Segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 20 de outubro de 2016
Não foi exatamente uma surpresa. Eduardo Cunha (PMDB) já havia conversado com pessoas próximas sobre a expectativa de ser preso. Viveu o auge dessa tensão nos dias que sucederam sua renúncia à presidência da Câmara dos Deputados, em julho, e, com ainda mais intensidade, depois de ter o mandato cassado pelos colegas, em setembro. Sabia que estava vulnerável.
Entre a sombra da prisão e o isolamento político, dedicou todo o seu tempo a duas tarefas: sua defesa na Justiça e o livro que prepara sobre o impeachment de Dilma Rousseff e a crise política. A obra é vista como uma espécie de “delação informal”. Nela, Cunha será autor e protagonista. Vinha escrevendo “enlouquecidamente”, segundo aliados. Cunha disse que tinha mais de cem páginas prontas. Buscava um profissional para auxiliá-lo a formatar o texto e deixá-lo de modo publicável.
Para colocar suas “memórias” no papel, levantou agendas antigas de compromissos públicos e privados. Há meses vinha também esquadrinhando todas as doações que capitaneou para o PMDB, um levantamento que delegou ao corretor de valores Lúcio Bolonha Funaro, que acabou preso em julho. Antes, porém, Funaro relatou a aliados que havia juntado “quilos de papéis”.
Mas Cunha não se dedicou apenas às contas do PMDB, sigla para a qual atuou como um esmerado arrecadador. Ele também fez uma série de estudos sobre o caixa petista. “O PT cobrava até comissão das doações. Repassava 95% [para os candidatos] e ficava com 5%. É só você olhar as entradas e saídas”, disse ainda em setembro.
Questionado se havia feito o estudo pessoalmente, respondeu: “Fiz”. E por que dedicava tempo a isso? “A gente tem sempre a curiosidade para ver o financiamento dos partidos. Montante e origem. É informação. Faço para os meus argumentos.” Todos os dados seriam usados no livro ou, especulavam aliados, em uma possível delação premiada – hipótese que agora ganhou força.
Cunha foi informado de que era alvo de um pedido de prisão pouco antes das 13h de quarta-feira (19). Disse aos advogados que iria se entregar. De terno azul e gravata, preparava-se para ir à sede da Polícia Federal em Brasília. Não deu tempo. Os agentes já estavam na garagem do seu prédio quando decidiu sair.
O peemedebista tratou dos direitos da publicação de sua obra com três editoras. Manifestou certa insatisfação com as propostas financeiras que recebeu. Pensava em bater o martelo nesta semana. Pode não ter dado tempo.
Para a obra, além da papelada, rememorou conversas privadas e diálogos com diversos colegas de Parlamento, ministros, ex-ministros, a ex-presidenta Dilma Rousseff e o presidente Michel Temer. Decidiu, porém, expor alguns de seus alvos antes mesmo de fechar o roteiro. Um dia depois de ser cassado, foi questionado por um de seus últimos aliados “por onde começaria”. “Moreira Franco e Rodrigo Maia.”
Na semana passada, em reunião com uma das editoras, Cunha se negou a antecipar detalhes da obra, o que causou preocupação. Decidiu ser direto: disse que tudo o que colocaria no papel poderia comprovar. Com documentos ou gravações. (Folhapress)