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Crise na previdência: protestos de aposentados na Argentina revelam preocupação global

Aposentados estão entre os mais afetados pelos ajustes econômicos na Argentina. (Foto: Reprodução/EFE)

Recentemente, aposentados realizaram protestos em Buenos Aires, capital da Argentina, que chamaram atenção pela participação de grupos radicais de torcedores de futebol e pela intensa repressão policial.

Esses eventos expõem a crise da previdência social na Argentina e na América Latina, destacando o desafio de manter a viabilidade do sistema de proteção social diante do envelhecimento da população.

No dia 12 de março, mais de 100 pessoas foram detidas, na manifestação mais violenta desde que o presidente Javier Milei assumiu o cargo em dezembro de 2023.

Os aposentados estão insatisfeitos com as políticas do atual presidente. Segundo Javier Curcio, diretor do Departamento de Economia da Universidade de Buenos Aires, os ajustes nas políticas públicas têm afetado principalmente os aposentados, com uma queda de até 30% no valor dos benefícios.

Isso coloca muitos aposentados em situação de pobreza ou extrema pobreza. Além disso, Milei decidiu não prorrogar a moratória que permitia a aposentadoria de pessoas que não tinham completado os 30 anos de contribuição exigidos.

Atualmente, apenas uma em cada dez mulheres e três em cada dez homens conseguem se aposentar com o tempo de contribuição necessário.

Fenômeno global

Esse problema não é exclusivo da Argentina. Em todo o mundo, a população está envelhecendo rapidamente.

A Organização das Nações Unidas (ONU) estima que o número de pessoas com 65 anos ou mais vai dobrar até 2050, chegando a 1,5 bilhão. Isso pressiona os sistemas de previdência, que dependem das contribuições da população economicamente ativa. Muitos países estão discutindo reformas para aumentar a idade mínima de aposentadoria.

O desafio é mais antigo em economias desenvolvidas, como as da Alemanha e Japão, onde o crescimento populacional já alcançou o pico, pelos cálculos da ONU. No entanto, a questão agora começa a ser mais urgente também nos países emergentes.

Na América Latina, os problemas mais gerais se somam a questões particulares, como o alto nível de informalidade na economia e a corrupção. Em 2019, o Brasil aprovou uma reforma da previdência, que aumentou a idade mínima de aposentadoria a 62 anos para mulheres e 65 anos para homens.

Mesmo assim, o país enfrenta uma série de dificuldades para equilibrar as contas previdenciárias. Um estudo do Banco Mundial estimou que, sem uma ação nas próximas décadas, a idade mínima teria que subir para 72 até 2040 e para 78 até 2060.

“Será impossível continuar a compensar o envelhecimento populacional a médio e longo prazo apenas com aumentos na idade de aposentadoria e outras reformas serão necessárias”, defende a instituição.

Outros países

O panorama é parecido para além das fronteiras brasileiras. O valor mínimo das aposentadorias ajuda a traçar uma comparação entre os diferentes países, embora não seja uma métrica perfeita.

Com base no poder de compra, na Argentina, “a capacidade de proteção é inferior à de outras aposentadorias expressas em dólares em outros países da América Latina”, segundo Curcio.

Na Venezuela, a situação é ainda mais crítica. O país, onde a aposentadoria mínima, de 130 bolívares, não chega a 2 dólares, não tem crescimento econômico suficiente para resolver os problemas da previdência.

Diferente da Argentina, os venezuelanos não têm protestado por melhorias na previdência, pois a oposição ao governo é fortemente reprimida.

Uma comparação mais completa teria de analisar muitos outros parâmetros. A consultora alemã Mercer avalia até cinquenta variáveis, em questões como a sustentabilidade do sistema previdenciário ou a cobertura dos aposentados.

A análise permite o cálculo de uma pontuação que gera o Índice Global de Sistemas Previdenciários, uma classificação da previdência em 48 países. O Brasil é o 33º da lista, com 55,8 pontos, enquanto a Argentina aparece na 47ª colocação, com 45,5 pontos.

A Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) avalia os sistemas previdenciários da região e oferece recomendações.

Claudia Robles, da Cepal, explica que é importante considerar a cobertura, a suficiência dos benefícios e a sustentabilidade financeira dos sistemas de previdência. Ela destaca que, entre 2000 e 2022, a cobertura dos sistemas de previdência na América Latina aumentou, mas ainda há muita desigualdade entre os países.

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