A Defensoria Pública da União (DPU) afirmou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que o ministro Alexandre de Moraes tem violado o direito de defesa e privilegiado a acusação em um processo do 8 de Janeiro. Na ação, a DPU disse que o relator não autorizou intimar uma testemunha que, segundo a defesa, provaria que a ré chegou a Brasília após o ataque à sede dos Três Poderes. A Defensoria classificou a medida de “violação ao contraditório e à ampla defesa”.
A DPU afirmou que posicionamentos do órgão em processos judiciais não são uma opinião institucional, e que repudia “qualquer tentativa de politização” de sua atuação. Leia a íntegra do comunicado ao fim desta reportagem.
Diovana Vieira foi presa em 9 de janeiro de 2023, dia seguinte aos ataques, no acampamento golpista em frente ao Quartel-General do Exército em Brasília. Na semana seguinte, foi solta e passou a cumprir medidas cautelares. Desde maio de 2023, ela é ré no STF pelos crimes de incitação à animosidade entre as Forças Armadas; associação criminosa; e concurso material, quando o mesmo crime é praticado várias vezes. A DPU pediu sua absolvição.
Segundo a Defensoria afirmou ao gabinete de Moraes no último dia 5, Vieira chegou a Brasília no fim da tarde do 8 de Janeiro, após o ataque à sede dos Três Poderes, e não tem relação com os crimes cometidos por outras pessoas na ocasião. O objetivo da viagem de Diovana Vieira, argumentou a DPU, era acompanhar sua ex-sogra. Para tentar comprovar esse episódio, a DPU pediu que o STF intimasse, como testemunha, o motorista de ônibus que levou Vieira à capital federal, o que Moraes negou.
“Tem-se um tratamento desigual entre acusação e defesa, uma vez que a exigência de apresentação de testemunhas vem pesando sobre as defesas em geral, mesmo quando indicam servidores públicos para serem inquiridos”, afirmou a DPU, ressaltando que o Ministério Público não tem a mesma dificuldade no processo, o que classificou de “violação ao contraditório e à ampla defesa”.
O fato de Diovana Vieira ter ido ao acampamento em frente ao QG do Exército “nada diz de atos, gestos e condutas concretas” de crime, afirmou a DPU ao Supremo. “O acampamento estava situado em zona central de Brasília, com a absoluta tolerância do Poder Público. O próprio Estado transmitia a aparência de regularidade do aglomerado, tolerando-o e até incentivando-o”, seguiu a Defensoria Pública, em referência ao governo Bolsonaro.
Leia a íntegra do comunicado da DPU:
“A Defensoria Pública da União repudia qualquer tentativa de politização de sua função constitucional de promover a defesa técnica no âmbito criminal, especialmente no contexto dos acusados do 08/01.
É de se registrar que, nos termos do art. 8, I da Lei Complementar n. 80/94, incumbe ao defensor público geral-federal representar a Defensoria Pública da União como instituição.
Dessa maneira, não se deve inferir, baseando-se em posicionamentos expostos em processos judiciais específicos, que a DPU adota uma opinião institucional a respeito de qualquer agente ou órgão judicante.
Como órgão constitucional de defesa técnica, um defensor público se vale de argumentos, críticas e convicções que são usadas em determinados processos. Isso não autoriza a leitura de que a instituição é contrária a um determinado órgão, juiz ou ministro. Como já afirmado em inúmeras oportunidades, a DPU confia, defende e respalda o trabalho de todas as instâncias do Poder Judiciário Brasileiro. E evidentemente, o Supremo Tribunal Federal, como autoridade máxima do Poder Judiciário Brasileiro, goza da mesma credibilidade junto à DPU.
Não é aceitável o uso de argumentos feitos em processos judiciais para a pessoalização de qualquer crítica às autoridades judiciais. O trabalho de qualquer magistrado garante a estabilidade democrática necessária à população brasileira, tão cara à Defensoria Pública da União. Certamente que o trabalho do ministro Alexandre de Moraes – assim como de todos os ministros do Supremo Tribunal Federal, deve ter respaldo e apoio de todas as instituições de justiça, e a DPU é uma delas. Em havendo censura ou crítica a decisões, sentenças e votos, a DPU se pronuncia no respectivo processo.
A DPU reforça que sua atuação não tem natureza política, constituindo expressão e instrumento do regime democrático. Ao efetivar a ampla defesa e o contraditório, a Defensoria Pública da União reafirma seu compromisso inegociável com a proteção da democracia e a independência funcional de seus membros — elementos basilares do Estado Democrático de Direito. Tais princípios asseguram a todos o pleno acesso à Justiça e a tutela de seus direitos fundamentais, em estrita observância à Constituição. Nosso compromisso é com a população pobre. Nenhuma polarização política nos desviará desse norte.”
(Roseann Kennedy/Estadão Conteúdo)