Que semana! O Brasil vive aos solavancos. Como disse uma vez o ex-ministro da Fazenda Pedro Malan, no Brasil até o passado é imprevisível. Ou como Tom Jobim: “O Brasil não é para principiantes”. Tenho um certo sentimento de piedade de todos aqueles que se dedicam à missão impossível de entender este nosso país.
Se serve de consolo, já sabemos agora que Bolsonaro não mente apenas para nós outros, mente também para os seus seguidores, as suas tropas fanatizadas. No 7 de Setembro, ele deitou e rolou nas suas falações preferenciais – destampatórios, ataques furiosos, ameaças. Era tudo bravata.
Não há como não pensar – da forma como as massas foram insufladas, e no tom belicoso dos discursos do presidente – que houve, sim, uma tentativa de golpe. Naquele contexto em que os nervos estavam à flor da pele, um curto-circuito, uma faísca poderia provocar o incêndio da desordem e do caos – e eventualmente uma ruptura, fora das linhas da Constituição e do Estado de Direito.
Se não foi uma intentona golpista, então a forma de comemorar o 7 de Setembro jamais poderia ter sido aquela catarse destrutiva, aquela provocação de instintos predatórios, a disposição para expurgar os adversários, os convites ao fechamento da Corte Suprema.
Mais uma vez ficou exposto que Bolsonaro não tem a menor noção do cargo que lhe caiu no colo, para nosso infortúnio. Não sabe o que são instituições da República, não tem ideia das prerrogativas dos poderes ou o que venha a ser o império da Lei, o Estado Democrático de Direito. Não administra o país, não governa, gasta o tempo farejando encrenca, alimentando fantasmagorias de validade vencida.
A opção preferencial desse homem rústico são as motociatas – o desfile protofascista de motos nas cidades do país, como se fosse uma obra de governo, um legado. No assento de uma moto, lidera os seus parceiros de desatenção e desaviso quanto às necessidades reais do país, e parece ser o único lugar em que se sente bem.
Desconfio que tudo em Bolsonaro não passa de uma forma de esconder o despreparo. Enquanto ele enfrenta inimigos reais e cria problemas imaginários (voto impresso), desanca a imprensa, fulaniza (como jamais um presidente da República fez) cada quezília, mergulha fundo na arruaça como prática política, ele esconde a sua notória falta de vocação para o trabalho, para a busca de soluções dos males que nos afligem.
Ele se compraz com o aplauso das massas populares que o apoiam, e com o elogio dos seus pares, como o vice Hamilton Mourão, que depois do arreglo declarou que Bolsonaro tem “grandeza moral”. Ou de outro auxiliar servil, o general Luiz Eduardo Ramos, que o classificou de “estadista”.
O arreglão, o recuo, pode ter lhe custado caro. Milhares de brasileiros que, no seu desvario, confiavam nele, se ainda lhes restar um pouco de amor-próprio, de senso comum, terão desta feita notado que em Bolsonaro a mentira, mais do que um vício feio, é parte inseparável do caráter. Um líder sério não muda de rumo de repente, ao arrepio dos aliados, sem dar-lhes justificativas razoáveis, deixando-os rendidos e envergonhados no campo dos embates.
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