Um aglomerado de cidades construídas entre florestas de abetos e carvalhos a noroeste de Kiev há muito tempo atrai a classe média da capital. Agora, elas foram transformadas em lugares de total desespero.
Forças russas invadindo Kiev em uma tentativa de cercar a capital ucraniana de 2,9 milhões de habitantes entraram nas cidades suburbanas cujos nomes estão rapidamente se tornando sinônimo de sofrimento.
Desde o primeiro dia da invasão ordenada pelo presidente Vladimir Putin, as tropas russas apontaram para Gostomel, que abriga um aeródromo estratégico usado pelo maior avião do mundo, o An-225 “Mriya”, ou “Sonho”, agora destruído. A luta pesada logo engoliu as cidades vizinhas de Irpin, Bucha e Vorzel. Milhares de moradores estão escondidos nos porões de suas casas e vilas, temendo por suas vidas.
Enquanto a Ucrânia tenta estabelecer um cessar-fogo localizado para permitir a retirada de civis, as pessoas dessas cidades outrora desejáveis estão desesperadas para sair. Para alguns, já é tarde demais.
A situação daqueles que vivem fora de Kiev é uma mostra do sofrimento enfrentado pelos civis em todo o país após quase duas semanas de combates. Enquanto a Rússia segue dizendo que está mirando em ativos militares, o governo ucraniano acusa o Kremlin de disparar deliberadamente em áreas residenciais em uma tentativa de esmagar não apenas o Exército da Ucrânia, mas também seu povo.
Em Gostomel, a cerca de 30 quilômetros do centro de Kiev, o prefeito da cidade, Yuriy Prylypko, e seus dois assistentes foram baleados enquanto distribuíam comida aos moradores locais, segundo informou a prefeitura no Facebook na segunda-feira.
A cidade vizinha de Bucha está em ruínas, de acordo com Mykhaylyna Skoryk-Shkarivska, assessora do prefeito. As comunicações móveis e a eletricidade caíram e não houve contato com o prefeito Anatolii Fedoruk desde o meio-dia de sábado.
A Rússia “destruiu minha vida, meu trabalho amado e está matando meus amigos todos os dias e meus colegas agora”, escreveu Skoryk-Shkarivska no Facebook no domingo (6).
Ainda na região de Kiev, autoridades ucranianas disseram que um ataque aéreo russo atingiu uma fábrica de pão na cidade de Makariv, matando pelo menos 13 civis. Das 30 pessoas que se acreditava estarem lá, cinco foram resgatadas.
Já na cidade portuária de Mariupol, no Sul, centenas de milhares de pessoas ficaram presas sem comida e água sob bombardeios regulares.
“Eles estão bombardeando a vida de tudo o que está se movendo”, disse o presidente ucraniano Volodymyr Zelenskiy.
Na cidade de Kharkiv, no Leste do país, a polícia disse que mais 10 pessoas foram mortas no último dia, elevando o número total de mortos do bombardeio russo para 143 desde o início da invasão. Não foi possível verificar o o número de forma independente.
Corredores humanitários
Em Irpin, que está sob forte cerco das forças russas, civis foram atacados no domingo durante a retirada. O momento foi filmado pela equipe da Radio Free Europe/Radio Liberty e postado no Facebook, mostrando o momento que uma mulher e seus dois filhos morreram, enquanto um homem ficou gravemente ferido.
Com a carnificina prestes a aumentar, foi marcada uma tentativa de estabelecimento de corredores humanitários para a terça-feira, depois que duas tentativas anteriores de permitir que não combatentes deixassem a cidade portuária de Mariupol, no Sul, desmoronaram no fim de semana. A prefeitura disse que tropas russas bombardearam a rota enquanto civis se reuniam para sair. A Rússia, no entanto, culpa a Ucrânia pelo fracasso dos corredores.
A Ucrânia rejeitou uma proposta russa durante a noite para retirar as pessoas para a Bielorrússia e para a Rússia, pedindo uma passagem segura para outras áreas da Ucrânia. Uma terceira rodada de negociações com a Rússia ocorreu nesta segunda.
Em Bucha, uma cidade de cerca de 37 mil habitantes situada no rio com o mesmo nome, as pessoas estão escondidas em seus porões, buscando abrigo contra bombas e assassinatos indiscriminados.
Muitos edifícios estão em chamas ou destruídos por mísseis. As pessoas não se atrevem a sair de seus porões e não têm água ou eletricidade há dias.
A Rússia diz que só tem como alvo estruturas militares e as está atingindo com alta precisão.