Na véspera de uma reunião entre representantes dos EUA e da Rússia para discutir a guerra na Ucrânia, líderes europeus se reuniram de forma emergencial em Paris para declarar que qualquer proposta sobre o conflito precisa contar com o aval dos ucranianos. Eles ainda buscaram formas de reiterar seu apoio a Kiev, mesmo com divergências sobre gastos militares e o potencial envio de tropas para uma força de manutenção de paz.
Sem convite para a reunião marcada entre americanos e russos na Arábia Saudita, os líderes, convocados pelo presidente francês, Emmanuel Macron, afirmaram que não existe a possibilidade de um acordo de paz que não conte com a participação de Kiev, rejeitando, como apontou o chanceler alemão, Olaf Scholz, uma “paz ditada” por Washington e Moscou.
“Nós continuaremos a apoiar a Ucrânia, a Ucrânia pode continuar a confiar em nós”, disse Scholz na saída do encontro. “[A Ucrânia] não aceitar tudo o que lhe fosse apresentado sob quaisquer condições.”
A proximidade entre os presidentes Donald Trump e Vladimir Putin, que conversaram por uma hora e meia na semana passada, tem preocupado Kiev e os membros europeus da Otan, a principal aliança militar ocidental. Representantes do governo americano, como o secretário de Defesa, Pete Hegseth, sinalizam que as terras ocupadas pelos russos podem não ser devolvidas, e que a entrada da Ucrânia na aliança não é viável. Os ucranianos também ficaram de fora da reunião em Riad.
Trump disse, no domingo (16), não acreditar em um conflito entre a Rússia e a Otan no futuro, e seu vice, J.D. Vance, afirmou a uma incrédula plateia na Conferência de Segurança de Munique, na semana passada, que a maior ameaça à Europa não é Moscou, mas sim o “afastamento dos valores democráticos”.
A chegada de Trump à Casa Branca não pôs em xeque apenas o futuro da guerra, com Washington questionando os bilionários pacotes de defesa e exigindo uma compensação econômica, citando as riquezas minerais do país. Desde a eleição do republicano, os líderes europeus tratam de forma quase consensual a necessidade de assumirem um maior papel em sua segurança.
“Todos os participantes desta reunião percebem que o relacionamento transatlântico, a Aliança do Atlântico Norte e nossa amizade com os Estados Unidos entraram em uma nova fase. Todos nós vemos isso”, disse o primeiro-ministro polonês, Donald Tusk, mas sem pregar uma quebra nas relações com Washington.
Nos últimos anos, a Polônia elevou seus gastos com defesa para 4,7% do PIB, acima da meta estabelecida pela Otan, de 2%, e pressiona para que os países mais ricos, como Alemanha e França, também ajudem a pagar a conta pela segurança coletiva da região. Até líderes de países onde a elevação de despesas militares é impopular, como a Alemanha, não descartam incrementar seu orçamento no futuro próximo.
“Garantias”
Outro ponto que incitou debates em Paris foi o pedido da Ucrânia de “garantias de segurança” para que o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, inicie um diálogo direto com Putin, um pedido que foi feito aos líderes europeus e também a J.D. Vance na semana passada.
Em conversa com jornalistas, o premier britânico, Keir Starmer, afirmou que seu governo pode ajudar a fornecer as condições de segurança, mas cobrou um papel dos EUA nesse processo, sem detalhar como. Na véspera, em artigo no jornal The Daily Telegraph, o premier disse que está disposto, se necessário, a enviar tropas britânicas para integrar uma força de manutenção de paz na Ucrânia, e prometeu discutir o tema com Trump.
“Neste momento, temos que reconhecer a nova era em que estamos, não nos apegarmos desesperadamente aos confortos do passado. É hora de assumirmos a responsabilidade por nossa segurança, por nosso continente”, afirmou em entrevista coletiva.
Embora Starmer tenha sugerido enviar tropas como uma demonstração do compromisso com a defesa da Europa, a ideia não tem muitos adeptos. Scholz e o premier espanhol, Pedro Sánchez, consideram cedo para discutir o tema. A premier dinamarquesa, Mette Frederiksen, afirmou que há “muitas questões” mais urgentes.
“A Rússia está ameaçando toda a Europa agora, infelizmente”, afirmou aos jornalistas, acrescentando que não há sinal de que a Rússia queira paz. “A coisa mais importante aqui e agora é que os ucranianos obtenham mais do que precisam para que não percam esta guerra e para que estejam na melhor posição possível.”