Sábado, 26 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 25 de abril de 2025
Nessas três décadas, o político alagoano conseguiu se livrar de processos criminais, manter-se livre e até se eleger senador.
Foto: Roque de Sá/Agência Senado“O tempo é senhor da razão”. A frase estava estampada em uma das camisetas usadas pelo então caçador de marajás que fora o primeiro presidente eleito pelo voto direto após a ditadura militar. Era década de 1990 e Fernando Collor cultivava o hábito de mandar mensagens nas camisas que usava em corridas dominicais próximo à Casa da Dinda, residência da família que se tornou o lar oficial do chefe do Poder Executivo na temporada em que ele permaneceu no poder. Passados 33 anos desde que foi alvo de impeachment, Collor tem o rumo da cadeia apontado pelo Supremo Tribunal Federal.
Nessas três décadas, o político alagoano conseguiu se livrar de processos criminais, manter-se livre e até se eleger senador. Dos conturbados anos de sua gestão na presidência da República, os brasileiros viram atônitos suas contas serem confiscadas, assistiram o alagoano pilotar jet-ski, pegar carona em avião caça da FAB e ser denunciado pelo próprio irmão.
A denúncia de Pedro Collor, estampada na capa da revista Veja de maio de 1992 foi o começo do fim daquele governo que prometia domar a inflação, mas naufragou. Do irmão veio a acusação de que o presidente mantinha um esquema de corrupção operado pelo tesoureiro de campanha Paulo Cesar Farias, empresário alagoano que terminaria assassinado anos depois.
Pedro Collor deu entrevistas, prestou depoimentos e até escreveu um livro. Nas inconfidências, o irmão delator – na época não havia essa figura hoje prevista em lei – escancarou não só os atos de corrupção, como revelou detalhes da conduta pessoal de Fernando Collor, falando de sexo e até uso de drogas por métodos impensáveis.
Collor foi acusado de se beneficiar de recursos desviados de seu próprio governo. O Esquema PC cobrava propina de empresas e Collor mantinha suas contas em dia às custas de cheques em nome de pessoas inexistentes. Eram os cheques fantasmas. Até os jardins da Dinda foram remodelados a soldo do Esquema PC.
A fila de empresas que pagaram propina era longa. Algumas delas reapareceriam em outros escândalos, incluindo os da Lava Jato décadas depois, operação que reuniu provas para a condenação sempre adiada de Collor. Na lista de pagadoras de propina sob coação ou voluntarismo estavam Odebrecht, OAS e até a Mercedes Benz.
A denúncia de Pedro levou Fernando a inaugurar o instituto de impeachment de um presidente da República. Collor deixou o Planalto pela porta da frente fazendo pose de quem não tinha se dado por vencido. Voltou de helicóptero para a Dinda e já sentiu o gosto do poder indo embora ao ver um pedido seu de sobrevoar algumas áreas da capital negado pelo piloto.
Após votação na Câmara, veio o julgamento no Senado. Collor ainda tentou renunciar antes da votação. Não adiantou. Senadores seguiram com a sessão. Da Casa da Dinda, viu a faixa presidencial ir embora de vez. Na época, recebeu jornalistas na biblioteca no terreno ao lado de sua mansão que fica às margens do lago Paranoá.
Ao abrir a porta, fez questão de apertar com força desmesurada a mão de quem estava ali de plantão, destilando o ódio de ter sido ceifado do poder por reportagens de jornalistas como os que estavam ali para ouvi-lo. Fez discurso de perseguido e injustiçado, falas repetidas hoje por outro ex-presidente que está no banco dos réus.
As acusações sobre o Esquema PC não resultaram em condenação. O mesmo STF de onde agora sai a ordem de prisão, da década de 1990, preferiu absolver o ex-presidente por falta de provas. Antes, o político se sentou no banco dos réus e foi prestar depoimento ao então relator Ilmar Galvão. Diante do magistrado que ele mesmo havia indicado ao STF, inventou que o dinheiro que chegava em sua conta era fruto de sobras de campanha e não propina.
No dia do julgamento, a maioria do ministros entendeu que faltavam atos oficiais de Collor para atestar a corrupção. Ele recebeu dinheiro em suas contas, mas fez isso em troca de que? Era a pergunta dos ministros da Corte diante de uma denúncia que sustentava que não havia necessidade de indicar os atos para prender um corrupto. Três ministros tiveram esse entendimento, mas outros cinco não. E Collor, já sem a faixa presidencial, saiu livre. Permaneceu assim até o despacho do ministro Alexandre de Moraes, na noite desta quinta-feira, 24, mandando prender o político das Alagoas.
(Opinião Francisco Leali, do jornal O Estado de S. Paulo)