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Economia Demissão de “estrela” do Itaú mostra que o compromisso com a ética custa caro e ainda é desafio

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Eduardo Tracanella foi demitido por “uso inapropriado do cartão corporativo”. (Foto: Reprodução)

Logo após a demissão de Eduardo Tracanella, diretor de marketing do Itaú Unibanco, começaram a circular no mercado teorias para explicar seu desligamento. Traca, como era conhecido, é um dos executivos mais admirados e respeitados do país. Ganhador do Caboré em 2014, executou alguns dos maiores e mais bem-sucedidos planos de marketing e eventos do país.

A história de Tracanella e do Itaú se confundem. Ele estava há 27 anos no banco. E em boa medida, é graças ao marketing que o Itaú se tornou a marca mais valiosa do país e objeto de desejo de todas as grandes agências de publicidade.

Portanto, a atenção em torno da demissão de Tracanella é compreensível. Mas por que poucas horas após a notícia se tornar pública, a sensação é que o Itaú estava sendo “forçado” a dar sucessivas explicações à imprensa e ao mercado à medida que surgiam sucessivas teorias, algumas inclusive mirabolantes, para justificar o corte do executivo?

Afinal, já não havia sido dito pelo próprio Itaú em um comunicado interno, e divulgado pela imprensa, que o executivo havia sido demitido por “uso inapropriado do cartão corporativo”? Isso já não seria o suficiente?

Talvez, em um mundo no qual a transparência não é o forte das empresas e os bancos foram assolados por uma série de escândalos mundiais nos últimos anos, é difícil acreditar que alguém foi demitido de uma instituição financeira simplesmente por uma questão de conduta.

É mais fácil acreditar em um escândalo de grandes proporções sendo “acobertado”. Ou então, uma conspiração de adversários de Tracanella dentro do Itaú, como se noticiou, do que crer que o banco apenas seguiu seu próprio código de ética mesmo o alvo sendo uma estrela da casa.

Obviamente, é difícil imaginar que um profissional que tem acesso a um orçamento bilionário cometeria um deslize banal de gastos pessoais não recorrentes e de pequeno valor, como afirma o Itaú. Mas este não seria o primeiro nem o último caso de grandes lideranças demitidas por decisões banais equivocadas.

Na terça-feira, dia seguinte à notícia da demissão ter sido publicada pelo jornal Valor Econômico, aconteceu um almoço do Fórum de Autorregulamentação do Mercado Publicitário (Cenp), em São Paulo. O objetivo do evento era divulgar o Pacto Cenp. Ironicamente, o Pacto é um guia de boas práticas para construir relações mais sustentáveis entre marcas, agências, veículos e demais agentes da indústria.

Mas o assunto nas mesas foi um só: a demissão de Tracanella. O executivo inclusive era um dos convidados que falariam no palco do evento.

“Para mim foi um choque”, dizia o sócio de uma agência de publicidade manifestando o sentimento geral.

“Ele era polêmico, sim. Não tinha medo de comprar briga para defender o que acreditava e isso gerou conflitos até no banco”, diz uma liderança de outra agência. “Mas se era performance ou temperamento, era só demitir, não precisava de um escândalo”.

Nos grupos de WhatsApp de publicitários, logo surgiram teorias sobre as razões para a demissão repentina, que pegou até alguns diretores do Itaú de surpresa. Eles souberam da notícia do corte de Tracanella pela imprensa.

“Disseram em um grupo de WhatsApp que ele comprou um tênis de R$ 50 mil no cartão corporativo”, comentavam executivos de publicidade em uma mesa do almoço do Cenp. “A demissão foi às pressas porque estavam com medo de uma investigação da CVM (Comissão de Valores Mobiliários, uma autarquia federal que regula e fiscaliza o mercado de valores mobiliários no Brasil), afirmaram dois outros profissionais do mercado ouvidos pela coluna.

O problema é que essas teorias não parecem fazer sentido. Os valores das compras inapropriadas seriam proporcionalmente baixos e avaliados como um dano imaterial à instituição. Fosse diferente, o Itaú seria obrigado a reportar o caso à CVM e ao Banco Central, o que não foi feito.

Ou seja, Tracanella não cometeu um crime da perspectiva da CVM e do Banco Central, apenas quebrou o código de ética do banco.

“Não consigo acreditar até agora”, disse uma ex-funcionária do Itaú que trabalhou com Tracanella e conversou com a coluna. “Mas no Itaú, se você abusa do cartão corporativo, certamente será demitido. Isso já aconteceu com outros funcionários. A instituição é extremamente rígida neste assunto”.

E este talvez seja o ponto. Hoje, passamos a aceitar deslizes éticos porque naturalizamos a prática. Na política, no mundo empresarial, no dia a dia, fazemos vista grossa para os desvios.

Vota-se no político pouco ético, mas que promete mudar tudo que “está aí”. Seguimos o influenciador que ensina a comprar voos com escala e não completar o segundo trecho para pagar menos. Furamos filas. E assim, pouco a pouco, transformamos em normal o que eticamente não deveria ser normal.

Então, deslizes “menores” não parecem suficientes para justificar que uma marca do tamanho do Itaú assuma um risco de imagem e demita uma de suas estrelas. Parece mais plausível demitir sem barulho, fazer um acordo, ou dar uma palmada na mão e fazer vista grossa. Se não for assim, deve existir algo mais.

Ao Itaú e demais empresas, resta a esperança de que, apesar da polêmica, no longo prazo, a conduta ética e a transparência levará as instituições mais longe. É o que os consumidores parecem buscar cada vez mais.

Para o mercado publicitário, e principalmente para a imprensa, vale uma reflexão sobre por que divulgamos tantas teorias sem provas e temos dificuldade de acreditar que uma empresa apenas tenha feito o certo (e mais caro), e não apenas escolhido o caminho mais fácil de fazer vista grossa para um desvio de ética. As informações são do jornal Valor Econômico.

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