A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que livra os partidos de dívidas com a Justiça Eleitoral foi desengavetada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que recuou e retirou o projeto da pauta de votações do plenário da Casa.
Lira havia avisado aos líderes partidários da Câmara que só colocaria em votação a proposta se o Senado se comprometesse a também aprovar o texto. A avaliação entre deputados é a de que o desgaste com a medida precisa ser compartilhado com os senadores.
No entanto, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já indicou que não pretende avançar nenhuma das etapas da tramitação regular de projetos, que inclui debate em comissões e proposta de emendas. Pacheco tem dito a interlocutores que a medida não é prioritária para a Casa e que n ão há nenhuma perspectiva de acordo com a Câmara sobre ela.
A PEC foi incluída de forma repentina na pauta de votação da Câmara por Lira após reunião com líderes partidários na manhã de anteontem. A iniciativa é alvo de protestos de movimentos anticorrupção e organizações que atuam na área de transparência eleitoral – eles calculam que o custo da anistia pode chegar ao valor de R$ 23 bilhões.
A proposta tem amplo apoio entre as legendas com representação na Câmara: do PT, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao PL, do ex-presidente de Jair Bolsonaro. Além de isentar os partidos de dívidas, o texto fragiliza candidaturas de mulheres e pessoas pretas – concedendo perdão pelo não cumprimento de normas que preveem a aplicação de recursos mínimos para os candidatos.
A inclusão da proposta na pauta foi mais uma das tentativas de aprovar o texto. Em outubro de 2023, a Câmara tentou aprovar a matéria, mas sofreu resistência de entidades da sociedade.
Um senador próximo a Pacheco afirmou à reportagem que “não há contexto nem clima político” para a apreciação de um projeto impopular como esse, muito menos sua urgência. Ainda assim, mesmo que reconheçam a impossibilidade de tramitação acelerada, líderes do Senado acreditam que há força entre os congressistas para aprovar a medida.
O impasse entre Lira e Pacheco postergou novamente a votação da proposta. Parlamentares informaram que a deputada Renata Abreu (Podemos-SP) está à frente das articulações com os senadores. Segundo os congressistas, Lira não pautou o projeto para votação porque não houve “sinal verde” de Pacheco.
Os presidentes das legendas têm pressionado pela aprovação da PEC, que, no ano passado, recebeu aval da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, mas não chegou a ir para votação na comissão especial, diante da repercussão negativa. Como os prazos para análise no colegiado especial já se esgotaram, o texto pode ser apreciado diretamente no plenário da Câmara.
Por se tratar de mudança constitucional, a proposta precisa do apoio de pelo menos 308 deputados no plenário da Câmara, em dois turnos de votação. No Senado, o quórum mínimo é de 49 votos no plenário, também em dois momentos – a medida, porém, pode passar antes por comissões.
Deputados articulam uma possível substituição da anistia completa de dívidas partidárias por um “Refis” (originalmente, expressão usada para se referir a programas de recuperação fiscal criados com o objetivo de colocar em dia a situação financeira de empresas, pessoas físicas e governos) referente às punições que as legendas sofreram por irregularidades nas eleições, como o descumprimento de porcentuais mínimos de candidaturas de mulheres e negros ao Legislativo. Pela nova versão do texto, o perdão total valeria somente para as cotas raciais.
O “Refis” determinaria o pagamento das dívidas pelos partidos com correção monetária, mas sem juros e com opções de parcelamento. Na proposta anterior, as agremiações teriam todos os débitos anulados.
A renegociação das dívidas seria possível para as punições relacionadas ao descumprimento das cotas de gênero nas eleições de 2022, além de outras irregularidades. No caso das cotas raciais, contudo, as dívidas seriam anuladas.
Os partidos argumentam que houve decisão recente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre as cotas raciais para a qual não estavam preparados e que isso justificaria o perdão da dívida nesse caso.
Os defensores da proposta também alegam que a matéria institui um porcentual mínimo de 20% de repasses do fundo eleitoral para candidaturas de pessoas pretas e pardas. Atualmente, a obrigação dos partidos é de apenas assegurar que a quantidade dos recursos seja proporcional ao número de candidaturas de negros.