Quinta-feira, 06 de fevereiro de 2025
Por Redação O Sul | 9 de julho de 2024
O número de tumores descobertos em estágio avançado aumentou no Brasil e no mundo após a pandemia. Nestes estágios, o tumor já cresceu ou se espalhou para outros órgãos e linfonodos, o que diminui a probabilidade de cura. Especialistas ouvidos pelo jornal O Globo afirmam que isso é reflexo do atraso no diagnóstico e tratamento devido às restrições impostas pela pandemia de covid-19 e no pós-pandemia.
“Temos visto um número muito grande de pacientes chegando com câncer em estádios três e quatro. Metade dos pacientes no Brasil já chegava nesses estádios, mas agora isso aumentou. Não há dados oficiais de quanto foi esse aumento, mas todos os médicos têm a mesma percepção”, diz o oncologista Paulo Hoff, diretor de Oncologia da Rede D’Or, professor da Universidade de São Paulo.
A tendência já era prevista em estudos feitos durante a pandemia. Um trabalho publicado recentemente pela Universidade College London em parceria com o Data-Can, centro de pesquisa de dados de saúde para diagnóstico e tratamento de câncer no Reino Unido, estimou um aumento de 20% na mortalidade por câncer como resultado direto da interrupção causada pelo coronavírus. Um estudo da Americas Health Foundation, realizado com o apoio da Roche, estimou que o atraso no diagnóstico e tratamento do câncer imposto pela pandemia seria responsável por 62,3 mil mortes.
Os cânceres que mais tiveram aumento de diagnóstico avançado nesse período são: próstata, mama, intestino e outros tumores do trato gastrointestinal, colo de útero e pulmão.
“Os cânceres que mais notadamente tiveram um aumento foram aqueles que eram rastreáveis e deixaram de ser porque as pessoas pararam de ir aos serviços de saúde devido às restrições da pandemia. Vimos aumento em todas as idades, mas ele é mais importante em pacientes mais velhos porque é nessa faixa etária que os tumores são mais frequentes”, diz o oncologista Fernando Maluf, fundador do Instituto Vencer o Câncer e médico da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo e do Hospital Israelita Albert Einstein.
No caso do câncer de mama, por exemplo, o rastreio é feito por meio da mamografia. Esse exame é recomendado pelo Ministério da Saúde para mulheres a partir dos 50 anos de idade, a cada dois anos. Já a Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), o Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem (CBR) e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) recomendam a mamografia anual a partir dos 40 anos de idade, visando ao diagnóstico precoce e a redução da mortalidade.
Durante a pandemia, a realização desse exame chegou a cair 40%, segundo dados de um estudo publicado na revista científica International Journal Public Health. Isso teve consequências: um aumento de cerca de 26% nos casos graves da doença no país.
Quanto ao câncer de próstata, não há indicação oficial no país para o rastreamento do tumor por parte do Ministério da Saúde. A pasta recomenda que os exames para detecção da doença, como o exame de toque retal e o PSA livre sejam feitos apenas mediante o aparecimento de sintomas. Já a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) recomenda o rastreio a partir de 50 anos.
Para o câncer de pulmão, a detecção é feita através de uma tomografia computadorizada, indicada anualmente para pessoas de 50 a 80 anos, que ainda fumam ou que pararam de fumar há menos de 15 anos, e que tenham fumado pelo menos um maço de cigarros por dia, por pelo menos 20 anos.
O câncer colorretal é identificado pela colonoscopia. Também pode ser indicado o teste de sangue oculto nas fezes. A triagem deve começar aos 45 anos e repetida a cada década. É importante ressaltar que essa recomendação é válida para pessoas de baixo risco para a doença. Aquelas com alto risco, devem realizar o exame com mais frequência e, em alguns casos, até mesmo mais precocemente.
Já o rastreamento do câncer de colo do útero é feito pelo papanicolau, a partir dos 25 anos de idade. A periodicidade pode ser anual ou a cada três anos, a depender dos resultados.
A realização desses exames na periodicidade correta é fundamental para a detecção precoce do câncer, quando o tumor está localizado e há maior possibilidade de cura. A boa notícia é que extintas as restrições e passado o medo da covid-19, a população parece estar voltando à realização dos exames preventivos, o que deve contribuir para a redução do diagnóstico desses tumores em estágio avançado.
“Acho que teremos isso normalizado em ano ou dois anos porque notamos uma volta muito rápida do cidadão aos serviços de saúde”, afirma Hoff.
Ninguém tem dúvida sobre o papel indireto da pandemia no aumento no número de cânceres avançados. No entanto, outra possibilidade é ventilada entre alguns pesquisadores: o SARS-CoV-2 ser um catalisador do câncer.
“Não tem nada sólido, neste momento, em relação ao coronavírus causador da Covid. Também nunca houve relação causal conhecida dos coronavírus que já existiam antes com câncer. Então, acho improvável”, pontua Hoff.
Embora essa hipótese não esteja confirmada, ela é investigada por grupos de médicos nos Estados Unidos, que observaram o surgimento de cânceres incomuns após a pandemia. Como pacientes com 40 anos com colangiocarcinoma, um câncer raro e letal dos ductos biliares que normalmente atinge pessoas na faixa dos 70 e 80 anos. As informações são do jornal O Globo.