O ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo afirmou nesta sexta-feira (24) que a ex-presidente Dilma Rousseff orientou de forma “muito clara” para que todos os recursos de campanha em 2014 fossem arrecadados de forma oficial. Ele deu as declarações após participar de um seminário em Brasília que discutiu o sistema prisional brasileiro e a descriminalização das drogas.
A declaração foi dada um dia depois de trechos de depoimentos de ex-executivos da Odebrecht ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) serem divulgados pela imprensa. Em um desses trechos, o ex-presidente da empresa Marcelo Odebrecht disse que Dilma sabia da “dimensão” das doações por meio de caixa 2 feitas pela empreiteira à campanha da petista à reeleição.
Ao ser questionado pelo assunto, Cardozo, que também foi um dos advogados que defenderam Dilma no processo de impeachment no Congresso, afirmou: “O que eu posso dizer é que aquilo que vimos no cotidiano com a presidenta Dilma, isso é contraditório porque, embora eu não tenha participado da campanha de 2014, a orientação que vinha dela era muito clara para que não se tivesse nenhum tipo de despesa não contabilizada, por razões óbvias”, disse o ex-ministro.
“A orientação era muito clara dela. Então isso pra mim colide frontalmente. É claro que vai haver uma investigação, mas no final tenho absoluta certeza que ela não será convincente”, complementou.
Depoimento
No depoimento ao TSE, no qual falou como testemunha nas ações que tramitam no tribunal pedindo a cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, Marcelo Odebrecht disse que a então presidente e candidata à reeleição sabia da “dimensão” das doações e que os pagamentos não constavam da prestação de contas do PT.
“A Dilma sabia da dimensão da nossa doação, e sabia que nós éramos quem doá… quem fazia grande parte dos pagamentos via caixa dois para [o marqueteiro] João Santana. Isso ela sabia”, disse Odebrecht no depoimento.
Questionado novamente sobre as doações, dessa vez pelo ministro Herman Benjamin, Marcelo Odebrecht afirmou:”O que Dilma sabia era que a gente fazia, tinha uma contribuição grande – a dimensão da nossa contribuição era grande, ela sabia disso – e ela sabia que a gente era responsável por muitos pagamentos para o João Santana. Ela nunca me disse que sabia que era caixa 2, mas é natural, é só fazer uma… ela sabia que toda aquela dimensão de pagamentos não estava na prestação do partido”, disse o empresário.
Em nota, a ex-presidente Dilma negou as informações, chamou a declaração de “leviana” e pediu que o empresário comprove o que disse ao tribunal.
Ele reiterou, em outro momento do depoimento, que nunca ouviu de Dilma que ela sabia que os repasses eram feitos de forma irregular.
“Eu não sei especificar o momento em que eu tive essa conversa com ela, mas isso sempre ficou evidente, é que ela sabia dos nossos pagamentos para o João Santana. Isso eu não tenho a menor dúvida”, completou.
Relação “tensa”
Cardozo também afirmou que a relação da ex-presidente Dilma com Marcelo Odebrecht era “tensa”. Ele disse que chegou a presenciar algumas situações nas quais Dilma negava solicitações de Marcelo.
“Era uma relação que era um pouco tensa. Algumas vezes eu vi situações em que ela negava pleito, havia uma situação de tensão muito forte e ela sempre determinou que qualquer apuração e investigação fosse feita. Então havia sim uma tensão natural por isso eu acho que nunca uma delação deve ser tomada como verdadeira pra atingir quem quer que seja”, declarou aos jornalistas.
Na delação, Odebrecht afirmou ainda que em 2014 a ex-presidente, via o ex-ministro Guido Mantega, deu orientações para que a empresa concentrasse todos os recursos que seriam doados ao PT para a campanha dela à reeleição.
Cardozo disse que a acusação é “pouco plausível” porque as finanças de campanha ficavam à cargo dos tesoureiros. “Olha, francamente, eu nunca vi isso. Parece muito pouco plausível que isso aconteça e acho que absolutamente não verdadeiro. Dilma Rousseff nunca cuidou de finanças de campanha, isso sempre foi colocado ao encargo de tesoureiro”, completou.
O ex-ministro ainda criticou o vazamento de delações por atingir as pessoas antes da investigação. Segundo ele, “vazamentos são sempre ruins e delações devem ser colocadas em seu devido lugar, são pautas de investigação”. (AG)