O ano era 1990. Após uma noitada com Woody Harrelson na Flórida, Michael J. Fox acordou meio “ressaqueado” e percebendo que havia algo diferente, seu dedinho da mão se movimentava involuntariamente. Ele ainda não sabia o que estava acontecendo. Poderia ser apenas um sintoma da noite passada, mas, na verdade, era uma “mensagem do futuro”, como o próprio ator descreve no documentário “Still: a Michael J. Fox movie”, destaque da programação do É Tudo Verdade e com lançamento previsto no Brasil para o dia 12 de maio, no streaming do Apple TV+.
Fox tinha apenas 29 anos, em 1991, quando recebeu o diagnóstico de Parkinson. À época, era um dos maiores nomes de Hollywood, protagonista da trilogia “De volta para o futuro”, de Robert Zemeckis, e vencedor de três Emmys pela série “Family ties” (1982-1989). Sem saber lidar com a condição, o ator escondeu seu diagnóstico por sete anos.
Dirigido por Davis Guggenheim, o longa é uma entrevista abrangente e honesta com Fox sobre sua luta contra a doença, sobre como foi lidar com o diagnóstico precoce e sobre o período em que escondeu a condição do mundo e do mercado cinematográfico.
Vencedor do Oscar por “Uma verdade inconveniente” (2006), Guggenheim lembra que estava em um período estagnado profissionalmente e enfrentando uma depressão quando se deparou com uma entrevista de Fox em que ele descrevia uma queda horrível que havia sofrido.
“A forma como ele escreveu trazia muita auto reflexão e humor. Não sabia que ele era um escritor tão bom. Decidi ler os livros dele e também ouvi a versão em áudio, e fiquei encantado pela voz dele”, conta o diretor, que já dirigiu documentários sobre Bill Gates, Malala e Bono, além do clássico projeto com Al Gore. “Há sempre um pouco de desconfiança entre personagem e documentarista, de entender o que cada um quer com o projeto. Mas isso nunca aconteceu com Michael. Ele foi sempre um livro aberto.”
“Still” conta com entrevistas, reencenações e com inúmeras imagens de arquivo, que recapitulam momentos do ator no passado. O diretor também se aproveita de trechos gravados por Fox para as versões em áudio de seus livros. Ele conta que, mesmo reconhecendo a problemática, chegou a sentir um pouco de inveja do ator durante as conversas.
“Durante o processo, eu parava de pensar o quanto amava sua visão de vida e, de certa forma, o invejava. Claro que o Parkinson é uma condição terrível. É crônica e só piora. Mas por um lado, eu amava o que a doença havia dado a ele. E eu pensava: “como é possível?” Sua alegria, seu otimismo, sua humildade, sua capacidade de auto refletir vieram de receber esse diagnóstico terrível.”
Guggenheim teve amplo acesso ao ator, acompanhando momentos de intimidade, como visitas a médicos e interações com a família. O diretor não poupa o espectador de momentos duros, registrando feridas e até mesmo uma queda do ator enquanto andava pela rua. Mas o Michael J. Fox que o filme pretende mostrar vai além da doença. De acordo com o cineasta, nas primeiras conversas para a realização do longa, pessoas em volta do ator, especialmente os envolvidos com a Fundação Michael J. Fox, tinham a expectativa de que o filme fosse sobre a doença, sobre suas limitações, sobre saber reconhecer os sintomas e sobre conviver com ela. Mas o diretor queria algo diferente.
“Não queria fazer um filme sobre Parkinson. É um filme sobre algo que temos todos em comum: somos frágeis. Não queria falar para quem quer saber sobre uma doença, mas sim para quem quer saber sobre todos nós”, relata Guggenheim, que diz ter aprendido muito com seu personagem. “Faço 60 anos em novembro. Me sinto velho, frágil. A forma como ele lida com a própria fragilidade conversa comigo e me ensina muito.”
Filho de um pai documentarista (Charles Guggenheim, vencedor de três estatuetas do Oscar), o diretor recorda que sempre quis fazer cinema, mas que por muito tempo se manteve longe da cena documental por querer seguir um caminho diferente do pai. Dirigiu séries como “ER”, “24 horas”, “Alias”, dentre outras antes de perceber que a paixão estava sim no mundo dos documentários.