Candidatas pela segunda eleição seguida ao cargo de vereadora, 241 mulheres repetiram no domingo o mesmo roteiro traçado há quatro anos: votação zerada ou inexpressiva após não receberem um centavo sequer para fazer campanha. A situação reflete um cenário mostrado há duas semanas, em que partidos registram algumas candidaturas femininas para cumprir a legislação eleitoral e depois as abandonam à própria sorte.
A lei estabelece um mínimo de 30% de mulheres nas disputas pelos legislativos, com o mesmo patamar de destinação de verbas das legendas. A eleição deste ano é a primeira em que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) analisará casos suspeitos de burla à essa norma com base em regras pré-definidas para identificar indícios de candidaturas-laranjas, ou seja, o registro de uma mulher apenas para cumprir a cota.
Os critérios, definidos ainda em abril, para reconhecer uma candidatura fictícia são: votação zerada ou pífia das candidatas; prestação de contas com movimentação financeira irrelevante; e ausência de atos efetivos de campanha.
No domingo, 36.684 candidatos às câmaras municipais tiveram até dez votos — 22.733 mulheres, o equivalente a 62%. Destas, 791 não tiveram nem mesmo o próprio voto.
É o caso de Regina Oliveira (União Brasil), que foi candidata a vereadora em Anhumas, cidade paulista a 644 quilômetros de São Paulo, e ficou zerada na urna. Questionada sobre o motivo de não ter votado em si mesma, respondeu:
“Porque não. Eu não tive tempo de fazer campanha por causa do meu trabalho”, disse ela, acrescentando que só se registrou na disputa “porque faltaram pessoas na coligação”. Segundo Regina, ela aceitou se candidatar a pedido de um dirigente do partido no município, mas disse não se lembrar o nome dele.
O presidente do União Brasil em Anhumas, Alecy Rodrigues de Oliveira, admite que o convite para Regina se candidatar teve como uma das motivações o cumprimento da cota. Sobre a falta de recursos do fundo eleitoral, ele afirma que nenhum candidato na cidade recebeu.
O número de candidatas eleitas vereadoras no domingo cresceu em relação à eleição passada em 2020. As mulheres vão ocupar 10.603 vagas, equivalente a 18,2% do total de cadeiras nas câmaras municipais. Antes, elas representavam 16,1%. Apesar da alta, a proporção ainda está longe dos 51,5% que as mulheres representam na população do país.
Entre os partidos que mais tiveram candidatas com votação zerada está o Agir, com 54 candidatas a vereadora sem voto. O presidente do partido, Daniel Tourinho, afirmou que vai checar os casos.
“Estou apurando os municípios onde ocorreram votação zero e o porquê desse resultado. Antes de cravar a possibilidade de ‘candidatas-laranja’, há que se ponderar se houve casos de desistência de candidaturas após as convenções”, declarou.