Segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
Por Paulo de Tarso Pinheiro Machado | 31 de outubro de 2024
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
As eleições municipais representam, no contexto da democracia representativa, o mais próximo contato de participação da cidadania com a democracia, entendido o conceito de que a democracia é uma forma de governo e de gestão institucionalizada da vida coletiva, ou seja, de que como vivemos e compartilhamos direta e coletivamente a comunidade e, por isso, os valores de escolha devem estar relacionados aos valores democráticos.
A democracia pressupõe e outorga a cidadania o direito universal de participar e compartilhar o acesso a saúde, a educação, a oportunidade de trabalho e geração de renda, ao transporte, ao planejamento e controle e, acima de tudo, a sua manifestação, o direito a voz, de ouvir e ser ouvido.
Mais que um ideal, a democracia representativa (escolha) tem como contrapartida que a mesma seja participativa (direta) onde comparecer as urnas é a oportunidade para que seja encaminhado o compartilhamento de visões, desejos e manifestações expressos na maioria absoluta e relativa de votos, onde o resultado final expressará aos eleitos o compromisso com a necessidade de compartilhar esforços legislativos e executivos para a melhoria e qualidade de vida para todos, vencedores e vencidos.
Tomando como exemplo, a recente a eleição municipal em Porto Alegre realizada em dois turnos traz nas estatísticas eleitorais um dado preocupante, o qual revela que a abstenção, ou seja, o número de eleitores que não compareceram as urnas situou-se acima de 30% do total de eleitores aptos a votar.
No caso concreto, Porto Alegre no 1º turno das eleições teve uma abstenção de 31,5%, representando 345.544 eleitores e no 2º turno de 34,8% o que representou de forma crescente 381.695 eleitores que se ausentaram e/ou renunciaram ao exercício do voto.
Embora não seja objeto deste artigo esgotar as razões do comportamento deste expressivo contingente de abstenções é importante refletir sobre que aspectos ou motivações teriam ou levaram a esse fato. Iniciamos a reflexão pela hipótese de que mais de 1/3 dos eleitores de Porto Alegre estariam desanimados, desmotivados, decepcionados, desesperançosos ou esgotados com a política e seus operadores – partidos, governantes, legisladores, candidatos e o imenso ambiente de “negócios e negociatas” políticas que colocam em segundo plano as demandas da vida coletiva da sociedade (eleitores).
Tais adjetivações poderiam estar justificadas no valor de R$ 19 bilhões do “Orçamento Secreto”, tendo sido o mesmo ampliado e transformado em R$ 45 bilhões de reais para Emendas Parlamentares negociadas pelo Congresso – Câmara e Senado, as quais irrigaram o “mercado” de votos nos municípios, ou ainda os R$ 4,9 trilhões do Fundo Eleitoral distribuídos entre 29 partidos e federações partidárias cujo valor necessariamente, não reflete na qualidade de vida do eleitor.
Enquanto isso, o “arcabouço fiscal”, entenda-se os recursos necessários à melhoria da qualidade da vida coletiva expressa nas demandas da sociedade como saúde, educação, emprego e renda, segurança, transporte e outras, diante da “gula” incontrolável do Congresso, experimentam cortes nas rubricas para garantir o não menos “guloso” e estratosférico pagamento de juros da divida interna, cuja rubrica é imune ao inescrupuloso e injusto método de corte conhecido como ”teto” de gastos orçamentários.
Enfim, em meio a tantos recursos (secretos), cujo destino final deveria ser a sociedade (eleitor), o qual não vê chegar, ainda se depara com ironia bufa, agressividade e cadeiradas nos debates eleitorais, além de notícias como a do poder judiciário de um Estado da federação cujos desembargadores foram afastados, por determinação do Superior Tribunal de Justiça (STJ), após a Polícia Federal (PF) descobrir um suposto esquema de venda de sentenças judiciais.
Por fim e com certeza toda esta reflexão necessita de uma investigação metodológica e aprofundada sobre as razões e motivos pela elevação dos índices de abstenção, mas fica explicitado que a sociedade exige que a democracia – governos, políticos e partidos – adotem em suas atividades, regras de governança como transparência, responsabilidade, equidade e prestação de contas.
No entanto, o preocupante é que este fato da abstenção tem como efeito a degradação da democracia cuja essência se consubstancia, além da representação, na participação da cidadania, a qual manifesta indícios de crescente esgotamento social.
Paulo de Tarso Pinheiro Machado – Economista, MSc, PÓS-MBA, Vice-Presidente do Comitê de Serviços Públicos do Fórum Latino-americano de Defesa do Consumidor
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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