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Por Redação O Sul | 4 de abril de 2021
Uma equipe de pesquisadores do Centro de Astrobiologia da Espanha (CAB) apresentou o mapa estelar mais preciso da Via Láctea de que se tem registro. Neste plano celeste, construído principalmente com as observações do telescópio Gaia, da Agência Espacial Europeia, podem ser vistos com clareza três dos grandes braços espirais de estrelas que constituem a nossa galáxia: o de Orion, onde se encontra o sistema solar; o de Perseu, localizado na borda externa da galáxia, e o de Sagitário, em direção ao centro da Via Láctea.
Durante a pesquisa, o grupo de cientistas do CAB, liderado por Michelangelo Pantaleoni González e Jesús Maíz Apellániz, descobriu uma estrutura oculta que chamaram de esporão de Cefeu.
Pantaleoni, um jovem pesquisador que, sem ter terminado ainda a licenciatura em Física, já é autor de seis publicações nas revistas de maior impacto na sua área, diz que esta nova região é uma “ponte de enormes estrelas azuis que se estende por um ramo de 10.000 anos-luz de longitude e deixa o braço espiral de Órion para se conectar com o de Perseu”.
Segundo ele, o esporão de Cefeu nunca havia sido visto antes porque não existia um catálogo estelar tão detalhado. “No mapa galáctico que traçamos, que é a atualização do catálogo ALS (de Alma Luminous Stars) e tem 20.000 objetos celestes classificados, se observa uma superdensidade de estrelas em um espaço que antes estava aparentemente vazio”, ele explica.
Os resultados do trabalho, publicados recentemente na revista britânica Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, mostram que o esporão não é um alinhamento aleatório de estrelas, mas uma estrutura compacta que parece ter um movimento consistente. Além disso, diz Pantaleoni, “comprovamos que toda a estrutura está localizada ligeiramente acima do disco galáctico, cerca de 300 anos-luz acima do plano médio da galáxia”.
Acredita-se que essa diferença de altura seja causada por algo como enrugamentos que foram observados em outras galáxias vizinhas, mas até recentemente não haviam sido vistos na Via Láctea. “Possivelmente são oscilações do disco galáctico decorrentes da evolução convulsiva da galáxia, talvez sejam ecos de colisões com outras galáxias bilhões de anos atrás ou talvez seja outra coisa”, diz o pesquisador.
As estrelas azuis maciças que compõem o novo esporão, chamadas de estrelas OB pelos astrofísicos, são as maiores, mais raras e de temperatura mais elevada da galáxia. Dos estimados 400 bilhões de estrelas na Via Láctea, menos de uma em um milhão é uma estrela OB.
Elas são de certa forma uma “doença rara”, diz Pantaleoni. Enquanto a superfície de uma estrela como o Sol está a 5.500 graus centígrados, as estrelas OB superam 30.000 graus centígrados e têm dezenas de vezes sua massa. Os pesquisadores explicam que a relação entre a temperatura de um objeto e a cor em que ele resplandece é chamada de lei de Planck.
“Se aquecermos um pedaço de carvão a mais de 1.000 graus centígrados, começaremos a ver que ele brilha com uma cor vermelho escura. Se aquecermos essa brasa cada vez mais, atingirá a temperatura do Sol e brilhará numa cor branco amarelada e se continuarmos conseguiremos que a cor desse brilho seja azul”, explica Pantaleoni. Ele brinca: “Há piadas por aí sobre astrofísicos queimando as mãos em banheiros públicos por não entenderem o código de cores das torneiras”.
Apellániz e Pantaleoni afirmam que as estrelas OB são os objetos mais interessantes do universo porque as reações nucleares que ocorrem em seu interior são particularmente violentas. Isso os torna as maiores fábricas de elementos pesados.
“Os elementos de que nosso planeta é feito, como o silício ou os átomos de fósforo em nosso DNA, provêm principalmente do interior de estrelas desse tipo que morreram há bilhões de anos”, diz Pantaleoni. Além disso, estrelas azuis maciças são os gatilhos para grandes explosões de formação de estrelas.
Quando uma estrela OB morre, ela libera uma enorme energia na forma de uma supernova, que comprime o gás interestelar ao longo de vários anos-luz. Esse gás comprimido atinge temperaturas altíssimas e é a base para a formação de novas estrelas. “Uma estrela OB pode, com sua morte, dar vida a centenas de estrelas como o Sol”, diz Pantaleoni.