Desde que Donald Trump entrou na política, há quase dez anos, os adversários insistem em desqualificar sua ascensão meteórica, considerando-o um estranho que não representa o que os americanos são de verdade. Após mais uma vitória na eleição presidencial, parece que Trump é exatamente um reflexo do que são os EUA, ou pelo menos a maioria do país.
O discurso de que Trump seria uma aberração a ser varrida pela história foi destruído na noite de terça-feira (5), por uma enxurrada de votos que sepultaram de vez a noção cultivada pela elite política dos EUA, de que ele seria uma anomalia temporária na longa marcha para o progresso.
Com a vitória – incluindo no voto popular, o que não acontecia com um republicano desde George W. Bush, em 2004 –, Trump volta com mais poder, com controle do Congresso e podendo nomear mais juízes, além de seis dos nove magistrados da Suprema Corte. Ele é uma força transformadora que está remodelando os EUA à sua imagem e semelhança.
Macho alfa
O desencanto com os rumos do país e o ressentimento contra as elites é mais profundo do que muitos imaginavam. A campanha de Trump, impulsionada por uma descarga de testosterona e pela imagem de macho alfa, conseguiu capitalizar a resistência dos americanos à eleição da primeira mulher presidente.
Embora milhões tenham votado contra ele, Trump mais uma vez aproveitou a sensação da maioria de que o país que eles conheciam está desmoronando, sob um cerco econômico, cultural e racial. Contra tudo isso, os eleitores ratificaram a volta de um showman de 78 anos, o mais velho a ser eleito presidente na história dos EUA, disposto a romper com todas as convenções e tomar medidas radicais, mesmo que isso ofenda sensibilidades ou viole a tradição.
Pela primeira vez, os americanos elegeram um criminoso condenado, que tentou dar um golpe, que defendeu a suspensão da Constituição e prometeu vingança contra seus opositores. “A América real se tornou a América de Trump”, disse Timothy Naftali, historiador da Universidade de Nova York.
Norma
Para seus aliados, a vitória realça o argumento de que Washington perdeu contato com a realidade, que os EUA são um país cansado de guerras, da imigração excessiva e da lacração do politicamente correto. “Trump mostra o grau de marginalização dos que acreditam viver em um vale-tudo cultural e a fé na única pessoa que deu voz a essa frustração”, disse Melody Barnes, diretora do Karsh Institute of Democracy, da Universidade de Virgínia.
Em vez de se sentirem ofendidos pela agressividade de Trump, por suas mentiras, muitos viram nele um homem autêntico. Em vez de rejeitá-lo como criminoso, fraudador e abusador sexual, muitos aceitaram a narrativa de que ele foi vítima de perseguição. “A eleição foi um raio X do americano e revelou a afinidade assustadora do povo com um homem sem limites”, disse Peter Wehner, ex-assessor de George W. Bush. “Trump não é mais uma aberração. Ele é a norma.”