Um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) apontou que pessoas que tiveram Covid-19, mesmo com quadros leves, tendem a apresentar desequilíbrios no sistema cardiovascular no curto e médio prazo. O trabalho foi publicado na revista científica Scientific Reports e teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
O estudo analisou 130 voluntários, de em média 40 anos, que foram divididos em quatro grupos, um de indivíduos saudáveis para comparação e outros de pessoas que tiveram Covid-19 leve, sem necessidade de hospitalização, divididas pelo tempo da infecção.
Os resultados mostraram uma diminuição drástica na variabilidade da frequência cardíaca (VFC), ou seja, na variação do tempo entre cada batimento do coração, entre aqueles até seis semanas após a infecção, em comparação com os que não tiveram Covid-19.
Já aqueles testados entre dois e seis meses após a contaminação, assim como os avaliados entre sete e 12 meses, tiveram melhoras no indicador, embora ainda não tivessem retornado ao patamar observado entre os que não tiveram a doença.
Aldair Darlan Santos-de-Araújo, pesquisador da UFSCar e primeiro autor do artigo, lembra que uma série de estudos já destacaram os impactos do vírus no sistema cardiovascular, levando ao aumento de uma série de doenças como trombose e infarto.
“Nossa pesquisa contribui para a confirmação desse impacto e demonstra que ele pode acontecer também em indivíduos jovens ou de meia-idade que tiveram Covid leve e não precisaram ser hospitalizados”, afirma à Agência Fapesp.
Para Audrey Borghi Silva, coordenadora do Laboratório de Fisioterapia Cardiopulmonar (Lacap) da UFSCar, o trabalho “reforça a necessidade de programas de reabilitação até para pessoas que tiveram Covid leve”.
O trabalho brasileiro também encontrou um desequilíbrio na relação entre o sistema nervoso simpático e o parassimpático. O primeiro é responsável por aumentar a frequência cardíaca em situações atípicas, como as que envolvem perigo e medo, enquanto o parassimpático faz o coração desacelerar quando necessário.
“O bom funcionamento cardiovascular exige um equilíbrio entre esses dois mecanismos, mas o que observamos é que o impacto negativo da infecção pela Covid-19 nesses indivíduos provocou um desbalanço no sistema nervoso autônomo. O padrão observado – de redução da variabilidade da frequência cardíaca e predominância do sistema nervoso simpático – indica não apenas diminuição da modulação autonômica global, mas também sugere uma maior probabilidade de desfechos cardiovasculares desfavoráveis”, explica Santos-de-Araújo.
Além disso, o trabalho mostra que a dispneia (falta de ar) é o sintoma mais comum entre os indivíduos com pior modulação autonômica cardíaca, que também relataram tosse, fadiga, cefaleia (dor de cabeça), perda do paladar, ansiedade e coriza.
A boa notícia é que o desequilíbrio foi mais comum entre não vacinados e que o estudo aponta para uma fase de recuperação da função cardíaca, já que os indivíduos com mais tempo desde a infecção apresentaram um comportamento melhor do equilíbrio simpático-parassimpático e menor variabilidade da frequência cardíaca.