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Em semana decisiva, participantes da Conferência das Nações Unidas para o Clima veem muitos impasses e poucas chances de avanços

Especialistas falam em conferência com "clima de ressaca" depois da reunião de Glasgow, no ano passado. (Foto: Divulgação)

Frans Timmermans, o holandês que chefia a área de clima na Comissão Europeia resumiu desta forma a dificuldade do debate sobre financiamento em Sharm el-Sheikh, no Egito.

“Todos sabemos que o que está agora em cima da mesa não é nem de longe suficiente para fazer a transição e abordar as questões de adaptação e de perdas e danos”, declarou. “Temos que sair dos bilhões e alcançar os trilhões. Isso nunca vai acontecer apenas com recursos públicos.”

A frase de Timmermans sintetiza um dos impasses da Conferência das Nações Unidas para o Clima (COP27), que chega em sua semana final sem entusiasmo, muitos detalhes técnicos a resolver e pouca perspectiva de avanço.

A COP no Egito é uma conferência do clima “da ressaca”, como dizem os diplomatas – uma rodada que se segue a um evento importante, como foi a COP26, em Glasgow. Ali a negociação do livro de regras do Acordo de Paris foi concluída. Restaram o detalhamento difícil do artigo 6, que trata dos mecanismos de mercado, e os tópicos mais controversos, como perdas e danos e recursos para financiar a adaptação aos impactos climáticos.

Perdas e Danos é um tema que vem sendo postergado a cada COP. As nações mais vulneráveis e os países-ilhas, reunidos em um grupo chamado V20, pedem que nações desenvolvidas criem um mecanismo para ajudá-los a compensar as perdas de territórios, colheitas, casas, cidades, vilarejos e modos de vida que tiveram com eventos climáticos extremos.

Os países ricos não querem ouvir falar nisso. John Kerry, enviado especial de clima da Casa Branca, disse há algum tempo e repetiu na semana passada que não há país no mundo “com trilhões de dólares” para conter as perdas e danos do clima.

A COP do Egito comemora pequenas conquistas. Os governos dos países mais vulneráveis celebraram há poucos dias que o tópico de financiamento de perdas e danos entrou na agenda de negociação da COP. Isso significa que poderá ser discutido sempre — se trará resultados, é outra história.

“Os países em desenvolvimento querem alguma decisão nessa COP. Buscam ao menos o reconhecimento de que precisam de um mecanismo, ainda que leve algum tempo para ser operacionalizado. Mas os países desenvolvidos querem apenas discutir procedimentos em Sharm el-Sheikh”, diz Stela Herschmann, especialista em política climática do Observatório do Clima. “Se Sharm el-Sheikh conseguir resolver algo de Perdas e Danos, será uma conferência histórica.”

Mas as chances são poucas.

Por enquanto, contudo, o único mecanismo lançado foi o Global Shield, um sistema de seguros divulgado nesta segunda-feira pela Alemanha, que é uma peça do que os países ricos chamam de “mosaico” de soluções para Perdas e Danos. A Alemanha entrou com 170 milhões de euros para ajudar os mais vulneráveis.

A iniciativa é dos países do G7 e deve ajudar as 58 nações mais vulneráveis do mundo. O presidente americano, Joe Biden, disse que os EUA também vão contribuir. Haverá a criação de uma plataforma para ajudar os países a acessarem ajuda e um fundo em conjunto com o Banco Mundial e outras instituições.

O Canadá, a Irlanda e a Dinamarca vão aportar mais 40 milhões de euros à iniciativa. É um passo pequeno diante do tamanho do problema. Só as chuvas deste ano no Paquistão causaram prejuízos de US$ 30 bilhões.

Em outro tema, no de aumentar a ambição em mitigação, também não há consenso. Foi proposto em Glasgow um programa para pressionar os países por metas mais ambiciosas.

“Nas negociações, contudo, não há consenso sobre como vai funcionar. O programa de trabalho de mitigação segue sem avanços substanciais”, diz Karen Oliveira, diretora de políticas públicas e relações governamentais da TNC Brasil.

Nem o prazo do programa está decidido. Alguns governos querem que dure um ano, outros, dois, e a sociedade civil internacional quer que dure até 2030 ou enquanto houver lacunas entre os compromissos e o que é necessário para a temperatura ficar em 1,5ºC ou abaixo de 2ºC.

“A expectativa sobre mercado de carbono desta COP está em estabelecer como as normas vão funcionar no detalhe e se concentra em dois artigos”, diz Karen Oliveira. No artigo 6.2, que permite a compra e venda de créditos entre países, há tudo por fazer e a negociação está muito atrasada.

A presidência egípcia da COP27 deu mais prazo aos negociadores para encerrarem as discussões técnicas até esta quarta (16), para que o debate seja passado à rodada ministerial.

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