Sábado, 08 de março de 2025
Por Redação O Sul | 20 de junho de 2024
Em uma reunião cercada de expectativas, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) veio em linha com o esperado – manutenção unânime da Selic em 10,5% –, o que foi algo “muito positivo”, dado que as alternativas eram ruins, diz o ex-diretor de pesquisa econômica do BC, Fabio Kanczuk.
Ao jornal Valor Econômico, ele diz ver a Selic parada em 10,5% neste ano e nota que o BC dá aval a essa perspectiva com o cenário alternativo nas projeções de inflação. “Não está com todas as letras que vai ficar constante, mas é sugestivo.”
1) O que achou da decisão?
A decisão veio bem de acordo com o esperado. Manutenção com unanimidade, sem nenhuma maluquice. Bem-feita, com uma escrita bastante limpa. E isso é muito bom se compararmos com os cenários alternativos, que eram todos caóticos. Tinha gente achando que poderia haver mais uma queda de 0,25 ponto ou que a decisão poderia não ser unânime. O fato de termos visto o cenário base, quando as alternativas eram ruins, foi algo muito positivo.
2) E em relação aos próximos passos na condução dos juros?
Em termos de sinalização, tinha dúvida sobre o que iriam dizer sobre os próximos passos, se poderiam indicar, talvez, a necessidade de alta de juros ou colocar alguma assimetria para cima A sinalização foi a de manter os juros nesse patamar de 10,5% pelo período necessário para fazer a inflação e as expectativas irem para a meta. Na linguagem de mercado, seria o “high for long”, em que se segura o juro em nível alto pelo período longo o suficiente. Não está com todas as letras que vai ficar constante, mas é sugestivo. Foi a impressão que eu tive.
3) O Copom veio com um cenário alternativo nesse sentido…
Exato, o que define mesmo o plano de voo é o cenário alternativo e tem algumas coisas curiosas nisso. O cenário base ter dado uma inflação de 3,4% [em 2025] não é surpresa nenhuma e é consistente, na minha opinião, com um aumento do juro real neutro para 4,75%. É o meu chute do que vem mais à frente na ata do Copom ou no Relatório de Inflação. Quando eu rodo o meu modelo, para obter 3,4% de inflação o juro neutro tem que estar em 4,75% [em termos reais]. A mensagem que o Copom passou é a de que, se ele mantiver em 10,5% o juro, a inflação vai para perto da meta, mas o número também pode indicar outra coisa.
4) Como os ativos locais devem reagir à decisão?
Acho que o comunicado vai ser bem visto. O mercado pode pensar que não houve divisão de votos ou algo estranho no texto e que ainda teve o BC sugerindo que quer convergir a inflação para a meta. Nesse sentido, eu imaginaria a curva de juros se comportando bem, tirando prêmio de risco da frente e ficando mais “flat” [achatada, com os juros longos caindo mais que os curtos]. E o real também pode ir bem.
5) O ruído político antes da decisão do Copom aumentou. Como o sr. viu as discussões?
O Lula virou o foco de novo para o BC. O principal motivo, para mim, pode ser porque a crise do Rio Grande do Sul saiu do foco e o governo precisava de um novo alvo. Quando o Lula faz isso, aumenta a confusão no mercado, mas, politicamente, pode ser conveniente. Acho que a gente já esperava, o ambiente estava estranho. No Copom passado, quando diminuíram a velocidade do corte, o Lula parecia estar tão tranquilo Agora o jogo normal voltou, batendo no BC e no Roberto Campos [Neto, presidente do BC], ainda mais com o Copom parando de cortar os juros. É um prato feito.
6) O mercado considera o diretor Gabriel Galípolo o favorito para suceder Campos Neto. Com o voto pela manutenção da Selic, ele perde força para comandar o BC?
Acredito que não. Agora ele se firma com o mercado, que vai dar mais confiança para ele. E a minha impressão é de que o Lula e o [ministro da Fazenda Fernando] Haddad já tinham entendido isso, que a melhor decisão a ser feita agora seria essa. Ele conseguiu um Copom em que não se queimou com o Lula e ganhou reputação no mercado. Aumentou a probabilidade de ele ser o próximo presidente do BC.