Terça-feira, 01 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 30 de março de 2025
Era tarde de 29 de outubro de 2022, véspera do segundo turno da eleição presidencial, quando um homem atravessou correndo a esquina das alamedas Joaquim Eugênio de Lima e Lorena, no bairro dos Jardins, em São Paulo, gritando por socorro. Atrás dele, empunhando uma pistola e cercada de seguranças também armados, vinha a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), que perseguiu até um bar o sujeito, com quem discutira minutos atrás.
Ela o alcançou dentro do estabelecimento, onde gritou para que ele se deitasse no chão. O episódio rendeu um processo no Supremo Tribunal Federal (STF), que formou maioria nesta semana para cassar o mandato da parlamentar e condená-la à prisão.
Além disso, serviu de vez para torná-la figura indesejada no bolsonarismo, que viu no incidente de 2022 um fator decisivo na derrota na disputa presidencial, vencida por Lula com vantagem de apenas 1,8 ponto percentual.
“A Carla Zambelli tirou o mandato da gente”, relembrou Jair Bolsonaro na semana passada, ainda culpando a ex-aliada pela derrota. Essa condenação, pelo STF e pelo PL (Partido Liberal, sigla de Bolsonaro), deve enterrar de vez a chance de a deputada voltar à liderança que já ocupou na direita. Também engrossa a lista de “soldados” deixados para trás nas trincheiras pelo ex-presidente.
Futuro preocupante
O ambiente para a deputada no Supremo também é completamente desfavorável. Seis ministros já votaram pela sua condenação, dois deles (Cristiano Zanin e Dias Toffoli) depois de Nunes Marques ter pedido vista. Antes, já tinham votado contra ela Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Flávio Dino e o relator, Gilmar Mendes.
Ela foi denunciada pela Procuradoria-Geral da República por porte ilegal de arma de fogo e constrangimento ilegal com uso de arma — a deputada tem licença para andar armada, mas a prática é proibida nas 48 horas anteriores às eleições. Os votos até agora são para condená-la a cinco anos e três meses de prisão em regime semiaberto, além da perda do cargo.
A defesa afirma que a parlamentar foi provocada e empurrada ao chão antes da perseguição. Gilmar Mendes, porém, ponderou que a discussão jamais envolveu agressão física. “Uma deputada federal perseguir em via pública, com arma-de-fogo, um indivíduo de corrente partidária adversa mas desarmado, na véspera das eleições, após troca de insultos recíprocos, reveste-se de elevado grau de reprovabilidade”, frisou. A sentença só sairá após o ministro Nunes Marques (indicado pelo então presidente Bolsonaro) devolver o processo — ele tem 90 dias para fazê-lo.
Mais derrotas
O revés no STF não foi a única derrapada de Carla Zambelli na Justiça. No dia 25, em decisão unânime, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) manteve a cassação do seu mandato, que havia imposto no final de janeiro por conta da veiculação de informações falsas sobre fraudes em urnas eletrônicas. Resta a ela um recurso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para salvar o seu mandato ao menos neste caso. Ela segue na função legislativa até que não haja mais possibilidade de recurso.
As decisões se somam a uma lista enorme de confusões envolvendo a deputada. Um dos mais rumorosos foi a contratação do hacker Walter Delgatti Neto, célebre por vazar diálogos da Lava-Jato, para provar que as urnas eletrônicas não eram confiáveis.
No meio da sandice, que incluiu reunião da dupla com Bolsonaro, o hacker invadiu o sistema do Conselho Nacional de Justiça e forjou uma ordem de prisão contra Moraes. Revelado por VEJA, o caso rendeu uma operação de busca e apreensão da PF contra Zambelli, inclusive na Câmara (veja o quadro).
Estrela que ascendeu com a onda bolsonarista em 2018, Zambelli chegou a ter 946 244 votos na última eleição, mais de 200 000 a mais que Eduardo Bolsonaro em São Paulo. O ex-presidente se afastou dela e de outros aliados barulhentos à medida que se envolviam em episódios do mesmo tipo.
Um nome que há tempos não é citado pelo capitão é o do ex-deputado Daniel Silveira (sem partido-RJ), preso desde 2023 ao ser condenado a oito anos e nove meses de cadeia por ameaças contra a democracia e o STF. Outro que sumiu da pauta foi o ex-deputado Roberto Jefferson (PRD-RJ), preso em 2022 após receber agentes da PF em sua casa com granadas e tiros de fuzil.
Para especialistas, atos assim são motivados pela certeza de solidariedade do bolsonarismo, o que nem sempre ocorre. “A lógica de Jair Bolsonaro é de autopreservação da imagem a qualquer custo. Ele já provou ser capaz de abandonar qualquer aliado”, avalia José Álvaro Moisés, cientista político da USP. O caso de Carla Zambelli, como o de Roberto Jefferson, é mais um desses em que o tiro saiu pela culatra. (com informações do portal Veja)