Ícone do site Jornal O Sul

Em encontro com religiosos, Lula faz duras críticas a Dilma dizendo: “Parece um governo de mudos”

Ex-presidente disse: "Dilma está no volume morto". (Foto: Ricardo Stuckert/Instituto Lula)

Como se estivesse em um confessionário, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu o coração a um seleto grupo de padres e dirigentes de entidades religiosas no auditório de seu instituto, em São Paulo. Em tom de desabafo, criticou duramente a presidenta Dilma Rousseff e creditou ao governo dela, sobretudo no segundo mandato, a crise vivida pelos petistas. Para Lula, a taxa de aprovação da companheira está no “volume morto”, em uma referência à situação hídrica paulista, e, com o silêncio do Planalto, o “governo parece um governo de mudos”. Ele admitiu ainda que é “um sacrifício” convencer sua sucessora a viajar pelo País e defender sua gestão.

“Dilma está no volume morto, o PT está abaixo do volume morto e eu estou no volume morto. Todos estão em uma situação muito ruim. E olha que o PT ainda é o melhor partido. Estamos perdendo para nós mesmos.”

Para ilustrar a profundidade do poço em que se meteu o PT, Lula citou uma pesquisa interna do partido, que revela que a crise se instalou no coração da legenda, o ABC paulista. “A nossa rejeição chega a 75%. Entreguei a pesquisa para Dilma, em que nós só temos 7% de bom e ótimo.”

Ele afirmou ter dito à governante: “Isso não é para você desanimar. Isso é para você saber que a gente tem de mudar, que a gente pode se recuperar. E entre o PT, entre eu e você, quem tem mais capacidade de se recuperar é o governo, porque tem iniciativa, tem recurso, tem uma máquina poderosa para poder falar, executar, inaugurar”.

Na mesa, os mais de 30 participantes do encontro não deram trégua ao ex-presidente. Sobraram críticas para o PT, o governo, o próprio Lula e seu pupilo, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad. Os religiosos defenderam que o partido volte à antiga liturgia e se aproxime mais dos trabalhadores. Lula concordou com a tese, dizendo que os petistas trocaram a discussão da política pela do mandato.

A reunião faz parte da estratégia da sigla de tentar se reaproximar de sua base social. O interlocutor da ala religiosa é o ex-ministro Gilberto Carvalho, mencionado diversas vezes por Lula, em seu discurso de mais de 50 minutos, para exemplificar como o governo Dilma perdeu o contato com os movimentos sociais. Ele cobrou da presidenta, e tem feito isso em outras reuniões reservadas, uma agenda positiva e mais exposição pública. Para o petista, Dilma deixou o governo mais distante dos mais pobres.

“Na falta de dinheiro, tem de entrar a política. Nestes últimos cinco anos, fizemos muito menos atividade política com o povo do que fizemos no outro período”, disse, citando conferências nacionais com grupos sociais. “Isso acabou, Gilberto!”

Lula reclamou que Dilma tem dificuldade de ouvir até mesmo os conselhos dados por ele: “Gilberto sabe do sacrifício que é a gente pedir para a companheira Dilma viajar e falar. Porque na hora que a gente abraça, pega na mão, é outra coisa. Política é isso, o olhar no olho, passar a mão na cabeça, o beijo”.

Nesse ponto da conversa, o ex-presidente fez questão de ressaltar: falar com a população não é “agendar para falar na televisão”. “Aquele gabinete [presidencial] é uma desgraça. Não entra ninguém para dar notícia boa. Os caras só entram para pedir alguma coisa. E como a maioria que vai lá é gente grã-fina… Só entrou hanseniano porque eu estava no governo, só entrou catador de papel porque eu estava no governo.”

Lula revelou o que tem conversado com Dilma nos encontros privados. Ele disse que fala para a mandatária que a hora é de “ir para a rua, viajar por este País, botar o pé na estrada”. Diz ainda que os petistas não podem temer as vaias. Uma das armas para recuperar a combalida gestão, segundo ele, é investir na execução do Plano Nacional de Educação. O problema seria, para ele, que o próprio PT desconhece o conteúdo do plano.

O petista, que não falou sobre uma possível candidatura à Presidência em 2018, mas não esconde que pode concorrer ao terceiro mandato, disparou fortemente contra os ministros, sobretudo os do PT. “Os ministros têm de falar. Parece um governo de mudos. Os ministros que viajam são os que não são do PT. [O ministro das Cidades, Gilberto] Kassab já visitou 23 Estados, não sei quem já visitou 40 Estados”, exagerou.

Lula disse que também tem chamado a atenção do titular da Casa Civil, Aloizio Mercadante, dizendo que ele deveria fazer mais discursos públicos. “Pelo amor de Deus, Aloizio, você é um tremendo orador”, disse ele, que emendou, arrancando risos: “É certo que é pouco simpático”.

Lula disse ainda que o governo não dá boas notícias ao País. “Nós tivemos as eleições no dia 26 de outubro. De lá pra cá, Gilberto, nós temos que dizer para vocês, porque vocês são companheiros, depois de nossa vitória, qual é a notícia boa que nós demos para este País? Essa pergunta eu fiz para a companheira Dilma no dia 16 de março, na casa dela.” (AG)

Sair da versão mobile