Há mais de um ano, a cubana Yaime Perez Acuna deixou de atuar como médica em dois postos de saúde de Crucilândia, na Região Central de Minas Gerais. Com o fim da parceria entre seu país e o Brasil no Programa Mais Médicos, em 2018, ela se tornou garçonete em Belo Horizonte (MG). Mas com a crise provocada pelo novo coronavírus, Yaime será convocada para a linha de frente nos hospitais.
“É um alívio. Voltar a clinicar depois de todo este tempo é um alívio. Estou muito feliz também. Feliz em poder ajudar”, disse a médica de 30 anos.
Como vários outros profissionais cubanos, Yaime decidiu ficar no Brasil após o fim do acordo em novembro de 2018, na esperança de fazer o Revalida (Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos Expedidos por Instituições de Educação Superior Estrangeiras). O último havia sido aplicado em 2017.
Para sobreviver, ela passou a servir mesas em um restaurante de Belo Horizonte. A cubana, especialista em saúde da família e em doenças tropicais, como a dengue, chegou ao Brasil em março de 2017.
Yaime era a única médica no posto que trabalhava em Crucilândia, cidade com pouco mais de seis mil habitantes, cujo Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH) é 0,651, pouco menor que o do Iraque, 0,654, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
Ela trabalhava no Programa Saúde da Família (PSF), atendendo pacientes com doenças crônicas, crianças e grávidas. A médica também fazia consultas domiciliares no interior do Estado.
Yaime ainda não sabe em qual hospital atuará na crise do novo coronavírus. Mas isso não importa para ela. “Estou muito ansiosa em poder voltar a atuar como médica. A doença está avançando por aqui e quero ajudar”, disse a cubana.
Edital
O governo federal abriu um edital na quinta-feira (26) para reincluir no Mais Médicos 1.800 cubanos que ficaram no Brasil após o rompimento dos contratos entre Cuba e Opas (Organização Pan-americana de Saúde) em 2018.
O documento, publicado em edição extra do Diário Oficial da União desta quinta, prorroga por mais dois anos os contratos dos profissionais.
Embora coincida com a pandemia do novo coronavírus, a abertura do edital já era prevista desde a aprovação da lei do Médicos pelo Brasil, nome dado ao programa que deve substituir progressivamente o Mais Médicos, por meio da transferência das vagas ao fim de cada contrato.
Na prática, a reinclusão deve dar novo fôlego ao Mais Médicos em um momento de queda do número de profissionais no programa.
Das 18.240 vagas originais, apenas 13.845 têm médicos em atuação hoje. As demais estão suspensas ou aguardam para serem substituídas. Para comparação, em novembro de 2018 o programa tinha 15.002 médicos em atuação. Em janeiro, esse número passou a 14.298 e, agora, a 13.845.
O alto número de vagas desocupadas ocorre em meio à decisão da atual gestão de renovar apenas contratos em municípios de perfis 4 a 8, em uma escala que vai de 1 a 8. Quanto maior o número, maior a vulnerabilidade. O objetivo é abrir espaço para o novo programa, que terá mudanças na distribuição das vagas.
Municípios, porém, contestam a medida. Atualmente, das 4.395 vagas sem médicos, 1.154 estão em cidades de perfis 4 a 8, que ainda aguardam reposição. As demais estão em cidades excluídas dos últimos editais, como capitais e regiões metropolitanas.
A regra prevê a reinclusão, por dois anos, de médicos que estavam em atividade em 13 de novembro de 2018 e que permaneceram no país até agosto de 2019. Nesse período, devem passar por provas de revalidação do diploma.
A primeira data corresponde aos contratos vigentes no momento em que Cuba anunciou a saída do programa após críticas de Bolsonaro à qualidade da formação dos profissionais. A segunda, ao envio da MP que cria o Médicos pelo Brasil.
Para recontratar os médicos cubanos, o governo deve expedir novamente uma autorização temporária de trabalho, mesmo sem revalidação do diploma.