Sábado, 16 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 5 de outubro de 2021
A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ligada ao Ministério da Saúde, deve recomendar a exclusão definitiva do uso na rede pública do chamado “tratamento precoce”, defendido pelo presidente Jair Bolsonaro. Formado por técnicos, o grupo se reunirá nesta quinta-feira (7) para discutir o assunto. Segundo informações do jornal O Estado de S. Paulo, a tendência do colegiado é de se opor à prescrição de cloroquina e outros medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid-19.
Auxiliares próximos ao presidente preveem que uma decisão da Conitec de aprovar uma diretriz em que a cloroquina não é recomendada poderá ser usada politicamente pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, do Senado, como prova de que Bolsonaro ignora avaliações científicas ao defender de forma reiterada os medicamentos do “kit covid”.
Em maio do ano passado, o Ministério da Saúde divulgou orientação em que recomendava a administração da cloroquina desde os primeiros sinais da doença. Na ocasião, o documento foi a alternativa encontrada pelo então ministro, general Eduardo Pazuello, diante das dificuldades de se criar um protocolo propriamente dito – este sim com poder de ditar regras de atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS). Antes de Pazuello, dois ministros – Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich – se recusaram a publicar a recomendação e deixaram o cargo.
Já em maio deste ano, a comissão contraindicou os remédios ineficazes para pacientes internados. Agora, serão definidas as diretrizes para os casos de pacientes que não estão hospitalizados. Na prática, enquanto não há uma orientação oficial, cabe a cada médico decidir se receita ou não esses medicamentos.
Em tese, o Ministério da Saúde não tem obrigação legal de seguir os pareceres da Conitec, mas, geralmente, acata as recomendações do órgão técnico. Quando depôs à CPI da Covid, em 8 de junho, o ministro Marcelo Queiroga confiou à Conitec a palavra final sobre a recomendação ou não do uso do remédio para tratar pacientes contra o novo coronavírus no SUS.
“Infelizmente, hoje ainda, nós não temos medicações com eficácia comprovada para o enfrentamento dessa doença. Então, vamos esperar uma manifestação da Conitec sobre o tratamento da covid em todas as fases. Aí teremos uma política pública consolidada, oxalá com uma harmonização da classe médica sobre esse assunto, e encerramos de vez essa questão, para investir no que é fundamental”, declarou, à época.
Apesar das comprovações científicas da ineficácia, Bolsonaro continuou a defender o chamado “tratamento precoce”, inclusive em seu discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), no mês passado. “Desde o início da pandemia apoiamos a autonomia do médico em busca do tratamento precoce. Eu mesmo fui um desses que fez tratamento inicial”, afirmou.
Nas últimas semanas, a defesa do tratamento precoce foi um dos pontos explorados nas investigações da CPI da Covid, no Senado. Agora, os aliados do presidente temem que a decisão em relação ao tratamento ambulatorial da Conitec seja usada pela CPI contra o próprio governo. “A Conitec tem que reprovar isso porque o mundo inteiro reprovou”, afirmou o senador Otto Alencar (PSD-BA), que é médico. “Queiroga está muito fragilizado. Aceitou tudo o que Bolsonaro impôs, mais ou menos igual o Pazuello. Faz o que Bolsonaro quer, então fica”, afirmou o parlamentar.
A possibilidade de o órgão ligado à Saúde excluir a cloroquina de vez da rede pública também entrou na lista de insatisfações da chamada “ala ideológica” do governo com Queiroga.
O titular da pasta já é alvo de críticas de aliados por ter liberado a vacinação de adolescentes e por não atuar de forma eficaz para barrar o “passaporte da vacina” – ele mesmo sugeriu o modelo, em abril. Queiroga ainda vem sendo pressionado por Bolsonaro a divulgar um plano para desobrigar o uso de máscaras.
Agora, uma nova decisão da Conitec contrária à vontade da ala ideológica pode ser também creditada a Queiroga e usada para intensificar o processo de fritura. Apesar de não ter influência direta sobre o grupo, coube ao ministro a escolha do presidente do colegiado, o médico Carlos Carvalho, professor titular de Pneumologia da USP.
Carvalho é crítico da cloroquina e esteve entre os signatários de uma carta de profissionais da saúde que recomendava respeito às medidas de distanciamento, de higiene e de uso de máscara, além do combate à desinformação e às más práticas de prevenção e tratamento. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.