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Desembargadores pedem 200 mil reais de indenização a advogado que gravou conversa sobre réu

Conversa foi gravada em vídeo (Foto: Reprodução/YouTube)

Dois desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo  pedem indenização de até R$ 200 mil para um advogado que divulgou uma conversa informal entre eles durante o intervalo de uma sessão de videoconferência do TJ-SP ocorrida em outubro. Na conversa, os magistrados criticam a postura de um réu. Um deles cita uma prisão anterior do acusado para dizer que ele é “um santo” e que deveria ser “canonizado”.

As ações com pedido de indenização foram movidas nesta semana contra o advogado Vinícius Vilas Boas, de 33 anos. Nas ações, os desembargadores Sérgio Antônio Ribas e Maurício Valala, da 8ª Câmara de Direito Criminal, argumentam que tiveram falas pessoais e informais divulgadas dolosamente (com intenção de causar dano) por Vilas Boas na internet. Na ocasião, o advogado gravou comentários feitos em videoconferência por magistrados durante o intervalo de uma sessão pública de julgamento.

O intervalo foi realizado na hora do almoço e antecedia o julgamento de um pedido de habeas corpus de um cliente de Vilas Boas. Nas imagens, os desembargadores Ely Amioka, relatora do caso, e Valala criticaram o acusado, aparentemente sem saber que havia advogados e servidores ouvindo o diálogo. No início do julgamento, então, Vilas Boas comunicou à corte que deixaria a sessão por considerar que seu cliente teria sido pré-julgado.

No diálogo entre os desembargadores, que viralizou na internet, Amioka diz ter encontrado um vídeo que mostra o réu agredindo um professor de matemática na escola.

“Um absurdo. (…) Vejam, o professor largou até a profissão por causa desse caboclo aí. (…) Aí eu fui procurar o nome dele na vara da infância e ele quando menor já foi internado por roubo à residência, olha que coincidência. (…) É um santo mesmo”, diz a desembargadora.

Valala, então, afirmou que o réu deveria ser “beatificado” e, em seguida, “canonizado”.

Os desembargadores seguiram conversas sobre outros casos até que uma servidora os avisou que poderia haver advogados na sala de conferência e disse que Vilas Boas estava pedindo a palavra. Quando o advogado começou sua intervenção, foi interrompido pelo presidente da Câmara, desembargador Antônio Ribas, que lhe perguntou se não colocaria o paletó para falar com os magistrados, apesar de haver na sala de conferência membros sem a vestimenta.

Vilas Boas, então, vestiu a toga e afirmou que deixaria a sessão após ter ouvido e gravado a conversa entre Amioka e Valala.

Amioka responde que a conversa não consta nos autos nem em seu voto e que ela teria direito de pesquisar a vida pregressa do réu.

“O senhor está fazendo uma coisa muito errada que é escutar conversa dos outros. Ninguém chamou o senhor na conversa. (…) Eu vou comunicar à OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) que o senhor estava escutando conversa que não tinha nada que estar ouvindo”, afirmou, em seguida, o desembargador Antônio Ribas.

Na ocasião, as imagens viralizaram e, em dezembro, a OAB emitiu ofícios públicos em apoio ao advogado.

Ato consciente

Nos processos que movem contra Vilas Boas, Antônio Ribas e Valala são representados pelo mesmo advogado, William Simeone, e pedem a mesma indenização, de R$ 100 mil cada.

Os magistrados afirmam nos autos que as ações não seriam represálias, “porque o caráter, ‘o berço’ e a moral” deles não o permitiriam. Eles argumentam que Vilas Boas gravou a conversa de forma clandestina — ela ocorreu em uma videoconferência em plataforma oficial do TJ-SP.

Os desembargadores dizem que tiveram detalhes íntimos expostos com a publicação do vídeo porque, em determinado ponto do diálogo gravado, ambos comentam que fariam exames médicos.

“No presente caso, o dolo do réu (Vilas Boas) foi evidente. Foi um ato consciente (a gravação do vídeo). Premeditado. Certo, determinado e com deliberação de desgastar a imagem do autor (os desembargadores), inclusive na sua intimidade”, dizem os magistrados em seus pedidos de indenização.

“Eu gravei o vídeo para resguardar a minha conduta. Em nenhum momento eu dei publicidade ao vídeo, que não está listado no Youtube. Houve reportagens sobre o caso e um desagravo público aprovado pela OAB por unanimidade a mim. Nem havia me atentado aos comentários sobre exames médicos dos magistrados”, disse o advogado.

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