa da empresa mostrou que mais de seis em cada dez canadenses planejam evitar férias nos EUA. Brown contou que a escola de sua filha cancelou excursões para o país.
Produtos locais
Nos supermercados de todo o Canadá, o movimento de compra de produtos nacionais está visível. Folhas de bordo vermelhas adornam placas que dizem ”Shop Canadian” (”Compre Canadense”, em tradução livre), destacando produtos locais para facilitar a escolha dos consumidores.
Na Loblaw, maior varejista de alimentos do país, as vendas de produtos canadenses cresceram 8% na primeira semana de fevereiro, antes mesmo de as placas serem colocadas, disse o CEO da empresa em uma postagem no LinkedIn.
“Quando estou nas lojas, cada pessoa que encontro quer ajuda e orientação sobre como comprar mais produtos canadenses, e estamos fazendo tudo o que podemos para ajudar”, afirmou Per Bank em uma teleconferência de resultados em 20 de fevereiro.
Em uma loja concorrente da Metro, no centro de Toronto, maçãs americanas ficaram praticamente intocadas ao lado de prateleiras quase vazias de opções canadenses. Pimentões mexicanos estavam quase esgotados, enquanto os americanos, já moles e rachados, sobravam.
Os boicotes não se limitam aos supermercados. Greg Taylor, diretor de investimentos da Purpose Investments, em Toronto, disse que está ignorando a seção de vinhos americanos nos cardápios “por vingança”.
Especialistas apontam que a ira dos canadenses é um sinal negativo para os negócios americanos, pois Donald Trump ameaça ampliar sua guerra comercial.
“Donald Trump tem a habilidade de irritar pessoas em outros países com facilidade”, disse David Soberman, professor de marketing estratégico da Universidade de Toronto, que prevê uma reação semelhante dos consumidores na Europa e na Ásia.
Empresas cujos executivos estão alinhados com Trump, como a Tesla, de Elon Musk, podem enfrentar um boicote ainda maior.
As vendas da Tesla caíram 45% no mês passado na Europa, enquanto outros fabricantes de veículos elétricos viram um aumento na demanda. Chrystia Freeland, candidata a primeira-ministra do Canadá, já sugeriu um imposto de 100% sobre os carros elétricos da empresa. As informações são da agência de notícias Bloomberg.