Nas últimas semanas, os economistas começaram a debater se o Brasil enfrenta uma situação bastante delicada, em que o Banco Central (BC) perde a capacidade de operar na economia por meio da alta de juros.
O processo em que o BC vê a potência da política monetária não trazer o resultado esperado é chamado de “dominância fiscal”. Nessa situação, a economia vive um ciclo perverso. A alta de juros piora o custo da dívida – já bastante elevada –, a percepção de risco dos investidores com a economia aumenta, o que desvaloriza ainda mais o câmbio e, consequentemente, traz impacto para a inflação.
“Quando o BC sobe a taxa de juros, tende a atrair capital, porque o País fica mais atrativo, oferece mais retorno ( para o investidor). O dólar cai, e isso ajuda a trazer a inflação para baixo”, afirma Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank. “Mas não estamos vendo isso acontecer. Dado que a dívida é muito elevada, quando aumenta a taxa de juros, o impacto fiscal que isso tem é significativo, não é desprezível.”
No início deste mês, o Comitê de Política Monetária (Copom) subiu a taxa básica de juros em 1 ponto porcentual – para 12,25% ao ano – e adotou um tom considerado duro e surpreendente por parte do mercado: assegurou mais duas altas da mesma magnitude.
No entanto, diferentemente de outras ocasiões, o que se observou foi um avanço do dólar em relação ao real. A moeda americana bateu R$ 6,20 na terça-feira e só caiu na sexta (20), quando foi a R$ 6,07, queda de 0,84%, após seguidas intervenções do BC durante toda a semana passada.
“Esse tema (da dominância fiscal) entrou em discussão, porque o BC tem sido agressivo, anunciou uma alta de juros forte, fez intervenção no câmbio e, mesmo assim, nada aconteceu”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.
Investidores
O que os investidores olham e se preocupam – e muito – é com a dificuldade de o Brasil conseguir interromper o endividamento crescente. O País tem uma dívida considerada elevada para uma economia emergente.
Em 2024, deve encerrar em 78,3% do Produto Interno Bruto (PIB) e subir a 81,9% do PIB no próximo ano, de acordo com as projeções coletadas pelo sistema de expectativas do Banco Central. A dívida só deve estabilizar em 2030, quando terá ultrapassado o patamar de 90% do PIB.
Mas o País está em dominância fiscal? Por ora, a avaliação é de que não, embora haja sinais de perda de potência da política monetária não só no câmbio, mas também na atividade econômica.
“Não vemos a possibilidade de estar em dominância fiscal como sim ou não. São vários graus. E como a gente entende a dominância fiscal? É o ponto em que a política monetária para de fazer efeito. Já chegamos nesse ponto? Ainda não”, afirma Salles, do C6 Bank.
Na leitura de Vale, da MB Associados, um cenário mais definitivo de dominância fiscal pode ser alcançado num próximo governo se não houver nenhuma medida de acerto das contas públicas. “São dois anos em que essa tensão pode aumentar, infelizmente”, afirma Vale. (Estadão Conteúdo)