Quinta-feira, 26 de dezembro de 2024
Por Tito Guarniere | 12 de agosto de 2023
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Somente na semana passada as polícias militares de São Paulo, Minas e Bahia mataram não menos de 50 pessoas em confrontos com a bandidagem. Morreu um único policial e longe de qualquer confronto: foi assassinado em Guarujá e a sua morte foi o estopim da vingança policial, da qual resultou um número não conhecido de vítimas, entre 16 e 20 “bandidos”.
Escrevo “confrontos” e “bandidos”, assim entre aspas e explico: muitas das vítimas foram mortas depois de rendidas, com balaços a queima-roupa, isto é, fora de qualquer confronto. E dentre os “bandidos” é certo que foram eliminadas pessoas de ficha limpa, sem antecedentes criminais. No caso de SP, até uma criança morreu de bala perdida, mais do que provavelmente da polícia.
O que temos, então, nesses episódios macabros? Não são apenas manifestações do estado de selvageria em que estamos e de modo especial, de uma parte das forças que deveriam servir ao propósito inverso, isto é, proteger as famílias, as pessoas, libertá-las da violência, salvar vidas.
Vigora entre nós uma visão de mundo abominável, qual seja, “bandidos” devem ser extirpados, eliminados fisicamente. A polícia tem o direito suposto de escolher as vítimas, cercá-las, rendê-las, , julgá-las, e puni-las com a pena máxima, a pena de morte, que nem existe na legislação brasileira.
Temos uma multidão incalculável de brasileiros estranhos, que não apenas calam, senão aplaudem quando a polícia – agentes do Estado – planejam e executam expedições punitivas e exterminadoras, promovem chacinas que deveriam merecer o mais profundo repúdio, envergonhar a comunidade nacional, levar ao banco dos réus todos os responsáveis, os que deram e os que cumpriram as ordens sinistras, principalmente os mais graduados.
Esses protagonistas cruéis não são bandidos comuns, mas bandidos de alma, deles advêm as justificativas de sempre: as forças policiais estavam passando por ali, nesses campos de batalhas, e foram recebidos à bala pelos bandidos. Os bandidos são ruins de pontaria e nunca acertam os policiais. Já os policiais são campeões de tiro e deixam o chão encharcado de sangue dos cadáveres. E (praticamente) todos eles escapam ilesos do suposto tiroteio. Os cadáveres são invariavelmente de traficantes, assaltantes e estupradores.
É uma ofensa à inteligência, é preciso uma alta dosagem de caradurismo, de má-fé, de apego à violência quase gratuita, para alegar a versão parcial, a meia verdade que esconde os fatos na sua inteireza e realidade. Não, definitivamente os mocinhos desse faroeste trágico não são os comandantes militares, secretários de Segurança e Justiça(?), governadores.
Há também os personagens que simplesmente se omitem, como a esmagadora maioria dos pastores evangélicos, e mesmo de outras confissões religiosas, como os católicos, diante do assassinato em massa de (em geral) jovens, pobres, negros.
Condenam ao fogo do inferno quem defende a legalização do aborto (que nem existe) ,mas guardam silêncio obsequioso, quase cúmplice, sobre as matanças que todos os dias inundam as calçadas de sangue nas ilhas de pobreza, nas periferias pobres deste país.
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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