Nos últimos meses, Yevgeny Prigozhin, o chefe do grupo paramilitar russo Wagner, ofereceu a vários africanos presos na Rússia a libertação e a anulação de suas sentenças em troca da participação desses detentos na guerra na Ucrânia. Desde o início do conflito, pelo menos três cidadãos africanos foram recrutados, dos quais ao menos dois morreram no conflito.
“Se você lutar por seis meses, estará livre”. A promessa parecia tentadora para Lemekhani Nathan Nyirenda, um zambiano de 23 anos, e Nemes Tarimo, um tanzaniano de 33 anos, presos em Moscou depois de serem condenados, em dois casos separados, por porte de drogas, enquanto estudavam na capital russa. Abordados por representantes do grupo de mercenários Wagner, ambos aceitaram a oferta.
Os dois foram mobilizados como soldados, na linha de frente dos combates. Acabaram mortos entre setembro e outubro.
Em 24 de janeiro, o governo da Tanzânia divulgou a morte de Nemes Tarimo, depois de receber a confirmação de relatórios das autoridades russas. O homem havia se estabelecido em 2020 em Moscou, onde estudava na Academia de Tecnologia.
“Depois de seus estudos na Rússia, ele voltou para a Tanzânia, onde queria ser deputado pelo partido da oposição. Mas o plano não funcionou e ele voltou a Moscou para fazer sua vida lá”, contou Pauline Bax, diretora do Programa África do International Crisis Group.
“Dívida” com a Rússia
Já Lemekhani Nathan Nyirenda havia começado uma sentença de nove anos de prisão nos subúrbios de Moscou. Foi o próprio Prigozhin quem deu detalhes sobre o caso após a morte do zambiano, por meio de seu meio de comunicação preferido: seu canal no Telegram. “Lembro-me bem desse cara”, escreveu. “Fiz uma pergunta a ele: ‘Por que você quer lutar? Afinal, as chances de morrer são muito grandes”, relatou.
Segundo o chefe do grupo paramilitar, o zambiano teria respondido que “vocês, russos, ajudaram os africanos a alcançar a independência. Isso é o mínimo que posso fazer para pagar nossa dívida”.
A instalação de jovens africanos na Rússia por longos períodos é facilitada por parcerias universitárias históricas entre Moscou e vários países da África, como Zâmbia e Tanzânia – uma tradição que remonta à Guerra Fria. “Naquela época, muitos russos que trabalhavam com engenharia civil vinham lecionar nas universidades africanas”, explica Bax.
No início de janeiro, foi identificado outro recruta que afirma ser de nacionalidade marfinense. Em um vídeo veiculado nas redes sociais, o jovem, que aparece ao lado de Yevgeny Prigozhin, oligarca fundador da Wagner, é filmado em trajes de combate. Ele fala em russo e específica que também foi recrutado na prisão.
Treinamento rápido
A guerra na Ucrânia está prestes a completar um ano e, há seis meses, o grupo Wagner vasculha os centros penitenciários russos em busca de centenas de prisioneiros nacionais ou estrangeiros.
Antes de ir ao front, eles aprendem métodos de combate comuns, mas extremamente resumidos. “Eles recebem um pouco de treinamento, mas não é muito. Talvez algumas semanas ou alguns meses, mas não mais. […] O risco é enorme”, diz a pesquisadora.
Depois de confirmar a morte de um de seus cidadãos, o ministro das Relações Exteriores da Tanzânia, Stergomena Tax, pediu para os tanzanianos não “se juntarem a nenhum exército ou grupo armado em outros países”.