Segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
Por Tito Guarniere | 25 de julho de 2020
Foi o presidente Fernando Henrique Cardoso quem teve a coragem de criar o Ministério da Defesa.
Foto: Wilson Dias/Agência BrasilEsta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Foi o presidente Fernando Henrique Cardoso quem teve a coragem de criar o Ministério da Defesa, e a consequente possibilidade de nomear um civil para ministro. Nenhum dos ministros civis que comandou a pasta desde então foi pivô de crise institucional, teve de alterar a voz ou ditar condições de boa convivência entre os poderes. O Ministério da Defesa se ocupou das suas funções e tarefas sem exibições de protagonismo, atuando como força institucional e moderadora. Os chefes militares desapareceram do noticiário.
Com Bolsonaro mudou tudo. Os militares foram ocupando cargos com sede e volúpia, como para compensar o tempo perdido, desde que tiveram que retornar aos quartéis com a redemocratização.
Agora, diante de decisões soberanas no STF, assinam notas dando aos fatos interpretação singular, fixando limites do que consideram aceitável, demarcando território como donos do pedaço e acenando com “consequências imprevisíveis” se não for como eles querem.
O ministro da Defesa, um general do Exército, de helicóptero militar, sobrevoa manifestações extremistas de direita na Praça dos Três Poderes, em Brasília, aparentando apoio, para depois alegar candidamente que estava apenas supervisionando a segurança do evento.
Vejam o caso das declarações do ministro Gilmar Mendes, do STF, de que, com o descalabro da crise sanitária e a militarização da saúde, o Exército estava se associando a um “genocídio”. Vá lá, pegou meio pesado, mas a expressão deveria ser lida no contexto do flagelo, do balanço das mortes da pandemia.
O ministro da Defesa, general de três estrelas, mais os chefes militares do Exército, Marinha e Aeronáutica, confundindo defesa nacional com defesa dos quartéis e das corporações armadas, expediram uma nota nervosinha, repelindo o conteúdo das declarações de Mendes, e prometendo contra-atacar com medidas judiciais.
Se a crítica de Mendes era dirigida ao Exército, por que o Ministério da Defesa deveria tomar as dores da corporação? E por que os chefes militares da Marinha e da Aeronáutica, que não foram citadas por Mendes, também subscreveram o desagravo? Só faltou a assinatura do novo ministério militar, o da saúde.
Através da Procuradoria Geral da República, representaram contra Mendes, pedindo o enquadramento do ministro do STF na Lei de Segurança Nacional e no Código Penal Militar. Uma declaração, uma palavra os incomoda. Mas a estatística macabra de mais de mil mortos por dia de coronavírus não lhes causa alvoroço.
O jornalista Reinaldo Azevedo resume com a costumeira perspicácia: os militares passam a ocupar dezenas de cargos civis no Ministério da Saúde; na gestão do ministro Eduardo Pazzuelo, que é general da ativa, as mortes saltam de 14 mil e agora embirutam sem controle para a marca infame de 100 mil. E o que fazem os senhores da farda e da guerra? Querem enquadrar um civil – Mendes – no Código Penal Militar!
O Exército pode não estar associado ao “genocídio”, mas nenhuma nota pública ou processo judicial o livrará de estar associado à dimensão trágica da pandemia. E de nada valerá transferir o general Pazzuelo para a reserva.
titoguarniere@hotmail.com
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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