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De rombos e buracos

É preciso tapar o sol com a peneira para não reconhecer que o problema central do Brasil está na coluna dos gastos públicos. Basta ler três ou quatro notícias a esmo nos maiores jornais do país para (re)descobrir que não têm fim os ralos por onde se esvai o dinheiro do povo.

Dou-lhes exemplos. O governo Lula resolveu dar uma espécie de mesada aos estudantes pobres das escolas públicas que completarem o ensino médio. É bom, não? Afinal, uma das calamidades do ensino médio é justamente a evasão escolar. E quem são os primeiros que desistem? Exatamente os mais pobres. Então qual a crítica? Vamos convir: não há nada mais fácil do que assinar o cheque do benefício. Porém, somente no ano corrente ele custará nada menos de R$ 6 bilhões de reais – em 10 anos está calculado em 26 bi.

Outra notícia: o TCE de São Paulo enviou cartas de advertência do virtual desenquadramento face à Lei de Responsabilidade Fiscal a nada menos do que 90% dos municípios paulistas. Reparem: são municípios do estado mais rico e desenvolvido do país. E neles apenas 10% se dão ao capricho de respeitar os limites da LRF, que era para ser um marco do controle dos gastos públicos no Brasil.

Há falcatruas raras, mas que servem de exemplo para demonstrar que ninguém dispensa de tirar uma lasquinha do tesouro. Dois altos e espertalhões chefes militares do tempo de Bolsonaro, um general e um almirante, e mais um alto funcionário civil, receberam salários extras na ordem dos R$ 100 mil mensais cada um, alegando que tinham direito à quarentena legal de seis meses. Não tinham. Mentiram para obter o benefício. Se não fosse, a imprensa passava sem ninguém perceber.

E há grandes rombos em andamento, como escreve o jornalista Fábio Gambiagi em O Estado de São Paulo. Ele explica que a lei do salário-mínimo manda dar aumento anual igual ao crescimento do PIB mais a inflação. Isso impacta diretamente a previdência social.

Na hipótese de o PIB crescer 2% em 2023 vai resultar no primeiro ano um acréscimo nas contas da previdência da ordem dos R$ 10 bilhões. No segundo ano, serão novos R$ 10 bi, mais os R$ 10 bi do primeiro ano, totalizando então R$ 30 bi. Nenhum aumento de receita dá conta. Efeito acumulado em 10 anos: R$ 550 bilhões de reais. Uma única canetada, a do aumento do salário-mínimo, desfaz pela metade os efeitos da reforma previdenciária de Bolsonaro.

O programa de passagem aérea a R$ 200 reais, que só é possível porque vai entrar dinheiro do governo, deve causar um rombo da ordem dos 5 bilhões de reais em menos de dois anos. Como ninguém paga o FIES, ou se paga é com descontos de pai para filho, o buraco do programa já deixou a faixa de R$ 50 bilhões de reais há muito tempo. Etc.

Não há Haddad que resista, não há quem consiga controlar os gastos, porque na vida real o que aparecem, de todos os lados, são chefões dos partidos e de bancadas, sindicatos, líderes de igrejas e corporações empresariais, movimentos sociais que, insaciáveis, batem na porta do governo todos os dias, chorando pitangas, advertindo sobre a importância vital de cada um deles para o Brasil, pedindo dinheiro.

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