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Cérebro tem concentração de microplásticos até 30 vezes maior do que outros órgãos

Acúmulo no corpo humano pode estar relacionado ao aumento da presença de plásticos no meio ambiente. (Foto: Freepik)

Nos últimos anos, pesquisas têm mostrado que partículas plásticas minúsculas, os chamados microplásticos, podem se acumular em níveis mais altos no cérebro humano do que em outros órgãos, como o fígado e rins.

Agora, um artigo recente trouxe um novo alerta: amostras de cérebro coletadas em 2024 revelaram concentrações surpreendentemente mais altas dessas partículas do que cientistas imaginavam, cerca de 7 a 30 vezes maiores do que as encontradas no fígado ou nos rins.

E segundo o estudo, publicado na revista científica “Nature Medicine”, esse acúmulo no corpo humano pode estar relacionado ao aumento da presença de plásticos no meio ambiente, mas os efeitos exatos para a saúde ainda não estão claros.

Estudos anteriores também enfrentavam uma limitação nesse sentido, já que usavam microscópios para identificar essas partículas nos tecidos humanos, mas só conseguiam detectar aquelas maiores que 5 micrômetros, o que restringia a compreensão sobre a verdadeira extensão da contaminação.

Para contornar isso, essa nova pesquisa usou técnicas mais modernas para analisar a distribuição das partículas em amostras de fígado, rins e cérebro de corpos humanos de 2016 e 2024. Foram analisadas ao todo 52 amostras de cérebro, e as partículas plásticas foram encontradas em TODAS elas.

De modo geral, as concentrações observadas no fígado e rins de 2016 foram semelhantes, mas as amostras de cérebro coletadas nesse ano apresentaram níveis muito mais altos de microplásticos, especialmente na região do córtex frontal.

Já as amostras de 2024 mostraram concentrações ainda mais altas de micro e nanopartículas de plásticos em comparação com as de 2016. E quando comparadas ainda com dados de períodos anteriores (1997-2013), as concentrações mais recentes foram as mais altas encontradas.

Veja as concentrações abaixo:

Em média, as amostras de cérebro de 2024 apresentaram 4.917 μg/g [microgramas por grama, um número que indica a quantidade de plástico em relação ao peso do tecido], enquanto as de 2016 tinham 3.345 μg/g;

Por outro lado, as amostras de períodos ainda mais anteriores (1997-2013) tinham uma concentração média de 1.254 μg/g, quase 3,92 vezes menor que as amostras de 2024.

Além disso, as partículas plásticas de 2024 eram 7 a 30 vezes mais concentradas no cérebro do que no fígado ou nos rins.

“Os tecidos cerebrais abrigam proporções mais altas de polietileno [um tipo comum de plástico] em comparação com a composição dos plásticos no fígado ou rim, e a microscopia eletrônica verificou a natureza das MNPs [micro e nanopartículas de plástico] isoladas do cérebro, que se apresentam em grande parte como fragmentos nanométricos semelhantes a estilhaços”, disseram os autores no artigo.

No estudo, os cientistas também descobriram que as amostras de cérebro de pessoas diagnosticadas com demência apresentaram ainda mais partículas plásticas do que as de pessoas sem esse diagnóstico.

Contudo, apesar de os resultados indicarem uma possível ligação entre as partículas plásticas e problemas de saúde, os autores destacam que não se pode afirmar que essas partículas sejam a causa de doenças.

Eles sugerem, no entanto, que as diferenças geográficas, já que as amostras foram coletadas em locais diferentes, podem ter influenciado os resultados.

“Dada a presença ambiental exponencialmente crescente de MNPs, esses dados compelem um esforço muito maior para entender se as MNPs têm um papel em distúrbios neurológicos ou outros efeitos na saúde humana”, acrescentaram.

Para a realização da pesquisa, a maior parte das amostras analisada veio de Albuquerque, no estado do Novo México (EUA), mas os cientistas também incluíram amostras de cérebro obtidas entre 1997 e 2013 de outras regiões do país, como Carolina do Norte, Massachusetts e Maryland.

Durante os exames nos cadáveres, pequenos pedaços de tecido, medindo entre 3 e 5 centímetros cúbicos, foram coletados e preservados em uma solução conservante (formol a 10%). Com isso, a técnica possibilitou a detecção das partículas plásticas minúsculas nos tecidos examinados.

Antonio Francisco de Araujo Netto, neurologista da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo que não teve relação com o estudo, explica que, embora a pesquisa não estabeleça uma relação causal direta entre os microplásticos e a saúde, ela confirma que a presença de microplásticos no organismo é um fator de risco significativo para várias doenças.

Isso acontece porque a exposição a microplásticos pode exacerbar doenças preexistentes, com destaque para o impacto no cérebro, devido à interação com a barreira hematoencefálica, que protege o sistema nervoso e separa o cérebro da corrente sanguínea.

“Isso é um fator importante, uma vez que placas de ateroma [acúmulos de gordura, colesterol e outras substâncias] são um fator de risco para AVC e doenças vasculares”, diz.

“Portanto, há uma necessidade urgente de novos estudos para melhor entender esses impactos. O que podemos fazer de prático é incentivar pesquisas que investiguem três pontos principais: a via de exposição aos microplásticos, os mecanismos de absorção e eliminação e as reais consequências desses plásticos nos tecidos humanos. Em resumo, a resposta está no investimento em ciência e pesquisa”, acrescenta.

Para complementar os achados, os cientistas querem agora realizar mais estudos para entender completamente os impactos dos microplásticos na saúde humana, especialmente com o aumento das concentrações de plásticos no ambiente. Para isso, pretendem expandir a amostragem e incluir populações mais diversas. As informações são do portal de notícias G1.

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