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Por Redação O Sul | 25 de janeiro de 2019
Se o presidente da Venezuela Nicolás Maduro retaliar o governo brasileiro por ter reconhecido o oposicionista Juan Guaidó como presidente interino da Venezuela, uma parte do Brasil pode ficar às escuras: Roraima. Além de ver aumentar o número de refugiados que se tornaram um problema grave na fronteira e na capital Boa Vista, o Estado ainda depende da energia elétrica fornecida pela Venezuela.
Roraima é o único território brasileiro que não faz parte do Sistema Interligado Nacional. A construção de um linhão com essa finalidade está parada por conta de uma disputa judicial que envolve uma reserva indígena. Mais de metade da energia consumida no Estado é fornecida pela hidrelétrica de Guri, no norte da Venezuela. O restante vem de algumas termelétricas locais.
Com a falta de manutenção na rede elétrica da Venezuela provocada pela crise econômica, Roraima já vem sofrendo com constantes blecautes, que costumam queimar os eletrodomésticos da população. O receio agora é ficar totalmente sem luz ou passar por um pesado racionamento se houver retaliação. A situação é preocupante, porque a receita paga por Roraima é pequena para a Venezuela. É diferente, por exemplo, da interdependência entre Brasil e Bolívia no gás natural.
No ano passado, a estatal venezuelana Corpoelec chegou a ameaçar cortar o fornecimento de energia de Roraima alegando o não-pagamento de uma dívida. O governo brasileiro, ainda na gestão de Michel Temer, iniciou o processo de licitação para a construção de mais uma termelétrica no estado, em uma tentativa de reduzir a dependência da Venezuela. Mas a expectativa é que ainda demore.
“O leilão está previsto para acontecer em maio, mas, na hipótese mais otimista, a usina vai levar seis meses para ficar pronta. Esse não é um problema que se resolve no curto prazo e deveria ter sido previsto bem antes”, diz Adriano Pires, diretor do CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura).
A cooperação entre os dois países na área energética é antiga. Começou em 2001 e foi acertada entre os então presidentes Hugo Chávez, da Venezuela, e Fernando Henrique Cardoso, do Brasil. Evoluiu ainda mais durante a gestão do ex-presidente Lula, amigo próximo de Chávez.
Excluindo o risco para Roraima no setor elétrico, o agravamento da crise na Venezuela não deve ter maiores consequências econômicas para o restante do Brasil – o que poderia acontecer de ruim, já ocorreu.
As grandes obras que costumavam ser tocadas por empreiteiras brasileiras estão praticamente abandonadas. No ano passado, o governo venezuelano deu um calote de R$ 1,5 bilhão no BNDES, que financiava os projetos. O rombo teve que ser coberto pelo Tesouro Nacional, conforme previsto em contrato.
O intercâmbio comercial entre Brasil e Venezuela, que foi pujante, também quase desapareceu. Em 2008, auge da bonança do petróleo, o Brasil chegou a exportar R$ 5,1 bilhões para a Venezuela, o que significava 2,6% das vendas totais.
No ano passado, as empresas brasileiras embarcaram apenas R$ 577 milhões para os venezuelanos, o que representa menos de 0,2% da exportação total. Para especialistas, vai demorar muito para que esse fluxo de comércio seja restabelecido. Além de um eventual troca de governo, a Venezuela vai precisar se reerguer da profunda recessão e controlar a inflação galopante para voltar a atrair empresas que queiram fazer negócios por lá.