Sábado, 23 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 23 de novembro de 2024
O Uruguai realiza o segundo turno das eleições presidenciais neste domingo (24) em um cenário indefinido, com o historiador Yamandú Orsi, da esquerdista Frente Ampla, e o candidato governista, Álvaro Delgado, do direitista Partido Nacional, em empate técnico.
O vencedor terá o desafio de lidar com um Congresso bem dividido. Por outro lado, a economia dá sinais de recuperação depois de um ano difícil em 2023 por conta da seca, que interrompeu a recuperação pós-pandemia de covid.
Às vésperas da votação, as sondagens mostram um quadro de estabilidade e imprevisibilidade. No Instituto Cifra, Orsi tem 42% das intenções de voto, enquanto Delgado aparece com 40%. Os indecisos e nulos somam 18%. Deste total, 6% estão inclinados a votar no candidato governista e 5% no adversário da Frente Ampla – o que elevaria as preferências para 46% e 47%, respectivamente. Outros 3% devem votar em branco ou nulo. Os 4% restantes são os “indecisos puros”.
Diante da polarização, os dois presidenciáveis têm evitado propor mudanças bruscas de direção. “Somos um país que historicamente valoriza as transições mais lentas. Os candidatos radicais sempre perderam as eleições”, observa Pomiés, acrescentando que este aspecto e a falta de carisma dos postulantes também contribuiu, por outro lado, para uma campanha morna em termos de mobilizações de rua. “As diferenças entre os dois blocos são mais conceituais do que programáticas”, avalia Mariana Pomiés, socióloga e diretora do Instituto Cifra.
As diferenças sobre o rumo para o Mercosul são um bom exemplo. Delgado tende a seguir a linha do atual presidente e seu padrinho político, Lacalle Pou – que tentou sem sucesso acelerar parcerias comerciais com a China – e defender uma maior liberdade para os acordos firmados por parte dos sócios do bloco. O presidente da Argentina, Javier Milei, desponta como um aliado nesta articulação.
Já Orsi, embora tenha deixado as portas abertas para uma aproximação com os chineses, deve priorizar as negociações dentro do bloco, como com a União Europeia.
Ex-professor, Orsi governou o departamento de Canelones, o segundo maior do país, por dois mandatos. É considerado o herdeiro político do ex-presidente José Mujica (2010-2015). Aos 89 anos, o ex-mandatário segue sendo a figura política mais popular do Uruguai, com cerca de 60% de simpatia, segundo Pomiés. Porém, enfrenta um câncer que impediu um maior protagonismo na disputa.
Orsi, ainda assim, procurou explorar a relação com padrinho político ao propagar as semelhanças entre ambos, como o gosto pela austeridade e a vida rural. Fez questão de aparecer em fotografias durante a campanha em trajes informais, passeando pelo campo e tomando mate, a exemplo do que fazia Mujica. Suas bandeiras são o meio ambiente, o combate à pobreza infantil, a inclusão social e o apoio aos pequenos produtores. Tem como trunfo a redução da desigualdade nos 15 anos de governos da Frente Ampla, quando o índice de pobreza recuou de 40% para 8,8%. Hoje, está em 9,1%.
Já Delgado ganhou projeção na pandemia de covid, quando assumiu papel central na comunicação com a população como secretário da Presidência. Defensor da estratégia de “liberdade responsável”, coordenou um grupo de cientistas responsável por estudar o vírus, levantar dados e divulgar alertas à população. Na campanha, tem prometido um governo de “continuidade”, com foco na estabilidade social, redução de impostos, crescimento econômico e atração de investimentos estrangeiros.
O próximo presidente assumirá o cargo em março com o desafio de manter o diálogo aberto com a oposição, já que nenhum bloco obteve maioria absoluta no Legislativa e no Uruguai, ao contrário do Brasil, não há instrumentos como decretos e medidas provisórias. No Senado, a Frente Ampla conquistou 16 das 30 cadeiras.
Na Câmara, os frentistas somam 48 deputados, contra 49 da coalizão governista que, além do Nacional, inclui os partidos Colorado, Cabildo Abierto e Independiente. As duas vagas restantes na Câmara são de Gustavo Salle e sua filha, Nicolle Salle, do Identidad Soberana. De perfil radical e com um discurso antissistema, os dois já anteciparam que não vão compor nenhuma coalizão durante a próxima legislatura. Ambos, inclusive, declararam voto nulo no segundo turno presidencial.
Do ponto de vista econômico, as perspectivas parecem favoráveis para o futuro presidente. O governo de Pou cumpriu a promessa de baixar a inflação que beirou os 10% no início da gestão. O índice de preços ao consumidor (IPC) nos últimos 12 meses até setembro ficou em 5,32% e deve encerrar o ano dentro da meta entre 3% e 6%. Porém, a economia uruguaia é altamente dolarizada e pode sofrer alguma pressão da recente alta do dólar em todo mundo desde a eleição de Donald Trump à presidência dos EUA no início do mês.
Após amargar um crescimento de 0,4% no ano passado, por conta da crise cambial da Argentina – além de não receber os turistas argentinos, muitos uruguaios passaram a cruzar a fronteira para fazer compras – e da seca extrema que prejudicou a safra, a economia uruguaia deve encerrar 2024 com uma expansão de 3,2%, segundo projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI). As exportações cresceram 13,2% nos nove primeiros meses.