Terça-feira, 11 de fevereiro de 2025
Por Redação O Sul | 23 de setembro de 2018
Não é à toa que todos os candidatos a presidente demoraram a escolher os seus vices nessa campanha. No chamado ‘presidencialismo de coalizão’ – o nosso ‘regime’ de governo, no qual o presidente depende do apoio de muitos e variados partidos para conseguir governar -, o companheiro de chapa certo pode ajudar muito nas eleições e em uma eventual gestão. Ou pode atrapalhar muito, se resolver conspirar contra o ocupante do Palácio do Planalto.
Independente das transações partidárias envolvidas na escolha, convém ao eleitor ficar de olho em quem são os candidatos ao cargo de vice. A razão é muito simples: desde o fim da ditadura, das cinco chapas eleitas para comandar o Executivo, seja por força do destino ou pelas fragilidades da democracia brasileira, em três casos o vice acabou assumindo a presidência (José Sarney, Itamar Franco e Michel Temer). É bom sabermos em quem estamos votando, especialmente com o pouco apego que os políticos brasileiros têm com os programas de governo registrados na Justiça Eleitoral.
“Mesmo sem um cargo efetivo, o vice costuma desfrutar de certa influência política. Ele serve tanto como representante de um grupo político, para dentro do governo, como dos titulares do cargo (o presidente) em missões delegadas”, explica o cientista político Hilton Fernandes, da FESPSP.
O pesquisador lembra que “o eleitor geralmente vota pensando apenas no candidato principal”. Glauco Peres da Silva, pesquisador da USP, alerta que cabe ao eleitor ter atenção para toda a chapa. “Com tantos partidos, essas composições que agregam apoios são necessárias. De certa forma, salvo em casos sui generis, até funcionam”, diz.
Antes do golpe militar de 1964, era possível escolher um presidente de uma chapa e o vice de outra, o que inspirou o voto ‘Jan-Jan’ (Jânio Quadros, da UDN, para presidente, e João Goulart, do PTB, para vice, dois políticos ideologicamente bem distintos). O mandato dos dois terminou como se sabe, o que torna difícil imaginar que o sistema seja eficiente. “O processo atual favorece, teoricamente, uma maior coesão entre titular e vice. Isso permite maior previsibilidade no governo”, diz Fernandes.
Sobre as chapas formadas para a eleição presidencial, algumas chamam a atenção por excesso e outras por falta dessa “coesão”. No primeiro caso, está a dupla Jair Bolsonaro (PSL)-Hamilton Mourão (PRTB). Além da hierarquia torta (o vice é general; o presidente, capitão), o que não é um detalhe para quem se formou na caserna, a escolha do oficial superior pouco agregou à candidatura do deputado federal, já que a área de influência de Mourão é o mesmo em que ele sempre atuou, as Forças Armadas.
Já Ciro Gomes (PDT) tem como vice a senadora Kátia Abreu (PDT-TO), liderança do agronegócio que, por exemplo, milita contra a lista publicada pelo Ministério do Trabalho de empresas autuadas por trabalho análogo à escravidão. “A escolha de Ciro gera estranheza pelo perfil bastante diverso do dele, que procura ocupar espaço entre os eleitores de esquerda. No caso do Bolsonaro, ele escolheu o vice de um partido que se comporta de forma fisiológica no Brasil inteiro, o PRTB”, diz Fernandes. “Não foram as primeiras opções. Foi o que o quadro ofereceu”, lembra Silva.
Haddad (PT) escolheu como vice Manuela d’Àvila, de um partido historicamente alinhado ao PT, o PCdoB; Alckmin (PSDB), uma senadora de perfil conservador (Ana Amélia, do PP-RS) e Marina Silva (Rede), um militante da área da Saúde de perfil algo folclórico (Eduardo Jorge, do PV-SP).