Segunda-feira, 31 de março de 2025
Por Redação O Sul | 25 de março de 2025
Um desenho em quatro cores de um “pênis com asas” enviado ao chefe da Divisão de Saúde e Segurança do Servidor do Itamaraty, Cristiano Ebner, e que virou caso de polícia, ameaça a indicação pelo governo do diplomata Pablo Cardoso para comandar a embaixada do Brasil em Guiné-Bissau.
Na semana passada, Pablo Cardoso havia conseguido o agrément do governo africano para comandar a embaixada do Brasil naquele país. Porém, o governo Lula ainda não oficializou a indicação do nome dele em mensagem ao Senado, e essa indicação pode ser revista após o episódio do desenho.
Ministro-conselheiro na Missão do Brasil junto à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, em Lisboa, Pablo Cardoso teria agora sua primeira designação para chefia de posto no exterior.
Na semana passada, após a coluna revelar o episódio de desenho do “pênis de asas”, integrantes da Comissão de Relações Exteriores entraram em contato com o Itamaraty para entender como seria conduzida a indicação do nome dele para o colegiado.
Há uma preocupação de como a oposição pode explorar o episódio, expondo o diplomata. Como a mensagem de indicação ainda não foi enviada, há uma possibilidade de substituir o nome.
Ao abri-lo, descobriu uma ilustração colorida de um pênis com asas. Cristiano entendeu como ofensa e ameaça, conforme relatou à Corregedoria do MRE. E o episódio virou caso de polícia por suspeita de assédio. A PF investigou o caso e acabou arquivando ao final.
Entenda
A Polícia Federal concluiu que o ministro de segunda classe do Itamaraty Pablo Cardoso, então ministro-conselheiro do Brasil junto à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), cometeu o crime de ameaça ao enviar um desenho de um “pênis com asas”, dentro de uma carta apócrifa, ao também diplomata Cristiano Ebner, chefe da Divisão de Saúde e Segurança do Servidor (DSS).
É o que consta no relatório da PF, assinado pelo delegado Thiago Peixe em setembro passado, antes de o caso ser arquivado no mês seguinte. O documento foi submetido à procuradoria e ao corregedor do serviço exterior, o embaixador Rui Vasconcellos, para apurar eventual prática de infração disciplinar.
O inquérito foi instaurado em junho após Ebner comunicar à PF que recebeu em seu setor em Brasília uma correspondência com remetente fictício de uma inexistente “Fundação Kresus”, a qual continha uma ilustração colorida de um “pênis alado”. O chefe da DSS relatou ter se sentido ofendido e ameaçado.
Em depoimento, Ebner disse acreditar que a atitude tinha relação com as funções desempenhadas por ele no Itamaraty. Ele é o responsável por lidar com exames admissionais e perícias médicas, que podem implicar no retorno de um servidor ao exterior ou adiar sua remoção do Brasil por questões de saúde.
Pelo código de rastreamento, investigadores descobriram que a carta foi postada numa agência dos Correios em Brasília, em 12 de junho. Os policiais, então, colheram imagens do circuito de segurança do local e identificaram que a correspondência foi remetida por um homem com calça escura e camisa da Eletrobras. O suspeito foi identificado: tratava-se de um servidor da Eletronorte, que trabalha a 350 metros da agência.
Intimado, o servidor alegou que não se recordava para quem enviara o envelope e negou que tenha sido o autor do desenho — inclusive por não possuir “qualquer habilidade artística”, segundo reconheceu o próprio mensageiro em seu depoimento. Também disse que nunca ouvira falar da tal “Fundação Kresus” e afirmou desconhecer a vítima. Questionado, ele respondeu que deveria ir de três a quatro vezes ao ano aos Correios.
Para a PF, sua versão não retratava a realidade. Primeiro porque confirmou ser a pessoa das imagens, mas negou ter sido quem postou a carta. Além disso, avaliou a polícia, não seria natural uma pessoa que vai poucas vezes à agência não se recordar do que havia remetido. Naquele momento, porém, os investigadores não haviam conseguido estabelecer uma ligação com Ebner.
Isso só aconteceu depois que o chefe da DSS comunicou ter recebido contato de Pablo, admitindo ser o autor da “brincadeira”. O diplomata, radicado em Lisboa, reconheceu ter sido infantil e se desculpou. A PF, então, o intimou a prestar esclarecimentos.
Ao depor, Pablo confirmou ter desenhado a genitália colorida, ilustração que teria feito em 2010 ou 2011. Explicou que o amigo servidor tinha exemplares escaneados em sua casa e pediu a ele que enviasse ao colega de Itamaraty. O ministro-conselheiro também declarou já ter encaminhado desenhos dessa natureza a outros conhecidos, sempre em tom jocoso. E se reconhece como tendo “certo dom artístico”, que domina a técnica do desenho, embora “já tenha sido melhor”, além de ter um irmão desenhista profissional.
Pablo ainda elucidou como chegou ao nome falso da “Fundação Kresus”: foi numa conversa entre amigos em que discutia sobre o rei da Lídia, Creso, que era o homem mais rico do mundo. Fez assim uma troça juntando uma fundação beneficente a um indivíduo extremamente abastado.
Após as oitivas, a PF entendeu que Pablo se utilizou de um terceiro sem conexão com a vítima para remessa do desenho e incluiu informações falsas que não traduziam sua verdadeira identidade, para garantir a impunidade.
O delegado do caso concluiu que as informações prestadas materializavam o crime de ameaça. No relatório, sublinhou que a vítima possui alto nível de escolaridade e cargo de elevada complexidade, além de ampla capacidade de interpretação. Diz o documento:
“Estes preceitos, considerados em conjunto com o cenário de recebimento da correspondência especificamente direcionada à vítima, com qualificação completa e conhecimento acerca do local exato de trabalho, são capazes de gerar o temor exigido pelo tipo penal”.
No relatório, o delegado ressaltou, entretanto, que se tratava de um delito de menor potencial ofensivo, cuja pena máxima é de seis meses de detenção, podendo ser substituída por multa. Expôs ainda que, pela jurisprudência, é incompatível o indiciamento pela prática de infrações dessa natureza.
O caso, no entanto, foi arquivado em 16 de outubro por decisão da Justiça pela “falta de elementos para a consumação do delito”. As informações são do jornal O Globo.