Por 6 votos a 5, o plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, nesta segunda-feira (19), declarar a inconstitucionalidade das indicações de despesas por deputados e senadores para o chamado orçamento secreto.
A sessão desta segunda-feira começou às 10h com o voto do ministro Ricardo Lewandowski, que votou com a relatora para derrubar as emendas. Para o ministro, o Congresso buscou travar com a Corte um diálogo a partir das iniciativas dos presidentes do Congresso com esforços muito grandes.
“No entanto, quero adiantar, apesar dos esforços, o Congresso não conseguiu se adequar ao que exige a Suprema Corte no que tange aos parâmetros constitucionais que devem enquadrar as iniciativas processo orçamentação. Embora a nova resolução tenha representado grande avanço, a experiência legislativa revela que as normas não foram capazes de evitar a preponderância dos poderes não institucionais do relator do orçamento”, disse.
Gilmar Mendes
O ministro Gilmar Mendes votou para manter com mais critério de transparência. Segundo o ministro, é um tema muito importante, mas um capítulo de evolução política.
“No início de um novo governo, é a oportunidade que se tem de ‘deitar luzes’ sobre toda essa questão que se consolidou nesses últimos seis, sete anos a partir da criação da emenda impositiva”, disse Gilmar.
Seis ministros votaram para considerar o orçamento secreto inconstitucional. O voto de Rosa Weber, relatora das ações, foi acompanhado pelos ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski.
Os ministros André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, embora não tenham concordado integralmente, avaliam que o mecanismo deve continuar válido, desde que passe a ter mais transparência e a seguir critérios de distribuição de recursos.
O orçamento secreto
O orçamento secreto é alvo de críticas pela falta de transparência e por beneficiar somente alguns parlamentares. O destino dos recursos é definido em negociações entre parlamentares aliados e o governo. Justamente por isso, se tornou – durante o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) – moeda de troca entre o governo federal e o Congresso Nacional.
O julgamento tem impacto político na articulação pela aprovação no Congresso da Proposta de Emenda à Constituição que amplia o teto de gastos, além de seu resultado definir as relações entre os Poderes e indicar como será a governabilidade de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a partir do ano que vem.
O julgamento
A análise começou na última semana, quando ocorreram as sustentações orais. Naquele dia, a Advocacia-Geral da União e a Procuradoria-Geral da República defenderam a legalidade do orçamento secreto alegando que o Congresso aprimorou o instrumento.
Na sessão da última quarta-feira (14), quando o julgamento foi retomado, a ministra Rosa Weber, relatora das quatro ações que questionam as emendas de relator, votou para declarar o orçamento secreto inconstitucional. O voto de Rosa Weber foi acompanhado pelo dos ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
Em seu voto, a ministra afirmou não ser possível saber quem são os parlamentares que integram o grupo privilegiado e quais os valores geridos por eles. De acordo com Rosa Weber, não existem critérios objetivos e claros para o pagamento das despesas e nem são cumpridas regras de transparência no pagamento dos recursos.
A ministra afirmou em seu voto que os verdadeiros autores das indicações preservam o anonimato e que o destino dos recursos fica recoberto por um manto de névoas. Para a ministra, a política usa fórmulas para dar aparência de institucionalidade ao que não encontra amparo na lei.
A relatora das ações afirmou ainda que o orçamento secreto do jeito que funciona hoje viola o princípio republicano e que as mudanças promovidas pelo Congresso após a ordem do STF foram insuficientes para garantir transparência às emendas de relator.
Os votos
Já na quinta-feira (15), o primeiro a votar foi o ministro André Mendonça, que votou para considerar o orçamento secreto constitucional. Mendonça defendeu, no entanto, que o Congresso Nacional deve normatizar as emendas para explicitar valores e rateios. Ou seja, o ministro votou para manter as emendas de relator, mas com mais transparência.
O ministro Nunes Marques também votou pela possibilidade de manutenção do mecanismo do orçamento secreto. Em seu voto, o ministro, que assim como Mendonça foi indicado ao STF pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), ressaltou que a discussão sobre as emendas de relator é um assunto interno do Congresso e que não cabe ao STF interferência.
Ao votar, o ministro Alexandre de Moraes apresentou um voto médio, como alternativa às duas correntes que se formaram – a capitaneada por Rosa Weber e a sugerida por André Mendonça. Moraes propôs que as emendas de relator passem a adotar o mesmo procedimento de transparência previsto para as emendas individuais.
Seu voto também prevê que haja identificação de nome do parlamentar, valor, destinação e prioridade, além de determinar que a proporcionalidade seja levada em conta na distribuição dos recursos.
O ministro Dias Toffoli também apresentou uma alternativa em seu voto. Toffoli defendeu que as emendas de relator devem respeitar os princípios constitucionais da transparência, da imparcialidade e da isonomia entre os entes federativos, sendo obrigatória a identificação dos responsáveis pelas indicações e dos beneficiários.
Uma das sugestões do ministro é a de que as emendas destinadas a cada município não ultrapassem, em cada exercício financeiro, o limite de 50% do Fundo de Participação dos Municípios.
PGR muda de posição
No final do julgamento, o procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu a palavra para anunciar uma mudança de posição e aderir ao voto de Rosa Weber pela inconstitucionalidade e derrubada do mecanismo. Antes, a Procuradoria-Geral da República (PGR) havia se manifestado em defesa do orçamento secreto.
Em sustentação no início do julgamento, a vice-procuradora-geral Lindôra Araújo chegou a pedir “respeito” à atuação dos parlamentares e rebateu acusações de desvios de recursos pelo uso do instrumento. Aras solicitou à presidente do STF que registrasse em ata a sua mudança de posição e disse que a manifestação anterior havia sido feita em um momento de “cognição incompleta”.
— Parece-me relevante registrar que o Ministério Público Federal na sessão de sustentação oral acompanhou Vossa Excelência, alterando a sua posição inicial em sede de cognição incompleta, daí porque o procurador-geral nesta assentada requer a vossa excelência que conste em ata essa mudança de posicionamento — afirmou durante a sessão.
Sua manifestação foi feita depois que todos os onze ministros proferiram seus votos, que deram ao julgamento o resultado de 6 votos pela derrubada do orçamento secreto e cinco a favor de sua constitucionalidade.
Distribuição proporcional
O texto aprovado no Legislativo institui novos critérios de distribuição das chamadas emendas de relator. Segundo a resolução, 80% do valor reservado à rubrica RP-9 (emenda de relator) passaria a ser distribuído de forma proporcional à representação dos partidos no Congresso.
A proporção de 80% do valor reservado para a RP-9 corresponde a R$ 15,5 bilhões. Essa fatia seria dividida entre Câmara e Senado, sendo R$ 4,52 bilhões para senadores e R$ 10,98 bilhões entre os deputados. Indicações conjuntas do relator-geral e do presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), cargos ocupados hoje pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI) e pelo deputado Celso Sabino (União-PA), ficarão com 5% das emendas. Com isso, poderão alocar R$ 970 milhões.
O restante fica à disposição das mesas da Câmara e Senado, comandadas pelos presidentes Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Cada um será responsável pela indicação de R$ 1,45 bilhão por meio de emendas de relator — ou seja, 7,5% do total cada.