O que uma viagem de 60 quilômetros num Renault Zoe, elétrico, em subida de serra, de Santos a São Paulo, tem a ver com a expedição de 9 mil quilômetros a bordo de um Porsche Taycan Cross Turismo, também elétrico, entre Foz do Iguaçu (PR) e Jericoacoara (CE)? São muitas as diferenças. Mas ao menos uma dúvida une as duas experiências: vai dar certo?
Por mais fascinante que um carro 100% elétrico seja para a maioria dos brasileiros que ainda não possuem um veículo assim, a segurança de saber o quanto de bateria é suficiente para chegar ao destino parece ainda ser um dos maiores mistérios em torno dos veículos movidos a eletricidade.
Ninguém acharia estranho pegar uma rodovia com um quarto de combustível no tanque em um automóvel a combustão. Nas vias com o mínimo de infraestrutura o que não falta são postos de abastecimento. Mas no caso de um elétrico, a palavra do fabricante sobre a autonomia do veículo parece não ser suficiente para encarar a estrada com tranquilidade.
No caso da viagem de volta do litoral paulista, a dúvida é quanto o carro vai gastar na serra. Na chegada ao topo, o alívio: os 14 quilômetros de serra consumiram apenas 6% da bateria. Esse tipo de veículo também nos instiga a dirigir melhor, de forma mais econômica, desacelerar antes de chegar até o semáforo vermelho.
A expedição da Porsche, do Sul ao Nordeste do país, chegou na terça-feira ao Rio, com 5,8 mil quilômetros rodados. A aventura foi cuidadosamente preparada para não falhar. Para garantir que a travessia do Taycan por 14 Estados, durante 26 dias, fosse perfeita, o trajeto elaborado prevê a passagem por 33 pontos de carregamento de baterias.
A iniciativa da Porsche serve para tentar acabar com um dos estigmas que se criaram em relação aos modelos 100% elétricos. O Brasil está longe de oferecer a infraestrutura de carregamento que se vê nos países europeus, por exemplo. Mas os próprios fabricantes de veículos estão cuidando da ampliação dessas fontes.
Por meio de parcerias entre as marcas de carros e concessionárias de energia a cada dia surgem novos pontos de abastecimento em shoppings, supermercados, hotéis e até laboratórios de análises clínicas. O carregamento em locais públicos, que ainda funciona como instrumento de marketing, tanto do fabricante de veículo quanto do estabelecimento, é gratuito. Em países onde a cobrança desse tipo de serviço já está regulamentada o usuário pode pagar até com o cartão de crédito ou débito.
Pesquisa da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) em parceria com a Tupinambá Energia mostra que o número dos chamados eletropostos no Brasil tem crescido significativamente. Total de 840 estão em operação. O levantamento exclui carregadores instalados nas residências do proprietário do carro movido a eletricidade. A Volvo Car planeja ter mil pontos públicos instalados no Brasil até o fim deste ano.
É nas instalações domésticas que as montadoras mais capricham na hora de vender um elétrico. Oferecem acompanhamento técnico para a colocação do chamado “wall box”, equipamento que oferece recarga mais rápida do que numa tomada. Segundo o diretor-geral da Volvo Car, João Oliveira, 90% dos proprietários de automóveis elétricos fazem o carregamento das baterias quase que exclusivamente em casa ou no escritório.
Mas, diz Oliveira, a maior preocupação das marcas de elétricos, agora, é garantir pontos de carregamento ao longo das rodovias. Isso traria tranquilidade para o motorista de um veículo 100% elétrico para usar o carro em viagens mais longas. O primeiro corredor do Brasil com essas características foi instalado há três anos no trecho da Via Dutra, entre Rio e São Paulo. É resultado de uma parceria entre a EDP e o Grupo BMW.
Outro projeto, envolvendo a EDP, Gesel, grupo de estudos da UFRJ, e as marcas Volkswagen, Audi e Porsche, já tem cinco pontos de carregamento ultra rápido instalados em estradas do interior e litoral paulista e na Rodovia Regis Bittencourt. Nesses pontos, há dois tipos de carregadores: um de 220kW e outro de 150kW. No ultra rápido, de 150kW, segundo a Audi, um carregamento durante nove minutos é suficiente para o modelo esportivo e-tron percorrer 100 quilômetros.
Nesses eletropostos em rodovias, segundo as empresas, com 40 minutos é possível obter carga total. Tempo suficiente para a tradicional parada de viagem para um café. E para quem vai usar veículo na cidade, como diz o presidente da Porsche no Brasil, Andreas Marquardt, o carregamento das baterias pode naturalmente ser feito, com folga, enquanto dormimos ou até durante o café da manhã. Como se faz com o celular. Isso garante sair de casa sempre com o “tanque cheio”. “Abastecer” um elétrico é questão de costume. As informações são do jornal Valor Econômico.